Em dezembro de 2010, o então ministro Juca Ferreira, da Cultura, anunciou a aquisição do Acervo de Glauber Rocha para acesso público. No conjunto, 22 filmes, além de 80 mil documentos, incluindo a sua correspondência pessoal, roteiros de filmes, peças, poemas e romances.
Do total, 223 roteiros e projetos de livro permaneciam inéditos. Uma parte importante do material já tinha sido digitalizada em 2008. E, em agosto do ano passado, a Cinemateca Brasileira apresentou a Retrospectiva Glauber Rocha, dentro das comemorações dos 70 anos de fundação da Cinemateca. Até então, grande parte do material, para dizer o mínimo, não era de acesso público.
Depoimento do cineasta
Em maio de 2005, a revista Indústria Brasileira, ao abordar o projeto de recuperação dos filmes de Glauber Rocha e outros diretores, como Joaquim Pedro de Andrade, publicou trechos (então) inéditos de um press book escrito pelo cineasta para o lançamento de Terra em transe:
– É um filme urbano, direto, concentrado, violento, direto. É um filme onde não existem efeitos técnicos nem sequências de brilho. O que interessa é o seu todo dramático, a história que narra, os problemas que debate numa atmosfera onde o real e o fantástico se misturam dentro da maior liberdade possível. Recuso qualquer influência. Terra em transe é um filme meu, individual, sem referências abertas e sem qualquer macaqueamento.
Mais Glauber com a palavra:
– Não tenho pretensões de fazer grandes filmes. Tenho apenas a justa ambição de expressar a minha realidade da maneira que posso expressar. Viso todas as camadas do público. Se meus filmes são às vezes herméticos, reconheço que isso é uma falha minha. Mas só me sentirei bem como o cinema no dia em que, sem fazer concessões à pornografia e ao mau gosto, atingir o público. (…)
– Terra em transe é um filme sobre política e é um filme político. Ele não contém mensagens acabadas, eu não sou professor. É um espetáculo sobre política, um espetáculo sobre os problemas morais da política, um espetáculo sobre a consciência política e um espetáculo sobre os movimentos políticos.
– Técnica de filmar? Improviso total com os atores e a câmera. Mas, antes, dois anos de roteiro, setecentas páginas escritas e reescritas. Depois, podemos improvisar à vontade, recriando o mundo, a atmosfera, os sentimentos.
O cinema vem do ator, do ar, da luz, dos cenários, do humor da equipe, da alegria ou da tristeza, do cansaço ou da disposição – conclui.
Da censura à prisão
Terra em transe foi selecionado para a mostra competitiva do Festival de Cannes apesar da oposição do Itamaraty, que indicou para o festival Todas as Mulheres do Mundo, de Domingos de Oliveira.
Glauber foi preso em novembro de 1965 por participar do protesto contra a ditadura (civil militar) durante a reunião da Organização dos Estados Americanos (OEA) no Rio de Janeiro. Ficou encarcerado 23 dias.
De 1971 a 1976, banido pela ditadura civil militar, viu-se forçado a recorrer ao exílio.
Glauber Rocha, um brasileiro.
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