O sistema de justiça criminal brasileiro é uma coleção de absurdos. Alguns são bastante conhecidos como audiência de custódia, progressão de regime, saidinhas em feriados e visitas íntimas. Outros são pouco conhecidos como a remição de pena por leitura: o legislador decidiu que para cada livro que o criminoso preso ler – ou disser que leu – sua pena é reduzida em alguns dias.
Por quê? Não procure lógica nessas regras.
Outra questão que surge com frequência e geralmente recebe tratamento equivocado são os presídios.
Primeiro, é preciso dizer que as condições do sistema prisional brasileiro, de uma forma geral, são péssimas. Isso também é fruto de uma decisão ideológica de não ampliar e não melhorar as condições das cadeias.
Existe no Brasil um ecossistema formado por indivíduos e organizações voltadas para a defesa institucional de criminosos. Uma das atividades desse grupo é promover a pauta do desencarceramento. As entidades que defendem os direitos dos criminosos presos, e que dizem lutar pelo seu bem-estar, são as mesmas que usam todos os recursos para impedir a ampliação e a melhoria do sistema prisional. O exemplo mais gritante é o da Pastoral Carcerária. Basta uma visita ao site da entidade para descobrir que o primeiro item de sua agenda é a “suspensão de qualquer investimento em construção de novas unidades prisionais”.
Mas a falta de investimento na ampliação do sistema prisional é justamente uma das causas do seu estado precário e da superlotação. Por que, então, uma entidade que diz defender o bem-estar e direitos dos criminosos se posiciona contra a criação de novos presídios?
O grande número de criminosos presos é resultado do alto índice de criminalidade no Brasil, que é um dos maiores entre as democracias ocidentais. Como explica o promotor de Justiça Bruno Carpes, a “superlotação” é fruto do desinteresse – ideologicamente motivado – do Estado na “construção, reforma e consequente retomada do comando dos estabelecimentos prisionais” .
A crise dos presídios é fruto de uma decisão política, tomada com base em ideologia. Mas é fundamental também discutir as prisões dos pontos de vista moral e prático, para entendermos qual é o seu papel. Entender a finalidade da prisão liberta nosso pensamento de equívocos e falácias.
A função da prisão não é “reformar” ninguém. As funções da prisão são: primeiro, retirar o criminoso da sociedade, impedindo que ele continue cometendo crimes. Em segundo lugar, puni-lo pela ofensa cometida, enviando assim uma mensagem para todos aqueles que podem estar pensando em cometer crimes: vejam o que acontece com quem viola a lei. Em terceiro lugar, a prisão eleva o custo de cometer crimes e reduz os benefícios obtidos pelo criminoso. Isso já foi explicado em 1992 pelo economista Gary Becker, que naquele ano ganhou o prêmio Nobel de economia com seu trabalho sobre a chamada teoria econômica do crime.
A quarta função da prisão éa mais difícil de ser compreendida em países como o Brasil, que ainda estão submetidos à hegemonia cultural da esquerda. A prisão do criminoso também tem a função de dar às vítimas um sentimento de que a justiça foi feita. Em nosso país, graças ao incessante ativismo dos defensores de criminosos, a vítima perdeu até o direito à indignação.
Mais do que isso: além de ser vítima do crime, a sociedade ainda recebe a responsabilidade de “recuperar” o criminoso. A culpa do crime, e da reincidência do criminoso, é jogada sobre o cidadão de bem.
Mas cadeia não é assistência técnica de gente. Ela não é um lugar mágico, onde um sujeito que matou a própria filha, ou uma filha que mandou matar os pais, são transformados em cidadãos modelo através de algum processo mágico. Isso não existe.
Não existe, em nenhum lugar do mundo, uma prisão que transforme criminosos em cidadãos obedientes à lei. Na maioria dos países, grande parte dos criminosos reincide no crime. A melhor explicação para isso foi dada pelo psiquiatra forense Stanton Samenow: o criminoso pensa de uma forma diferente. Ele não sente qualquer empatia pela vítima. Quando deseja obter dinheiro, bens ou sexo ele simplesmente usa da violência ou de expedientes ilegais.
É claro que existe reabilitação. É claro que muitos criminosos abandonam o crime. Mas isso é sempre uma decisão pessoal, tomada depois de reflexão e arrependimento e, muitas vezes, auxiliada pela descoberta da religião. A realidade é que há muito pouco que o Estado possa fazer para convencer um criminoso a mudar de vida, além de elevar o custo do crime através da certeza e do rigor da punição.
Mas o debate sobre prisões para criminosos foi, há muito tempo, sequestrado pela esquerda. O próprio termo escolhido – “encarceramento” – já traz em si um juízo de valor evidente, ao enfatizar a perda de liberdade do criminoso e desprezar a segurança proporcionada à sociedade pela neutralização de uma grave ameaça ao seu bem-estar. Cada criminoso violento preso representa um grande número de vidas salvas.
Uma discussão verdadeira e honesta sobre prisões e presídios não pode acontecer sem consideramos o contexto da criminalidade brasileira. Não estamos falando de prisões na Finlândia ou na Noruega. Estamos falando de prisões no Brasil, país vive mergulhado em uma crise de criminalidade sem precedentes. Trata-se do país onde, apenas entre os anos de 2003 e 2018, mais de 875.000 pessoas foram assassinadas e outro número similar simplesmente desapareceu.
Estamos falando de um país onde áreas inteiras, nas maiores regiões metropolitanas, estão sob o controle de Estados paralelos que não se submetem à soberania do Estado.
A falácia da afirmação de que o Brasil “prende demais” é facilmente desmentida através da apresentação das estatísticas mais básicas sobre criminalidade. Um país onde 92% dos homicidas e 98% dos assaltantes nem chegam a ser identificados – e, portanto, jamais serão julgados ou presos – não é o país do “encarceramento em massa”, mas a pátria da impunidade.
Nenhuma discussão sobre presídios pode deixar de fora a vítima. Por isso, quando te mostrarem a foto de uma cela lotada e te pedirem piedade para os criminosos, peça para ver as fotos das vítimas.