Embora tão antiquado que, segundo as más línguas, ainda se dedica com paixão às palavras cruzadas, mesmo assim o professor Afronsius empacou em uma delas:
– Horizontal, 7 letras – relativo a, ou que tem forma de abside.
Abside?
Ai, aproveitando a chegada de Natureza Morta, para o que deveria ser o descontraído bate-papo diário junto à cerca (viva) da mansão da Vila Piroquinha, não se fez de rogado:
– Relativo a, ou que tem forma de abside. Sete letras.
– Desculpe, mas não faço a mínima ideia. Procurou na internet?
– Não, de jeito nenhum. Meu negócio é papel. Só que não achei num dicionário edição pós-reforma ortográfica.
Nisso, eis que surge Beronha. Estranhando o silêncio (e, pensando, a zica deve ser comigo), quis saber:
– Palavras cruzadas? Posso ajudar?
Mesmo demonstrando uma ponta de incredulidade, professor Afronsius voltou a dar a mão à palmatória:
– Por favor. Sete letras, relativo a, ou que tem forma de abside
– Ora, absidal… Adjetivo.
– Tem certeza?
– In totum. Substantivo feminino. A abside. Coisa de arquitetura. Qualquer recinto abobadado, cuja planta é semicircular ou poligonal. Nas basílicas romanas, o nicho semicircular e abobadado onde se achava o assento do juiz. Nas basílicas cristãs e noutros tipos de igreja, a cabeceira do templo, onde fica o altar-mor. Ou o oratório reservado, por trás do altar-mor.
Professor Afronsius e Natureza confessam sua estupefação.
– O quê mesmo? Estupe… Nunca ouvi falar. Já abside, absidal, tive de aguentar ontem à noite, vendo um programa na TV sobre as maravilhas arquitetônicas da Grécia e do antigo Egito. Senti saudade dos desenhos do Pica-Pau.
E o nosso anti-herói de plantão se despediu:
– Inania verba. Palavras ocas, inúteis…
ENQUANTO ISSO…