Dezembro. Fim de ano, Natal e Réveillon no cangote. Aquele clima alto astral de último capítulo de novela. Hora de olhar para o futuro. Reacender as esperanças. Confiar no próximo. Jogar-se de peito aberto nas coisas boas. Tudo vai melhorar. Tudo. Menos meu humor.
Detesto esse mutirão de felicidade que assola o mundo em dezembro. Basta chegar o último mês do ano e um tsunami de endorfina avança na corrente sangüínea das pessoas. Arrasta sem piedade qualquer pontinha de mau humor, rancor, tristeza ou desapontamento.
Tudo é filtrado e transformado em alegria. A felicidade jorra mais alto nos poros da população do que petróleo nos poços do Kuwait. Em dezembro, o único sujeito desolado é o dono da farmácia: no fim do ano ninguém precisa de Fluoxetina.
Dezembro é na verdade um mês tolo. No 12.º mês do ano as pessoas ficam abobalhadas. Porque pessoas felizes são abobalhadas. Ninguém é abobalhado quando está sério. Assim como ninguém é triste ou rabugento em dezembro.
Eu, por minha vez, me transformo em uma espécie rara nessa época. Em dezembro, praticamente viro um mico-leão-dourado por conta do meu mau humor, fiel escudeiro o ano todo. Coisa digna de ser catalogada pelo Ibama; descoberta a ser publicada em revistas científicas internacionais.
Ao contrário das outras pessoas, dezembro é um mês tão comum para mim que, assim como o resto do ano, não faço e não tenho a menor pretensão de fazer doações ou trabalhos voluntários de caridade – ações que viram verdadeiras febres nessa época.
Aliás, se eu fosse um sujeito religioso, em dezembro eu descumpriria os preceitos da igreja e continuaria com a mesma postura egoísta de todos os outros meses. Em minhas orações, não pediria a paz mundial, nem o fim da fome, da miséria, da violência, das doenças e de todas as pragas que acometem a humanidade. Para isso já há um batalhão de gente a clamar – todas pessoas muito mais esperançosas e competentes no quesito fé do que eu. Pediria apenas para ser o que todo mundo é em dezembro: feliz.