Fachada do Supremo Tribunal Federal (STF).| Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil
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Uma fumaça toma conta do país. Ela dificulta a respiração, turva a visão e torna impossível enxergar o futuro. A fumaça não vem das florestas. É o Direito que queima.

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Não sou jurista. Sou engenheiro e jornalista. Sou também cidadão, eleitor, pagador de impostos e responsável por uma família. Minha profissão exige que eu entenda e explique o que acontece. Nunca foi tão difícil.

Peço a ajuda de amigos juristas. Tenho muitos, em escritórios de advocacia, na Magistratura, no Ministério Público e em universidades. Eles, generosamente, tentam ajudar. Vou resumir o que entendo, como cidadão.

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A ordem jurídica não pode ser um conjunto de regras aleatórias e desconectadas, criadas por diferentes pessoas em diferentes momentos, cada regra presa ao contexto político, ideológico e econômico de sua época.

O positivismo jurídico invade a vida pública e privada. Ninguém se sente seguro. Liberdade, propriedade e vida dependem do humor do dia. Foi reinstituído o crime de lesa-majestade

A ordem jurídica deveria ser a sistematização de princípios naturais, de regras observáveis que regem nosso comportamento pessoal e social, e que foram determinadas originalmente por nosso Criador. É tarefa difícil e imprecisa identificar essas regras naturais e codificá-las em leis e regulamentos.

Esse modo de pensar o Direito se chama jusnaturalismo. Segundo essa visão, leis não devem ser uma criação artificial e voluntariosa, mas a formalização dos princípios da nossa natureza, como definida pelo Criador. Exemplos dessas regras, encontráveis em quase todas as culturas, são a proibição do assassinato, o respeito à propriedade privada e a instituição do casamento.

O oposto disso é o juspositivismo ou positivismo jurídico, a absurda ideia de que alguns iluminados devem ter o poder de criar regras arbitrárias, sem coerência, sem lógica e muitas vezes contrárias às leis naturais, às quais todos nós devemos obedecer simplesmente porque são leis criadas pelo Estado.

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Mas uma lei que exige da propriedade uma “função social”, sob pena de confisco pelo Estado, não se sobrepõe ao direito natural à propriedade. Uma lei que dá liberdade a assassinos não torna o homicídio menos hediondo. Legislação que trata indivíduos de formas diferentes – melhor ou pior – de acordo com sua etnia ou gênero fere o princípio da igualdade diante de Deus e da lei.

O positivismo jurídico, anabolizado pelo ativismo judicial, saiu de controle. Magistrados, insatisfeitos com seu papel de julgar a aplicação das leis, passaram a produzir legislação. Qualquer desejo volátil, obsessão ideológica ou rancor íntimo pode ser instantaneamente transformado em leis aplicáveis a milhões de pessoas. São leis que podem voltar no tempo, começando a valer anos antes de sua concepção, ou ser ligadas e desligadas, como se fossem a luz de um salão, para que interesses sejam momentaneamente atendidos. Ordens judiciais são emitidas em segredo e divulgá-las se torna um novo crime. Formalidades antes consideradas essenciais, sem as quais processos seríssimos foram jogados na lata do lixo, agora são ignoradas.

O positivismo jurídico invade a vida pública e privada. Ninguém se sente seguro. Liberdade, propriedade e vida dependem do humor do dia. Foi reinstituído o crime de lesa-majestade. Sonham com a volta de jagunços.

Queima o Direito. A fumaça sufoca.

Agora tentam transformar policiamento em questão jurídica. Em breve, cada policial precisará manter ao seu lado um advogado, para certificar-se de que não está violando alguma das infinitas leis e regras, reais ou imaginárias, criadas para preservar o direito sagrado que os criminosos têm de cometer crimes.

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Nesse incêndio assombroso viraram cinzas o devido processo legal, o princípio do juiz natural, a inércia do Judiciário, a independência do Ministério Público, a separação dos poderes, a proibição de censura, o direito à ampla defesa, o princípio fundamental de que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer qualquer coisa senão em virtude de lei e aquele que diz que não existe crime sem lei anterior que o defina.

As chamas dessa queimada ardem tão alto que queimaram os satélites da Starlink.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]