Do Santa Cândida ao Capão Raso, do Centenário ao Campo Comprido, nenhuma viagem é longa demais quando se tem um livro bem no jeito guardado contigo. Você se acomoda, em pé ou sentado (quando tem um pouquinho de sorte/dependendo do horário) e é só ouvir a porta fechando (você leu porta fechando com a voz da moça que anuncia as paradas?) e abrir seu companheiro que um novo mundo também se abre pra você e te puxa para dentro dele.
Tchau, tubos! Tchau, céu nublado! Tchau, mocinho ouvindo música ruim (ok, gosto é relativo) sem fone às oito da manhã! Estou indo pra Macondo. Ou pra Nárnia. Ou pra Terra Média. Só não estou aqui!
E o pior é que não está mesmo. Você chora e ri sem ter a menor vergonha de ser feliz (ou triste) e nem percebe o sujeito curioso espiando a capa do seu livro para saber o que você está lendo. Aliás,quando esquece seu exemplar em casa, você também faz isso com os outros, pode confessar!
Durante esse trajeto, as horas são estranhamente desreguladas. Isso porque o tempo do personagem da sua história não cabe no modesto horário de Brasília. Seu relógio surtaria se tivesse que se encaixar na cronologia psicológica de Mrs. Dalloway, por exemplo. E, como você nem está no ônibus de corpo e alma presentes, e sequer se lembra que tem um relógio (utilidade pública: cuidado com furtos no interior do veículo), acaba se perdendo nos minutos. Mas, tudo bem. Mais vale se perder no momento do que perder o momento de se perder num baita romance!
Pra não deixar seu tubo para trás, você cria algumas técnicas, faz uns acordos consigo mesmo. “Vou contar o tempo por páginas, por letras, pelo rodapé (merchan subliminar do blog #jequitifazendoescola), mas o seu TOC não te deixa interromper a leitura enquanto não chega o fim do capítulo. E, olha, tem capítulo que é grande pra caramba. Fazer o que, se é desses assim que você gosta.
E pode passar seu vizinho, sua tia, a primeira namorada, a professora do jardim, companheiros de estrada, que você não vai ver ninguém. Porque está apaixonadamente enclausurado dentro do seu livro. Pode passar o Oil Man, o Inri Cristo, o Julio Iglesias voltando do Gato Preto, o terminal do Portão que…não, pera! Terminal do Portão?
Aí você vê que perdeu seu ponto 🙁
Dizem que essa coisa de ler no ônibus é um vício. Um caminho sem volta. Mas não é não. Desde que você não se importe em voltar a pé pra parada perdida a algumas quadras, há alguns minutos, há algumas páginas.