Conforme o prometido – ou combinado -, Natureza Morta voltou a comentar o humor à moda indígena, com base, é claro, na Revista de História da Biblioteca Nacional, outubro 2007, número 25. Como ressaltou Luciano Figueiredo na carta do editor, os índios “perdiam o amigo, mas não a piada, segundo contam os cronistas coloniais”. Já o texto de Eliane Cristina Deckmann Fleck, professora de História da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), de São Leopoldo (RS), amplia a aula.
Um traço de união
A professora cita, por exemplo, o escritor Márcio Souza, em “Teatro sem palavras – Pindorama no primeiro século”, inserido no segundo volume de “A outra margem do Ocidente”, organizado por Adauto Novaes (1999): tantos os portugueses como os indígenas, “traziam um traço de união surpreendente, que era o senso de humor”. Afinal, eram duas culturas consideradas tristes. O antropólogo francês Pierre Clastres (1934-1977) contatou que, “apesar da vida cotidiana cheia de dureza”, nos momentos de distensão, os indígenas usam seu “senso agudo do ridículo” para “caçoar de seus próprios temores”. O que lhes permitia rir de atitudes como a estupidez e a vaidade.
Zombando dos franceses
A professora Eliane Cristina Deckmann Fleck cita também o calvinista francês Jean de Léry (1534-1611), em “Viagem à Terra do Brasil”: entre os tupinambás “constitui ocupação ordinária” “dançar, beber e cauinar (beber cauim, uma bebida fermentada)” e “a procura por algo que os anime”. “Se os índios debocharam e zombaram dos franceses, também estes riram e zombaram dos índios, começando pelas brincadeiras com as roupas. Vestem eles às vezes calças de marujo, outros somente casacos que lhe chegam às nádegas”. Os relatos, conclui, embora “estabeleçam uma clara distinção entre o ‘rir com’ e o “rir de” – isto é, entre o riso compartilhado e a zombaria -, permitem “que reconsideremos imagens consagradas pela historiografia do século XIX: ao contrário do que ela diz, os índios eram, sim, capazes de rir e fazer rir”. Ponto final. Rir já era o melhor remédio. – E o cauim ajudava – completou Beronha.
ENQUANTO ISSO…