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Muro grafitado em Minneapolis, Estados Unidos, com mensagens do movimento Abolish The Police.
Muro grafitado em Minneapolis, Estados Unidos, com mensagens do movimento Abolish The Police.| Foto: Wikimedia Commons

Inspirado em uma reflexão do meu amigo Jorge Machado.

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Está em curso uma guerra contra as polícias. Ela está muito bem documentada no excelente Guerra à Polícia: Reflexões sobre a ADPF 635, escrito por juristas e policiais. Essa guerra, que é promovida por forças políticas de esquerda misturadas com outros interesses, não é exclusividade do Brasil.

Ela provavelmente se originou nos Estados Unidos onde, depois de ser por muito tempo uma pauta essencial, mas subentendida, da esquerda, ela finalmente se cristalizou publicamente no inacreditável movimento “Abolish the Police” (em tradução livre: “acabemos com a polícia”). Seus defensores – ou seria melhor dizer combatentes? – encontraram espaço até em um editorial do jornal The New York Times.

Muitas cidades americanas – por coincidência, todas governadas pelo Partido Democrata, um partido controlado por ativistas de uma esquerda cada vez mais radical - decidiram conduzir essa guerra retirando boa parte da verba dos departamentos de polícia (observação: nos Estados Unidos, a polícia de rua das cidades é municipal e os chefes de polícia são subordinados aos prefeitos).

Essas cidades agora estão pagando o preço dessas decisões. San Francisco, uma das cidades mais bonitas e festejadas dos Estados Unidos, entrou em uma espiral de desordem urbana e crime. No dia 4 de abril Bob Lee, um conhecido executivo de tecnologia e investidor, criador do aplicativo Cash App, foi esfaqueado em uma rua de San Francisco e morreu.

A então prefeita de Chicago, Lori Lightfoot, aderiu entusiasticamente ao movimento de corte de verbas da polícia. O resultado: o crime em Chicago (que sempre foi uma cidade perigosa para os padrões americanos) saiu de controle. Lighfoot foi a primeira prefeita de Chicago em 40 anos a perder a reeleição.

San Francisco, uma das cidades mais bonitas e festejadas dos Estados Unidos, entrou em uma espiral de desordem urbana e crime

É dos Estados Unidos que os partidos de esquerda brasileiros importam a absoluta maioria de suas táticas e uma boa parte de suas ideias, inclusive a de atacar e tentar incapacitar a polícia.

Por isso, no Brasil, diariamente, a maioria dos veículos de mídia tem alguma manchete negativa envolvendo a polícia. Segundo esse “consenso” jornalístico, a polícia brasileira nunca tem razão, nunca acerta, nunca cumpre com a sua missão e é ela – a polícia – a principal causa da insegurança.

É inacreditável, mas essa guerra contra a polícia – e a favor dos criminosos, é evidente – acontece diante dos nossos olhos.

Outra forma de se atacar a polícia é fazendo uso político de ações policiais. Mais uma vez, basta observar o noticiário.

É preciso respeitar a polícia, que é instrumento chave na garantia de direitos fundamentais como o direito à vida, o direito de ir e vir, o direito à propriedade e até o direito à livre expressão. Quem ataca a polícia, de uma forma ou de outra, ataca esses direitos. Ou seria melhor dizer: quem ataca a polícia não acredita nesses direitos.

O direito à livre expressão é, com razão, considerado uma das bases da democracia e da liberdade. Mas andar pelas ruas sem ter medo de ser vítima de um crime é também um componente essencial da liberdade - e uma sensação que a maioria dos brasileiros só experimenta quando viaja ao exterior.

A democracia é um sistema frágil. O crime, quando não é combatido, torna-se forte. A democracia é feita por homens livres. O crime é cometido por homens prisioneiros de suas fraquezas morais e escolhas ruins.

É dos Estados Unidos que os partidos de esquerda brasileiros importam a absoluta maioria de suas táticas e uma boa parte de suas ideias, inclusive a de atacar e tentar incapacitar a polícia

O capitalismo – o sistema econômico que mais retirou pessoas da pobreza em toda a história - é frágil. Ele depende de uma rede de cooperação mútua baseada em confiança e segurança. O criminoso ataca esses dois pilares. O crime é anticapitalista. Talvez esteja aí a explicação para a condescendência da esquerda com os criminosos.

O Brasil tem uma das melhores forças policiais do mundo. Tanto no nível estadual quanto no nível federal, poucas polícias estrangeiras enfrentam os desafios que nossa polícia enfrenta. Mas a polícia é apenas um dos componentes do sistema de justiça criminal, que inclui também o Ministério Público, a Defensoria Pública, o Judiciário e o sistema prisional.

O sistema de justiça criminal funciona de acordo com as regras expressas na legislação, incluindo o Código Penal, o Código de Processo Penal e a Lei de Execução Penal. A legislação não ficou imune à mesma infiltração ideológica que gerou a guerra contra a polícia. Não seria exagero dizer que existe também uma guerra contra o Direito Penal, uma guerra a favor dos criminosos, que há décadas atua para reduzir as punições e criar, para os criminosos brasileiros, benefícios inéditos no Ocidente.

Escrevi um livro contando essa história: A Construção da Maldade. Nele menciono aquilo que o procurador de Justiça Adriano Alves-Marreiros chama de fetiche da pena mínima. Essa expressão se refere à prática de aplicar sempre a pena mínima prevista no Código Penal, ao invés de dosar a pena de acordo com as circunstâncias específicas do caso.

É mais um incentivo ao criminoso brasileiro.

Outra questão importante, que ainda não foi bem compreendida pela mídia, diz respeito aos crimes cometidos por traficantes. A ignorância ou desinteresse dos jornais sobre esse assunto é ainda mais surpreendente quando nos lembramos do jornalista Tim Lopes, vítima da brutalidade do tráfico de drogas. Tim foi sequestrado, torturado, julgado e executado por traficantes do Rio em 2002. Seus algozes foram logo presos; cinco anos depois um deles ganhou o benefício de progressão para o regime semiaberto e fugiu. Três anos depois a mesma coisa aconteceu com o outro criminoso: ganhou direito à progressão de regime e fugiu.

Apesar disso, e de milhares de histórias semelhantes, a maioria da mídia continua se apegando à ideia de que o tráfico de drogas é o simples comércio de uma substância proibida. O traficante seria apenas um comerciante que ainda não tem uma licença do Estado (mas que um dia, inevitavelmente, terá). A mesma ideia encontra receptividade em setores do sistema de justiça.

Esse equívoco tem origem no fato de que, na lei, a descrição do crime de tráfico de drogas não inclui o uso de violência. Como é evidente para qualquer brasileiro que viva em uma grande cidade onde existam favelas, essa definição é completamente divorciada da realidade. Ainda assim, ela continua válida e servindo de instrumento para que monstros assassinos sejam colocados em liberdade após passar curtas temporadas na cadeia.

Os fatos são claros e os exemplos estão sempre à mão. O delegado Fabrício Oliveira, Coordenador da Coordenadoria de Recursos Especiais da Polícia Civil do Rio de Janeiro, lembra que há seis anos ocorria uma guerra por disputa territorial entre os grupos narcoterroristas, gerando pânico na população. A polícia agiu imediatamente, prendendo 45 criminosos e aprendendo 48 armas de fogo, incluindo fuzis e explosivos.

Como se tratava de uma guerra, a expectativa era de que os envolvidos fossem acusados por diversos crimes como organização criminosa (pena de 3 a 8 anos), tentativa de homicídio qualificado (pena de 12 a 30 anos) porte ilegal de armas de uso restrito (pena 3 a 6 anos) e vários outros delitos.

Mas um exame dos processos mostra que vários dos criminosos presos foram processados e condenados apenas pelo crime de associação para o tráfico de drogas, com causas de aumento de pena, e receberam sentenças entre 5 e 8 anos de prisão. Um cidadão comum, que estivesse portando um fuzil em desacordo com a legislação, possivelmente teria uma pena igual ou maior.

Isso, provavelmente, tem origem na curiosa interpretação jurídica que diz que a violência e todos os outros delitos praticados pelos traficantes são inerentes ao crime de tráfico – ou seja, estão “embutidos” no ofício de traficar – e, por isso, não devem ser objeto de punições em separado.

O tratamento jurídico dos criminosos brasileiros é cada vez mais repleto de curiosidades.

O resultado é esse: criminosos conduzem uma guerra no meio de uma grande cidade e recebem punição por apenas um dos muitos crimes que cometeram. Em breve estarão de volta às ruas para repetir seus crimes.

As penas, que deveriam ser extremamente duras para desestimular o delito e a reincidência, são, ao contrário, tão leves que têm servido de estímulo.

É como se o Estado brasileiro fizesse uma promoção, uma black friday da insegurança: cometa vários crimes, mas pague por um só.

O traficante porta armas de uso restrito, tenta matar policiais e coloca a vida de inocentes em risco, mas é condenado apenas por vender drogas.

É como se o traficante recebesse do Estado uma “licença” para portar fuzis e granadas e enfrentar a polícia.

Um Estado que trata dessa forma criminosos perigosos não terá o monopólio da força por muito tempo.

Conteúdo editado por:Jônatas Dias Lima
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