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Violência no futebol: estamos chegando lá

Angelo Binder / Gazeta do Povo
Rotina: a cada clássico, ônibus quebrados

Quando surgiu este blog, prometi a mim mesmo que não comentaria assuntos jornalísticos. A intenção aqui sempre foi trazer textos descontraídos, até porque já somos bombardeados de notícias ruins todos os dias. O objetivo sempre foi fugir um pouco desse horror que vivemos. E além disso os blogs dos meus colegas aqui de Gazeta prestam muito bem esse papel de comentar declarações, fatos e escândalos que ocorrem em nosso dia a dia, sem necessidade de que eu faça o mesmo. Mas neste texto, como um torcedor que há muito deixou de frequentar os estádios, frustrado por tanta violência, peço licença à meia dúzia de leitores que tenho pra comentar toda essa barbárie entre torcidas.

Após o atropelamento do estudante João Henrique Vianna e dos estragos a 28 ônibus no Atletiba do último domingo, mais uma vez o comando da Polícia Militar se reuniu com os chefes das torcidas organizadas para tentar encontrar uma solução. Foi mais uma reunião que acontece após uma baderna que, como todas as outras, não vai dar em nada.

Não vai dar em nada porque o problema da violência no futebol já extrapolou faz muito tempo à alçada exclusiva da Polícia Militar. Não estou eximindo a PM de falhas em todos os casos de baderna após as partidas. Para mim, se um sujeito leva “apenas” um tapa na cara ou se é metralhado na rua em uma briga de torcidas, a culpa é sim da Polícia Militar, que não fez um planejamento adequado. Afinal, ela existe justamente para coibir isso. Só que, ressalto, para nosso desalento, a PM está sozinha nesta luta.

Digo sozinha porque quem deveria ajudar de fato, o Ministério Público, muito pouco tem feito para conter toda essa selvageria. Enquanto a população é obrigada a se trancafiar em casa em dia de jogo – seja o humilde morador da periferia ou o bem-sucedido executivo do condomínio de luxo -, já que os bárbaros tomam conta da cidade, o MP parece deixar o grosso do problema para que a Polícia Militar resolva sozinha. E, conforme está bem claro, a PM sozinha não está dando conta do recado. O sinal de alerta está ligado faz tempo.

O Ministério Público do Paraná peca por manter as ações referentes à violência no futebol somente na esfera do Direito do Consumidor – a menos que seja um caso pontual, como será a do atropelamento de João Henrique. Mas esses bandos de criminosos geram danos ao patrimônio público e privado, ameaçam a vida dos outros, impedem o livre trânsito das pessoas pelas ruas, ônibus e terminaiis e vão às vias de fato contra outros cidadãos, que muitas vezes nada têm a ver com futebol. E isso tudo não é relação cliente-fornecedor. Isso tudo é crime. E como crime, deve ser tratado pelas promotorias criminais.

Segundo ponto. Estes arruaceiros agem assim porque sabem que, após fazerem todas as barbaridades que quiserem, terão de pena no máximo ficar algumas horas em uma delegacia, para logo em sequência serem liberados. E no próximo jogo lá estão eles novamente, para mais uma vez cumprir o ciclo: quebra-quebra, detenção, delegacia, liberação. E aí defendo a Polícia Militar, que vê todo o seu trabalho ir pelo ralo. De que adianta prender, se no próximo jogo os mesmos sujeitos vão estar lá causando transtorno novamente?

Já passou da hora do Ministério Público solicitar uma investigação à Polícia Civil para identificar e prender esses marginais, para que a Justiça, a partir de denúncia do próprio MP, possa condená-los ao que merecem: cadeia! Mas não, quem tem que fazer o papel de polícia investigativa nestes casos é a PM, que não é qualificada para isso. Ao invés de investigadores da Polícia Civil estarem nas ruas investigando os principais líderes desses bandos, prendendo esses delinquentes que, ressalto, ameaçam o patrimônio público e privado e os próprios cidadãos, quem os investiga são policiais militares à paisana. Resta aos PMs do Serviço Reservado contarem com a sorte para prenderem esses marginais, já que só podem fazer detenção em flagrante.

Durante a apuração da reportagem Dia de futebol é dia de briga em Curitiba, em que colaborei com os amigos Ana Luzia Mikos e Carlos Eduardo Vicelli, entrevistei o promotor de Justiça Ciro Expedito Scheraiber, coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Defesa do Consumidor. É ele quem comanda os assuntos relacionados a futebol no Ministério Público do Paraná. Por falta de espaço, a entrevista com o doutor Scheraiber acabou não sendo publicada na reportagem. Mas lembro muito bem que perguntei a ele se não caberia no Paraná uma ação mais forte por parte do Ministério Público, a exemplo do que ocorre em São Paulo, onde o MP acompanha de perto a ação das torcidas organizadas. Perguntei inclusive se não caberia a criação de uma promotoria exclusiva para cobrar punições referentes à violência no futebol. E a resposta foi de que aqui no Paraná a violência entre torcidas ainda não chegou ao nível de São Paulo e Rio de Janeiro, onde há tiroteios e ônibus queimados.

Realmente não chegamos a esse nível (ainda!). O que não dinimui em nada o temor da população em sair de casa em dia de jogos ou de o torcedor de bem ir ao estádio. Mas vale lembrar que falta só um pouco mais de inoperância para nos enquadrarmos nesta situação. Só um pouquinho mais. Porque se nada de efetivo for feito, não vai demorar muito para chegarmos lá.

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