Em defesa do voto eletrônico, por que o TSE nunca usou o argumento simples de que as grandes conspirações costumam ser impraticáveis?| Foto: Antonio Augusto/Secom/TSE
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Para o desespero do meu editor, aqui estou eu mais uma vez tangenciando perigosamente a temida lei eleitoral. É o que acontece com uma imaginação pateticamente rebelde (com essa idade!) diante de uma lei cujo espírito é francamente estúpido. Em minha defesa, sr. Editor, tenho a dizer que no texto de hoje exploro um argumento em defesa do voto eletrônico. Um argumento que, por algum motivo muito muito muito estranho, o TSE não menciona.

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"Como assim em defesa do voto eletrônico?!", pergunta você, os pontos de interrogação e exclamação disputando o protagonismo da indignação. Em defesa, ué. Essa é a graça da imaginação: ela permite que abandonemos o olhar fixo numa só direção para explorarmos ângulos diferentes e uns até bem inusitados.

Tropecei no argumento agorinha há pouco, ao andar por aí imaginando uma fraude eleitoral no Brasil. Logo me vieram à mente as imagens de bandidinhos adolescentes movidos a Gatorade e Red Bull, todos trancafiados numa sala subterrânea iluminada apenas pelo brilho das telas dos computadores. Neste meu delírio, o vilão comanda algum tipo de mega esquema super secreto e hiper complexo e...

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Já aí começou a se esboçar o argumento. Porque não conheço nenhum grande complô desse tipo e tamanho que tenha passado despercebido. E é impossível mesmo. Esse, aliás, é o segredo das conspirações de sucesso: mantê-las ao alcance de um grupo o mais reduzido e leal possível. Já as conspirações de fracasso, ou seja, a maioria, são teias elaboradíssimas com dezenas e até milhares de envolvidos numa organização que é simplesmente impraticável. Impraticável. Guarde essa palavra.

Você guarda, respira fundo e me pergunta se por acaso sujeitei esse semiargumento à análise dos pares, se o expus ao contraditório, se busquei a síntese? Claro que não! Como disse, estava à toa na vida, imaginando uma fraude eleitoral qualquer que pudesse me render uma crônica rebelde contra a Justiça Eleitoral, e tropecei nisso. Me virei, recolhi a coisa estranha da calçada (meu pensamento é civilizado!), botei no bolso e agora a mostro aos senhores. Não sei se é ouro ou pirita. Talvez seja até coisa pior que não vou mencionar aqui porque este é um jornal da família.

A alternativa a um complô centralizado seria um complô que simplesmente não combina com o comunismo: um complô descentralizado (claro!), de guerrilha. Se bem que guerrilha combina com o comunismo. Então melhor ignorar o “não combina com o comunismo”. Mas por que é que eu estava falando nisso mesmo? Ah, sim. Pensava eu na viabilidade de um complô com microcélulas independentes e espalhadas pelo Brasil, sem comando único nem estrutura organizada, mas unidas pelo mesmo objetivo de fraudar as eleições.

Acreditar nisso seria acreditar na possibilidade de mobilização de uma militância dessas. Uma militância de hackers espalhados por todo o Brasil, cada qual fraudando uma ou duas urnas por dia. Um sem saber que na sessão eleitoral ao lado pode ter um camarada fazendo a mesma coisa. Haja comprometimento ideológico, hein? E quantos militantes agindo de um só dos lados seriam necessários para que a fraude surtisse efeito? Afinal, o poder decisório de um único voto é estatisticamente insignificante. E até mesmo para obter uma vantagem mínima (51% a 49%) seria necessário fraudar milhares de urnas em centenas de zonas eleitorais diferentes.

Não acredito em tal capacidade de mobilização e organização. E muito menos na capacidade de manter tudo isso em segredo. Mas talvez você ou você (ou você aí no fundo) acredite. E é por isso que há meses venho dizendo que não custava nada a Justiça Eleitoral adicionar uma camada de transparência ao processo eleitoral. Essa soberba, acrescida do jeitão autoritário das sumidades de toga, é o que dá margem para a desconfiança. Por mais irracional que ela seja.

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Agora, o que causa estranheza mesmo é o fato de esse argumento (que vou batizar aqui de Argumento da Impraticabilidade das Fraudes Eleitorais, ou AIFE) jamais ter sido mencionado pelo TSE. Em vez disso, o tribunal prefere insistir no argumento da infalibilidade ou no de que a desconfiança no sistema é coisa de quem quer causar instabilidade política.

Será mesmo que ninguém no TSE pensou nisso? No AIFE, digo? Ou será que consideraram o argumento de difícil assimilação? Se bem que me ocorre agora a possibilidade de a omissão desse argumento ser intencional. De tudo fazer parte de uma conspiração maior que este mero cronista provincianíssimo não consegue enxergar. Uma conspiração que elimina todos os que mencionam o AIFE.

Melhor mudar o rumo desta prosa.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]