Vai dar Lula no primeiro turno. Que nada, vai dar Bolsonaro no primeiro turno. Vocês são dois idiotas, vamos ter segundo turno e o Lula ganha do Bolsonaro. Deixe de falar bobagem! Vai dar Bolsonaro no segundo turno. Aposto que vai dar Lula no segundo turno, margem apertada, convulsão social, o combo todo. Todo mundo está errado e a Terceira Via vai surpreender. Ouvi dizer que, em caso de empate, é o presidente do Tribunal Superior Eleitoral quem decide. É verdade?
Por esses dias todo mundo camufla as dúvidas sob uma reluzente camada de certezas baseadas em delírios e conspirações. As justificativas são muitas e variadas. Para uns, Lula vai ganhar porque o povão está se vingando. Para outros, a vitória de Lula representa é a vingança da elite contra esse mesmo povão. Já os que têm certeza absolutíssima da vitória de Bolsonaro falam em voto envergonhado e em Datapovo.
Só da Terceira Via é que realmente ninguém mais fala. Ninguém acredita. A não ser que uma formiguinha resolva passear perigosamente pelos sistemas do TSE, cause um curto-circuito na engrenagem infalível, vire inseto frito e, assim, sacrifique sua vidinha em nome da democracia. E de um resultado tão improvável quanto o arrependimento de Alexandre de Moraes.
Não estou reclamando. De jeito nenhum. Nutro uma admiração genuína por quem tem as certezas que me faltam. Aqui de onde contemplo a humanidade, ou melhor, a brasilidade, ou melhor ainda, a curitibanidade em todo o seu esplendor frio e úmido, vejo com especial interesse como todo mundo é capaz de unir pontos que simplesmente escapam das minhas mãos. As pessoas trocam dados e disse-me-disses e sinais esotéricos e informações desencontradas que acabaram de receber e narrativas sem sentido e, com essas coisas, cozinham o sopão que alimenta suas certezas.
Como não admirar isso?! E depois ainda me dizem que o homem contemporâneo enfrenta uma crise do imaginário. Que nada! A imaginação nunca foi tão importante para os brasileiros, que a ela recorrem depois de cada pesquisa, de cada declaração do candidato, de cada decisão do TSE e de cada debate. Uma pena que toda essa imaginação não possa aflorar na forma de livros ou filmes magistrais porque, primeiro, falta talento aos artistas que têm acesso ao dinheiro e, segundo, é capaz de o TSE mandar prender todo mundo por fake news.
Eu, sabendo só que nada sei, fico observando e colhendo muita opinião bichada na esperança de encontrar o Argumento Perfeito que me dê tranquilidade ou que me deixe apreensivo de uma vez por todas. Se me dizem para ficar de olho no dólar, por exemplo, eu fico. Se me aconselham a dar ouvido à minha intuição, está mais do que dado. Se me sugerem pedir asilo político na Embaixada da Itália, vou logo procurando o endereço. Se me mandam rezar, eu rezo, ué.
Me tranquiliza saber que está todo mundo exercitando a fantasia e projetando felicidades para o já mítico Dia Seguinte. É sinal de que ainda mantemos algo que nos torna essencialmente humanos: o sonho. Por outro lado, o que me incomoda é a possibilidade de a certeza quanto ao resultado das eleições de 2022 existir para uma única pessoa. Sim, ela mesma: a autoridade que deveria garantir que a dúvida saudável, própria do processo democrático, pairasse sobre toda a sociedade.
Segunda-feira (3) será o dia do “eu te disse!”, do “eu avisei!”, do “eu já sabia!” e, porque vivemos numa época um tanto quanto perversa, do “só você que é idiota não tinha percebido isso!”. Analistas dirão que a vitória ou a derrota tem explicação nos astros ou na mais nova teoria da comunicação de massa ou na mais recente tese da ciência política. Eu mesmo escreverei algo, na esperança de nunca envergonhar o Paulo do futuro. O que, convenhamos, é uma missão quase impossível.
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