Já que o professor Afronsius tocou no assunto trânsito e no que tem sido feito, sem grande sucesso, para deter os motoristas que não respeitam os limites de velocidade, Natureza Morta achou interessante invocar um texto do livro “Ética e Antropologia – Estudos e Traduções”, do professor Luiz Jean Lauand, 1997, Série Acadêmica – Grupo HotTopos.
– Como as lombadas foram citadas no dedo de prosa de ontem, sobre a Semana do Trânsito, fui imediatamente fisgado pelo título. “Dialética das Lombadas”, de Sylvio R.G. Horta.
A híbrida tartaruga/lombada
Abrindo o texto, Sylvio R.G.Horta diz que “já faz algum tempo que o país está se enchendo de tartarugas e lombadas. “Tartarugas simples, em fila dupla, pequenas ou grandes; lombadas que podem ser suaves ou íngremes”. E confessa que conhece uma híbrida, espécie de tartaruga/lombada, “mas a classificação mais adequada é aquela que as divide em suportáveis e insuportáveis”.
As últimas “são encontradas principalmente entre as tartarugas”. Por mais que o motorista se esforce em andar devagar, “sentirá que está causando algum dano ao seu carro, à saúde de suas costas ou à sua saúde mental”.
Lembrando que cada um tem uma teoria econômica ou social (“talvez psicológica ou genética”) para explicar nossas mazelas, aponta que o problema é outro: “Esquecemos de ver e resolver o que está ao alcance do nosso nariz. O que é da nossa alçada”.
A têmpera do brasileiro
Na sequência, diz que, prestando atenção ao “fenômeno das tartarugas e lombadas”, poderemos, “numa verdadeira manobra dialética, contemplar um pouco da disposição de caráter – da têmpera – na qual anda instalado o brasileiro”.
Os motoristas andam “às mais altas velocidades, indiferentes se estão em pequenas ruas ou em avenidas”. Após alguma tragédia – ou para evitar que uma aconteça -, “pede-se a colocação de uma lombada ou tartaruga”. Como geralmente não basta, “pede-se a colocação de outras em novas posições estratégicas”.
Saldo final: algum ganho em segurança. “Justifica-se a medida, já que mortes não têm preço, mas fica o peso da chateação, do estrago dos carros e, principalmente, o da consciência de que bastaria ser um pouco menos animal no trânsito”.
Pela mudança de hábitos
Como acabar com essa burocracia de rua? – pergunta Sylvio Horta, para responder: “Nada vai mudar se não mudarmos nossos hábitos. Plantão já dizia isso há dois mil e tantos anos atrás: não será possível um estado justo e, poderíamos dizer, uma sociedade justa, se não estiver fundamentada nos bons hábitos de seus cidadãos”.
Talvez a mudança de hábitos seja coisa simples, mas difícil de se realizar. “A inércia dos nossos hábitos é mais vigorosa do que a dos corpos físicos. Mas não estamos atrás de soluções platônicas, totalitárias. Com que direito clamamos por políticos decentes e não nos dispomos a dirigir feito gente? Estamos esperando ordem de quem para mudar? Como canta Caetano Veloso: ‘avançam no vermelho e perdem os verdes, somos uns boçais’. Está mais do que na hora de sairmos desse círculo vicioso e entramos num círculo virtuoso para além das tartarugas e lombadas. Oxalá.”
– Oxalá – fizeram eco Natureza Morta, o professor Afronsius e Beronha, este incapaz de não deixar fugir uma de duas tartarugas de concreto plantadas no asfalto.
ENQUANTO ISSO…
Governistas querem agora regular as bets após ignorar riscos na ânsia de arrecadar
Como surgiram as “novas” preocupações com as bets no Brasil; ouça o podcast
X bloqueado deixa cristãos sem alternativa contra viés woke nas redes
Cobrança de multa por uso do X pode incluir bloqueio de conta bancária e penhora de bens