O cenário está claro: por razões legítimas ou escusas, a depender do espectro político em que estiver o espectador, Gilmar Mendes quer colocar o ex-presidente Lula em liberdade. Mesmo com a derrota desta terça-feira (25), ainda há chances de ocorrer nos próximos meses – mas isso depende de um tribunal a mais de 2 mil quilômetros de Brasília: o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em Porto Alegre.
Nesta terça-feira, em julgamento na 2ª Turma, Mendes quase conseguiu seu objetivo: por sugestão sua, acatada pela defesa de Lula, os ministros analisaram a possibilidade de colocar o ex-presidente em liberdade provisória até que a turma julgasse o mérito do habeas corpus (HC) que está diante dos ministros.
Mendes até intuía que, na conjuntura atual, o ministro Celso de Mello, fiel da balança na 2ª Turma, não daria o passo de colocar Lula em liberdade. Tentou manobrar nos bastidores para tirar o HC de pauta – Mendes pediu vista em dezembro do ano passado e, assim, a bola está com ele –, mas a defesa insistiu, Mendes ficou constrangido, e a votação acabou ocorrendo. Lewandowski votou com ele, mas Cármen Lúcia, Edson Fachin e Mello fizeram maioria do outro lado.
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Contudo, recados importantes foram dados pelos ministros vencedores. Celso de Mello votou envergonhado, frisando que sua manifestação na decisão liminar (provisória) não tinha “nada a ver” com seu voto de mérito. Mello já votou pela suspeição de Moro, em 2013, diante de alegações até mais fracas do que as que faz a defesa de Lula na Lava Jato.
Mesmo Cármen e Fachin, os ministros mais "lava-jatistas" da 2ª Turma, deram sinais de que, a depender do desenrolar das reportagens sobre as conversas entre o ex-juiz Sergio Moro e os procuradores da Lava Jato, podem rever seu voto.
Fachin falou, por mais de uma vez, que votava contra a soltura de Lula “por ora, por enquanto”. Cármen, que preside a 2ª Turma, deu um voto sucinto, mas falou ao final da sessão sobre a “mudança de quadro” nas alegações de imparcialidade.
"É bom que se lembre que, mesmo o ministro relator [Fachin] e eu, que já votei no mérito, o acompanhando inicialmente, estamos abertos, pelo menos eu estou aberta, porque o julgamento não acabou, e o acervo que pode ser trazido, ainda com comprovações posteriores, não impede o uso de instrumentos constitucionais e processuais para a garantia dos direitos do paciente [Lula]", disse a ministra.
Se o HC voltar à pauta no segundo semestre, depois do fim do recesso, há chances de que Celso de Mello acompanhe Mendes e Lewandowski. Dependendo do “quadro”, até Cármen e Fachin podem segui-los. Mas há uma chance de que, mesmo com uma decisão favorável da 2ª Turma, o ex-presidente não seja solto: se o TRF-4 confirmar sua condenação no caso do sítio em Atibaia, pelo qual já foi condenado pela juíza Gabriela Hardt, em Curitiba, a 12 anos e 1 mês de prisão.
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Há sinais disso. Na mesma terça-feira que a 2ª Turma julgou a liminar de Lula, o desembargador Leandro Paulsen, presidente da turma do TRF-4 que revisa a Lava Jato, quebrou o habitual silêncio.
“Temos conseguido manter esses processos da Operação Lava-Jato praticamente em dia. Então, não tarda muito junto à nossa turma. Não temos razão nenhuma para atropelar, tampouco para retardar. Será no tempo adequado, assim que nós nos sentirmos seguros após a análise do processo como um todo, nós levaremos a julgamento. É possível que aconteça no segundo semestre deste ano”, disse a jornalistas em Porto Alegre.
Se Lula for condenado em segunda instância em um segundo processo – o qual, embora tenha sido instruído por Moro, foi julgado por Gabriela e que, em geral, se reconhece como mais sólido que o do tríplex no Guarujá –, e eventuais embargos forem julgados, o ex-presidente já poderá cumprir a pena de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do sítio, de acordo com a atual jurisprudência do STF.
Nesse ponto, os acusadores podem dormir tranquilos: embora o STF ainda tenha de julgar o mérito das três ações que questionam essa jurisprudência, e haja chances de o tribunal adotar uma nova posição ou retornar à que vigorou entre 2009 e 2016, o atual presidente Dias Toffoli não está disposto a comprar essa briga por enquanto. Ele até chegou a colocar as ações em pauta para o último mês de abril, mas voltou atrás e, na pauta do STF para o segundo semestre de 2019, ainda não há sinais das ações.
Quando a 2ª Turma votará o mérito do HC de Lula? Quando o TRF-4 votará a confirmação ou não da condenação no sítio de Atibaia? O destino de Lula parece depender, cada dia mais, da resposta a essas duas questões.