Pela lei das probabilidades, o discurso inaugural de Barack Obama em 20 de janeiro será uma versão do tema “vamos ser bons e trabalhar todos em conjunto”. Os presidentes geralmente iniciam seus mandatos com pedidos por mais civilidade e cooperação – e um reconhecimento paralelo de que Washington falhou terrivelmente a esse respeito disso no passado e precisa melhorar.
George W. Bush começou sua administração com uma promessa de “mudar o tom” em Washington apenas para terminar com um lamento sobre sua incapacidade de fazê-lo. Bill Clinton iniciou seu segundo mandato pedindo um fim à “acrimônia e à divisão” e então gerou toneladas delas nos quatro anos seguintes (incluindo seu próprio impeachment). George H.W. Bush, pai do atual presidente, declarou em 1989 que sua presidência marcaria “a era da mão estendida”, apenas para chamar o congresso controlado por democratas de uma instituição de “Comitês de Ação Política, malandros, privilégios, partidarismo e paralisia”, em 1992.
Em outras palavras, essa idéia de “vamos ser bons” já foi levantada antes. E ela forma um dúbio cenário no qual Obama – que, durante sua campanha, pediu por uma “nova política” – entregará seu próprio pedido por respeito, cooperação e “união”.
Mais incerto é se esse sentimento é uma meta realista ou simplesmente uma tradição de bem-estar temporário, com vida curta. Seria possível “mudar o tom” em Washington, dado todo o ressentimento acumulado ao longo dos anos?
Nova esperança
Se é que isso importa, a grande maioria dos americanos pensa assim: 64% dos entrevistados em uma pesquisa da CBS no mês passado disseram acreditar que Obama pode trazer uma mudança real a Washington (contra 27% que não acreditam). Gestos conciliatórios e o uso da oratória abundaram nos dois lados nestas últimas semanas. A nova administração tem sido incansável para conquistar os líderes republicanos no congresso – diretamente ou através de emissários – enquanto muitos republicanos proeminentes foram generosos, começando por Bush (que recebeu novamente Obama na Casa Branca este mês, realizando um almoço com os três ex-presidentes vivos).
Apesar disso, veteranos de ambos os lados concordam que a amargura das décadas recentes é mais profunda que apenas um “tom”. Ed Kutler, lobista republicano que foi importante apoiador do Presidente da Câmara Newt Gingrich, prefere a palavra “reflexo”. A política hoje cria um “reflexo partidário” em seus praticantes, que, por sua vez, poluem o tom.
“O primeiro reflexo da maioria dos políticos é olhar para o próximo release de imprensa e os próximos 10 segundos na TV”, disse Kutler. Obviamente, depois que Obama fez suas nomeações iniciais – Rahm Emanuel como chefe de gabinete, David Axelrod como conselheiro sênior, por exemplo -, o Comitê Republicano Nacional imediatamente divulgou declarações criticando-as (“lançadores de bombas partidárias”, disse um porta-voz do comitê, Alex Conant). O ex-senador Tom Daschle, indicado por Obama para ser secretário de saúde e serviços humanos, foi igualmente criticado (“outra decepção”).
Bipartidarismo
No entanto, senadores republicanos pareciam não entender os pontos principais do Comitê Republicano Nacional a tempo para as audiências de confirmação de Daschle – um procedimento criticado por ser obediente demais (“aconchegante”, “uma festa do amor”, disse o “New York Times” em editorial).
“Tive uma recepção bastante calorosa”, disse Daschle em entrevista, e acrescentou que isso anunciava algo bom para o tom do futuro. Mas ele menciona uma óbvia advertência. “Até certo ponto, sempre existe um grau de cortesia”, disse ele. “No começo”. E então, se os precedentes se confirmarem, a política vai retroceder – àqueles padrões conhecidos.
Mesmo assim, realmente parece haver uma esperança bipartidária de que Obama possa ser uma figura incomum, cuja habilidade de unir partidos possa realmente criar uma harmonia contínua. “Acho que Barack será muito bom nisso”, disse o senador Tom Coburn, republicano de Oklahoma. O que ele quer dizer com “isso” é o desafio de incentivar a cooperação entre os partidos. “Fiquei muito bem impressionado”.
Porém, Coburn estava menos impressionado com os democratas do senado naquela manhã em que seu escritório divulgou uma declaração reprovando-os por um projeto de lei que, segundo ele, “zomba das esperanças de eleitores por mudança.”
“O Dr. Coburn quer comandar o senado”, disse humoradamente o líder democrata do senado, Harry Reid, em entrevista aoThe Hill. “Ele não comanda o Senado”.
Disputas
Houve tempos em que Reid provavelmente rezou para que outra pessoa o fizesse. Disputas mútuas – particularmente no senado – criaram grande parte da discordância inicial no novo ano. Reid enfrentou pressão de membros de sua cúpula após a recusa em permitir que um candidato a senador, Roland Burris – nomeado pelo hoje impedido governador de Illinois, Rod Blagojevich -, se juntasse a eles, e democratas do senado questionaram partes do plano de estímulos de Obama (especialmente em relação aos cortes nos impostos). “Não trabalho para Obama”, Reid teve de dizer a certa altura.
Enquanto disputas familiares podem ser divertidas de se ver – especialmente pela família da oposição -, elas são apenas um dos elementos que contribuem para o tom. A noção mais ampla de tom em Washington geralmente se refere à dinâmica entre os dois partidos, dinâmica que – apesar da sensação de atraso partidário – tem sido venenosa por décadas. Gerações de americanos não guardam qualquer lembrança de uma Washington sem marcas de forte divisão partidária e rancor, se é que já houve um tempo assim. Vale apontar que quase todos os discursos inaugurais já apresentados incluem alguma variação do tema “mudança de tom”: Zachary Taylor, em 1849, elogiou esforços para “suavizar a amargura”; Benjamin Harrison, 1889, disse que “deveríamos segurar nossas opiniões divergentes em respeito mútuo”; Calvin Coolidge, em 1925, insistiu que “não existe salvação num partidarismo restrito e intolerante.”
A questão de quem culpar pelo recente rancor e divisão bipartidários é, por si só, uma fonte de divisão e rancor bipartidários. Os democratas adoram culpar Karl Rove, ex-chefe político da Casa Branca, especialmente seu comissariado das eleições intermediárias de 2002, que estilhaçaram qualquer senso de unidade que tenha existido entre os partidos após 11 de setembro de 2001. Os republicanos muitas vezes falam genericamente dos “anos Clinton”, enquanto os democratas apontam que a liderança de Gingrich como presidente da câmara e o início dos procedimentos de impeachment contra o presidente produziram muito da maldade durante os anos 90.
Cooperação
Figuras veteranas de Washington falam nostalgicamente da década de 80, romantizando a afeição entre Ronald Reagan e o presidente da câmara Tip O’Neill, que supostamente gostavam de contar piadas e conversar por horas. Mesmo sua ligação parecendo genuína, ela era também exagerada e, de qualquer forma, não muito evidente em seus relacionamentos públicos. O sucessor de Reagan, o primeiro presidente Bush, afirmou em seu discurso inaugural que “um novo vento está soprando”, algo que não exatamente elogiava o velho vento.
Membros dos dois partidos concordam que a gravidade da crise econômica fará mais para promover um espírito de civilidade e cooperação do que qualquer pessoa ou entidade. “Há algo acontecendo conosco como não ocorre há um bom tempo: o medo”, disse o ex-senador Warren Rudman, republicano. “Temos que ter medo em dias como esses”. E acrescentou: “A menos que você seja um completo lunático”.
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