O amigo, jornalista e historiador Milton Ivan Heller acaba de lançar “A Atualidade do Contestado – Edição do Centenário da Guerra Camponesa”, JM Editora. E foi entrevistado pelo Extra Pauta, jornal do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná.
Classificado por Eduardo Galeano como “uma das maiores guerras civis do continente americano”, no livro “As Veias Abertas da América Latina”, Editora Paz e Terra, 1979, 6.° edição, o Contestado, mesmo assim, é um pedaço (quase) esquecido da história.
Silêncio e estupidez
O livro de Galeano, aliás, começa com a citação de uma frase da Proclamação Insurrecional da Junta Tuitiva na Cidade de La Paz, em 16 de julho de 1809: “…Temos guardado um silêncio bastante parecido com a estupidez”.
Curto registro: o conselho editorial da Paz e Terra era formado por Antonio Candido, Celso Furtado, Fernando Gasparin e Fernando Henrique Cardoso. É, ele mesmo.
Voltando ao livro e à entrevista de Milton Ivan. Para ele, que lamenta a despolitização entre os jovens (“muitos não têm referência, não sabem nem sobre o golpe militar de 1964”), o Contestado foi condenado a cair no esquecimento.
E prossegue:
– Uma semelhança que o Contestado tem com outras guerras no Brasil é que o latifúndio estava envolvido. Assim como em Canudos. No Contestado, porém, havia outros fatores. Não se pode esquecer que as empresas Brazil Railway e a Lumber, amparadas pelo poder do Estado, foram responsáveis por desapropriações de terras e um desmatamento jamais visto. Para alguns, como Ernani Buchmann, em seu livro “Quando o Futebol Andava de Trem”, “um dos maiores desmatamentos já ocorridos na história da humanidade”.
“Fanáticos e vagabundos”
Pano de fundo do Contestado, na visão de Milton Ivan:
– Um capitalismo anárquico, com uma política preconceituosa, taxando os sertanejos de fanáticos religiosos e vagabundos. Na verdade, eles foram esquecidos pelos governos do Paraná e de Santa Catarina, pois eram índios, negros, escravos foragidos, imigrantes etc. Essas pessoas chegaram a um ponto sem saída: era lutar ou morrer passivamente. Mas, mesmo pessoas simples, não tendo consciência do que faziam, praticavam táticas de guerrilha.
Cenário do conflito
A Guerra do Contestado durou de outubro de 1912 a agosto de 1916. Região rica em madeira e erva-mate, uma espécie de enclave na divisa do Paraná com Santa Catarina, era alvo, é claro, de destemperada disputa territorial. Daí gerar o nome Contestado.
O conflito envolveu cerca de 20 mil camponeses, que enfrentaram forças militares dos poderes federal e estadual. Aproximadamente 10 mil morreram, entre soldados e camponeses. O clima de revolta, por parte de quem foi espoliado e perdeu as terras, agravou-se com a conclusão da ferrovia. Trabalhadores que tinham sido trazidos de várias regiões do Brasil ficaram desempregados. Continuaram no Contestado, sem nenhum apoio por parte da empresa norte-americana Brazil Raiway ou do governo.
Monge Zé Maria
Quanto à figura do monge José Maria, um desertor do 14° Regimento de Cavalaria, em Curitiba, e que foi considerado santo:
– Ele dava conselhos aos sertanejos, benzia, ensinava o manuseio de armas, fazia partos e batizados. Maria Rosa, também vidente, transmitia as ordens de José Maria. Ele e Antonio Conselheiro (este em Canudos) faziam coisas parecidas e nem se conheciam.
Ainda sobre o tremendo desmatamento, Milton Ivan cita o professor Nilson César Fraga, autor de “Contestado – O Território Silenciado”:
– A madeira mais nobre extraída do Contestado pela Lumber tornou-se decoração do Empire State Building, em Nova Iorque.
Finalizando, o professor Afronsius e Natureza Morta mandaram um abraço ao jornalista.
E saíram atrás do livro. Beronha fez questão de ir junto.
ENQUANTO ISSO…
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