"A questão nunca é a questão”, já dizia o estrategista da esquerda americana, Saul Alinsky. “A questão é sempre o poder”. Quem combate o crime no Brasil não pode esquecer isso. Há décadas uma minoria radical controla o debate sobre crime e justiça e atribui à polícia a responsabilidade pelos atos dos criminosos. É absurdo. Mas todas as vezes em que há feridos durante operações policiais o diagnóstico está pronto: a culpa é da polícia.
Basta um pouco de lógica e senso moral para perceber que a culpa por ferimentos e mortes de inocentes, na verdade, é dos criminosos que decidiram enfrentar a polícia com armas de guerra. Mas lógica e moral são ignoradas. A maioria das “reportagens” – entre aspas mesmo – e quase todos os manifestos de ONGs de “direitos humanos” – aspas novamente – chamam policiais de assassinos. “Relatórios” e “estudos” – entre muitas aspas – realizados por universidades sobre ações policiais não passam, em sua maioria, de panfletos ideológicos com verniz acadêmico. Esses panfletos são usados como base para políticas públicas de segurança.
É absurdo chamar toda morte em ação policial de homicídio.
Como consequência, desde junho de 2020, operações regulares da polícia do Rio de Janeiro nas “comunidades” – eufemismo usado para descrever as favelas – estão proibidas por decisão judicial, exceto em casos excepcionais e com prévia justificação.
Todos os dias discute-se a adoção de novas restrições às ações policiais. Os criminosos, cientes disso, seguem cada vez mais ousados, dispostos a matar ou morrer e sendo treinados para isso. É o que dizia uma matéria exibida recentemente em uma grande rede de mídia. As imagens da matéria mostravam um exército de mercenários – ou seria melhor dizer guerrilheiros? – praticando manobras militares em uma favela carioca.
O Rio chegou ao fundo do poço do crime em 2017. O colapso da segurança levou a uma explosão dos índices criminais. Em 2018, uma intervenção federal na segurança estancou a sangria e ajudou as polícias a se reequiparem. Transformadas em secretarias autônomas a partir de 2019, as polícias militar e civil partiram para o enfrentamento. Com isso, todos os índices de crimes violentos do Rio de Janeiro diminuíram. A única exceção foi o número de criminosos mortos em confronto com a polícia, que aumentou. Soldados do narcotráfico são doutrinados, treinados e equipados para enfrentar a polícia. Trata-se de uma guerra. Qualquer ação policial que tente prender esses criminosos resultará em mortes.
No Brasil, um policial que responde à ação criminosa conforme determina a lei está cada vez mais sujeito ao arbítrio ideológico.
A partir da restrição judicial de 2020, os avanços que haviam sido conquistados foram perdidos. O narcotráfico consolidou o domínio de territórios que já tinha, aumentou o estoque de armamento, construiu fortificações e avançou sobre novas áreas. Dados do Disque Denúncia mostram que o número de denúncias sobre barricadas do tráfico em 2023 voltou aos níveis de 2019. O que os dados mostram é ainda pior: a maior parte das denúncias vem de áreas que nunca tiveram fortificações. O morador de áreas já tradicionalmente ocupadas pelo tráfico não denuncia mais; ele não tem mais esperança de mudança. A denúncia agora vem de áreas que, até pouco tempo, eram seguras. Quanto tempo levará até que esses denunciantes também percam a esperança?
Diante dessa realidade, cabe perguntar: por que insistir no que não funciona? Por que limitar cada vez mais o trabalho da polícia, quando o que se precisa é o oposto, limitar a ação dos bandidos? O motivo é ideologia. Um bom exemplo é o debate em torno da chamada “letalidade policial”. Quando um criminoso oferece resistência à prisão e demonstra intenção de matar o policial, a morte do criminoso não caracteriza um homicídio porque estão presentes os excludentes de ilicitude do estrito cumprimento do dever legal e da legítima defesa da própria vida.
Por que limitar cada vez mais o trabalho da polícia, quando o que se precisa é o oposto, limitar a ação dos bandidos?
É absurdo chamar toda morte em ação policial de homicídio. O delegado Fabrício Oliveira, da Coordenadoria de Recursos Especiais da Polícia Civil do Rio, lembra que esta diferenciação já é adotada pela ONU. Ela é adotada também pelo FBI e pelo EUROSTAT, o Gabinete de Estatísticas da União Europeia. Apesar disso, esse conceito ainda não foi compreendido pela maioria da mídia brasileira, pelos “especialistas” de talk shows e pelas entidades produtoras de estatísticas criminais.
O problema é ainda mais grave: a divulgação de estatísticas sobre “letalidade policial”, em geral, comete grave erro metodológico, pois utiliza números absolutos de criminosos mortos, quando o certo seria relacionar o número de mortos em confronto com o número de criminosos presos.
É simples de entender. Infratores são mortos quando a polícia está tentando prendê-los. Assim, quanto maior o número de prisões, maior a chance da ocorrência de morte de criminosos. Uma polícia que prende mais criminosos terá números absolutos de "letalidade" maiores do que outra polícia que prende menos. Traduzindo: se a polícia vai à rua com frequência efetuar prisões, é de se esperar que aumente o número de criminosos mortos. Se a polícia faz poucas prisões, sua "letalidade" deverá ser mais baixa.
Nenhuma polícia do mundo enfrenta tantos confrontos ao tentar prender criminosos como a polícia brasileira. O criminoso que aponta uma arma para um policial americano, britânico, alemão ou francês receberá uma resposta dura e imediata. Recentes distúrbios no estado americano da Filadélfia e na França tiveram origem na morte de indivíduos que resolveram confrontar a polícia.
No Brasil, um policial que responde à ação criminosa conforme determina a lei está cada vez mais sujeito ao arbítrio ideológico de engenheiros sociais, de ativistas judiciais e dos revolucionários de plantão que tentam controlar o sistema de justiça criminal. A consequência disso é o incentivo ao crime, especialmente nas áreas pobres onde o narcotráfico estabeleceu o seu domínio.
Como diz o escritor Theodore Dalrymple, “os pobres colhem o que os intelectuais semeiam”.