A política externa é, por tradição, um dos campos menos sujeitos ao controle do Poder Judiciário e, por extensão, em que o Poder Executivo tem mais liberdade para executar suas diretrizes. Nos Estados Unidos, há um debate acadêmico bem mais avançado sobre possibilidades e limites do Judiciário em controlar a atuação de diplomatas. Em breve, esse debate deve esquentar no Brasil.
Em março, pela primeira vez, o Brasil se pronunciou no exterior no sentido de que a expressão "gênero" deve ser entendida como sinônimo de "sexo biológico". Agora, a diretriz parece ter sido oficializada para todo o Ministério das Relações Exteriores.
Esse tipo de declaração, nas relações internacionais, tem o peso de evitar que se formem consensos que, com o tempo, acabam cristalizando novas normas. Para os conservadores, essa ressalva específica tem o condão de combater a ideologia de gênero nos fóruns internacionais.
Acontece que o Supremo Tribunal Federal acabou de reconhecer, no caso da criminalização da homofobia, que o artigo 5º, inciso da XLI, da Constituição Federal ("a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais") abrange a população "LGBTI+".
Da mesma forma, o diz o artigo 3º : "Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: [...] IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação" – que, em coerência com a decisão do STF, abrangem as contra a população LGBTI+.
O argumento está montado e já há grupos se preparando para acionar o STF contra o Itamaraty: as novas diretrizes das relações exteriores excluem os transgêneros e, portanto, são inconstitucionais. O debate vai ser quente.
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