Mesmo para quem nunca leu Monteiro Lobato, não indo além do “Sítio do Pica-Pau Amarelo” na versão televisiva, o escritor virou assunto do momento. Por conta do que foi classificado de “frisson causado pela mídia”, Natureza Morta e o professor Afronsius não puderam ficar de fora da questão do alegado cunho racista de alguns livros do autor de “Urupês” e, para quem, “um país se faz de homens e livros”.
– Mas com o devido cuidado – tratou de ressaltar o solitário da Vila Piroquinha, que jamais esqueceu de um certo cidadão que costumava dizer: “Não sei de nada, desconheço completamente o assunto, MAS ACHO QUE…”
E aí punha-se a discutir fissão nuclear, mineralogia, fetichismo, yoga, jazz, planejamento urbano, saneamento básico, construção civil… Sempre professoral e definitivo no que dizia.
– Ah, o Abelardão, assessor de Deus?
No índex (92 anos depois)
Voltando à obra de Lobato, cujos livros “Caçadas de Pedrinho” (literatura infantil, 1933) e “Negrinha” (temática adulta, 1920) estão na mira de alguns setores, o professor Afronsius disse ter apreciado a colocação feita pela revista CartaCapital, para quem “o racismo deve ser combatido no plano concreto, via ações afirmativas, e no simbólico. Mas vetar livro é a saída?” Mas, por outro lado, como mantê-lo, sob os auspícios do governo, no Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE)?
Nos EUA, em 2011, Huckleberry Finn, de Mark Twain (1835-1910), foi republicado, em edição modificada, para fugir de uma polêmica quase igual. E entrou em cena o “politicamente correto”.
No texto da CC, Willian Vieira recorda que Lobato morreu em 1948. “Quando escreveu seus livros, a escravidão tinha sido abolida havia 50 anos. Os ex-escravos eram marginalizados por uma segregação informal que só foi amortecida lentamente, tanto que é visível nas favelas do Rio, na periferia de Salvador e nas filas de desempregados país afora”.
– Como já disseram, houve a abolição da escravatura, mas ainda se aguarda a libertação dos escravos… – atalhou Natureza.
Voltando à revista. Ela cita o romance (para adultos) “O Presidente Negro”, de 1926, “com toda a discussão da eugenia como solução para tensões raciais finalizada pela proposta dos raios ômega e em cartas para amigos, onde ele (Lobato) admitiu que sentia inveja dos norte-americanos por terem criado algo como a Ku Klux Klan”. E vem outra pergunta:
– Mas privar a maioria dos brasileiros de um passado vergonhoso não seria anti-histórico?
Opinião de Joaquim
Lobato já foi alvo muitas vezes. Por variados motivos. Basta ver a revista Joaquim (1946). O escritor paulista é criticado por dar mais atenção “às paisagens do que aos homens” e usar “artificialismos quando pretende descrever os seres humanos”.
– O sr. Monteiro Lobato, ainda em vida, é um autor póstumo. Um Cornélio Pires passado a limpo.
Quem deu a sentença? Um certo Trevisan. Dalton.
ENQUANTO ISSO…