Toda pessoa deveria chegar à idade avançada no ritmo dos velhinhos de Copacabana. Vida ativa, exercícios físicos, diversão e, principalmente, bom humor.
Tudo bem, a paisagem ajuda. Afinal, exercitar-se no calçadão da praia de Copacabana tendo como vista a Baía de Guanabara é muito mais agradável do que ficar andando em círculos na pista de uma praça qualquer. Mas não vem ao caso. Os velhinhos de lá são diferentes. Ponto final.
Confirmei isso há duas semanas, quando estive com uns amigos no Rio. A intenção era passear pela Cidade Maravilhosa. Mas como o calor era infernal e a nossa sede era mais do mal ainda, preferimos curtir o Rio das mesas dos bares mesmo. O que, diga-se de passagem, não é nada mal. Em se tratando de São Sebastião do Rio de Janeiro, não há lugar mais apropriado na galáxia para se matar a sede com um chopinho bem gelado.
E foi no fim da tarde de um sábado, enquanto as bolachinhas de chope iam se empilhando na nossa mesa, que me dei conta disso. Primeiro, na mesa ao lado havia o aniversário de uma velhinha. Mas velhinha mesmo – coisa de 85 anos para mais. E ao invés de aquela senhora passar a virada de mais um ano de vida em casa, com chazinho e bolachinha, ela foi ao bar com a família.
Estavam todos lá. Filhos, netos, sobrinhos e, arrisco-me a dizer, até os bisnetos. Só faltaram o marido, os irmãos e alguns amigos. Mas esses muito provavelmente já não cumprem mais expediente aqui no planeta Terra.
Sei que todos abraçaram a velhinha, cantaram parabéns. Tudo muito singelo e verdadeiro. Eu mesmo quase me levantei para dar um abraço nela. Pena que meus amigos acharam melhor eu não me meter numa celebração particular, tão familiar. Em todo caso, não deixei de cantar parabéns com todo o pessoal do bar.
Na outra mesa, um casal também bem idoso. Ambos muito ajeitados. Ele de sapatos lustrosos, camisa e calça social perfeitamente passados, cabelos engomados. Ela era gordinha, o que não lhe tirava nem um pouco a vaidade e o charme. Os cabelos cuidadosamente pintados e um bonito par de brincos prateados nas orelhas eram a prova de que na juventude essa senhora deve ter sido um belo pitéu, daqueles disputados a tapas pela rapaziada. O que me chamou a atenção no casal é que enquanto ele tomava um guaraná, ela bebericava calmamente um caneco de chope escuro.
Na seqüência, chegou outro casal, amigo do primeiro. Cumprimentaram o casal que os esperava e no mesmo instante o telefone da senhora que havia chegado tocou.
– Oi, Clotilde, acabamos de chegar…
-…. – Clotilde do outro lado da linha.
– Como não vem?!? Você vai perder essa, Clotilde?!? Ah, Clotilde, você não me faça essa desfeita… – disse a senhora rindo.
Mas não tinha jeito. A Clotilde não iria mesmo. Parece que o velho dela não ia lá muito bem dos pulmões ou algo assim. Mesmo sem Clotilde e o velho dela, o jeito era se divertir. Segue o baile.
Os dois casais conversaram, deram gargalhadas, falaram dos filhos e dos netos, tomaram alguns chopinhos (menos o primeiro senhor, que resolveu se arriscar com outro drinque, passando do guaraná para a água tônica), jantaram, despediram-se e foram embora. Cada casal para o seu lado. Todos rindo.
Mais ou menos no mesmo instante em que o segundo casal chegou, entrou outro velhinho. Sozinho. Mas sozinho é só jeito de falar. Com uns 70 e poucos anos, mas completamente em forma – vai ver é da turma dos cabeças brancas que joga vôlei nas areias de Copacaba – ele ficou a maior parte do tempo de pé.
Não, não era nenhum problema circulatório que o impedisse de se sentar. O velhinho passou a maior parte do tempo cumprimentando as pessoas no bar. Ao que tudo indica, ele é mais conhecido do que nota de R$ 1 por aquelas bandas. Depois sentou-se à mesa onde estavam outras duas senhoras. No que uma delas disse:
– Nossa, Judith, ele é bonitão mesmo…
– Não te falei, Terezinha – disse a outra.
– Que é isso, moças. Se comportem – disse ele com um sorrizão maroto na boca e uma voz de locutor de rádio.
O mais bacana é que esse papo não era nem um pouco pretensioso, de velho que quer parecer jovem, que não quer revelar a idade que tem. Pelo contrário. Estavam apenas sendo sinceros, curtindo a vida de verdade e merecidamente.
Naquele dia, vendo aqueles senhores e senhoras, fui embora do bar e de Copacabana com uma certeza plena, a qual, sem dúvida nenhuma, levarei para o resto da minha vida. A de que você, Clotilde, realmente perdeu essa… Melhoras ao seu velho.