Caro leitor,
Política é legal. Ok. O meu lado é melhor do que o seu. Aliás, a sua vida seria melhor se você viesse para o meu lado. Eu tenho a solução para os seus problemas. Aquela coisa toda de direita e esquerda. Medo da miséria e da morte. Da repetição de tragédias históricas. Há pouco espaço para a esperança verdadeira—. Mas o que é que eu tô fazendo? Lá se foi um parágrafo e eu aqui falando de política quando o propósito deste texto é justamente o contrário.
Acontece que ando com a impressão de que estamos tão viciados em política que acabamos ignorando a vida que nos cerca. Não é de hoje. Leitores contumazes deste espaço sabem que essa é uma preocupação antiga e que de tempos em tempos me ronda. Uma questão existencial para a qual procuro resposta há anos, sem sucesso. Mas podem ficar tranquilos. Não vou fazer aqui nenhum elogio da alienação.
Vocês viram?
Por outra, vou perguntar: vocês viram que um homem foi engolido por uma baleia – e depois cuspido pelo cetáceo? Ou mais recentemente: vocês viram que dois astronautas foram resgatados depois de nove meses no espaço? Vocês ficaram sabendo da passagem do cometa C/2023 A3? Vocês viram que encontraram anomalias sob as pirâmides de Gizé que quiçá, talvez, quem sabe podem mudar tudo o que sabemos sobre o Egito Antigo?
Se viram e ficaram sabendo dessas coisas todas, maravilha! Mas será que vocês, leitores bem-informados, se detiveram um minutinho sobre essas notícias, refletindo, por exemplo, sobre como agiria se fosse engolido por uma baleia? Mais: como é passar nove meses sem gravidade, preso a uma lata de sardinha gigante e confiando cegamente na tecnologia? E onde foi parar aquele encanto todo que o Egito Antigo despertava nas gerações anteriores?
Cometa
— Essa eu sei! Essa eu sei!
— Então diga lá, Joãozinho.
O encanto com os mistérios da história, do Universo e do mundo natural foi soterrado pelo entulho ideológico que limita a nossa curiosidade e imaginação. Viciados na política do Motta-disse-isso, Lula-disse-aquilo, Xandão-mandou-prender e Janja-viajou (de novo), acabamos por viver aprisionados num mundinho restrito, cheio de pessimismo e indignação imediatos, e acabamos por ignorar as manifestações mais sutis da Beleza, quando não da Verdade, ambas eternas.
A saída para isso não é a alienação completa. Para falar a verdade, eu não sei qual é. Mas, caramba, a gente tem que tentar reencontrar o equilíbrio, porque não é possível que o cometa C/2023 A3 (ou Tsuchinshan-ATLAS) tenha passado perto da Terra em outubro do ano passado – e a gente (eu, pelo menos) nem tenha ficado sabendo. Da próxima vez que o cometa iluminar o céu do Pilarzinho, será no ano de 82.025. Não, você não leu errado: 82.025. Dá para imaginar uma coisa dessas?
Com afinco
Percebe o que você e eu perdemos porque estávamos preocupados com a cadeirada de Datena em Pablo Marçal, com o laudo falso de que Boulos era usuário de drogas e com alguma outra polêmica que nos empolgou e/ou enraiveceu – e da qual hoje ninguém nem se lembra mais? E o mais curioso nisso tudo só me ocorre agora: é que, se eu pedisse a você para escolher entre acompanhar a passagem do cometa ou o debate entre os candidatos a prefeito de São Paulo, você escolheria...
Enquanto você pensa, pensa bem, pensa com vontade, pensa com afinco, eu o puxo para perto e lhe dou um abraço bem apertado, com direito a sonoros tapas nas costas. Inté!
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