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Na cabotagem com Jorge Amado

Muito mais do que um mimo, um presentão para sempre. E ele chegou pelas mãos e amizade do médico Paulo Mercer: uma edição (raríssima) de Navegação de Cabotagem, de Jorge Amado.

Uma alentada, em todos os sentidos, edição de 645 páginas, incluindo um índice que vai de Aloysio Azevedo a Zola e Zuzu Angel, passando por Trosky, Nabokov, Carybé, Charles de Gaulle, Dickens, Dalton Trumbo e outras figuras incríveis, não apenas na literatura. No subtítulo, Jorge Amado explica: Apontamentos para um livro de memórias que jamais escreverei .

Como se sabe, cabotagem vem a ser a navegação entre portos marítimos de um mesmo país, sem perder a costa de vista. A cabotagem contrapõe-se à navegação de longo curso, ou seja, aquela realizada entre portos de diferentes nações.

Daí a tremenda viagem (pelo mundo) em companhia do autor, o aí debaixo, na foto.

Porto de partida

Nova Iorque, janeiro de 1986: Amado começa a escrever suas memórias. Ao lado da mulher, Zélia Gattai (a quem descreve como “namorada e cúmplice”), estava em Nova Iorque para participar do Congresso Internacional do Pen Club. Acometido de pneumonia, não compareceu às conferências e se pôs a redigir algumas notas à medida que elas lhe acorriam à lembrança.

O livro foi publicado em 1992. Sobre a obra, o escritor Lêdo Ivo, em posfácio, escreveria:

– O escritor que testemunhou grandes acontecimentos do século XX e que, em sua trajetória pessoal, desempenhou papel decisivo na cultura brasileira, além de conviver com algumas das personalidades mais importantes do Brasil e do mundo, narra num estilo despretensioso e comovente fatos de seu passado.

– O arco de tempo vai de meados da década de 20, período do qual Jorge Amado recorda o ciclo do cacau e o movimento da Academia dos Rebeldes (grupo literário do qual fez parte na juventude), até o começo dos anos 90, quando o experiente autor, morando entre Paris e Salvador, deixa as flutuações da memória conduzirem suas reminiscências literárias, políticas e pessoais.

– Nestes apontamentos, há espaço para comentários sobre a própria obra e as adaptações televisivas e cinematográficas que ela inspirou, além de recordações de acontecimentos da vida familiar. Não faltam menções calorosas aos amigos pessoais, como Carybé, Glauber Rocha, Mirabeau Sampaio, João Ubaldo Ribeiro, Carlos Scliar, Dorival Caymmi e Stela Maris, Calasans Neto e Auta Rosa.

– O autor relembra escritores e artistas com quem conviveu, como Graciliano Ramos, Raul Bopp, Erico Verissimo, Osman Lins, Aldemir Martins, Flávio de Carvalho, Pierre Verger, Pablo Neruda, Pablo Picasso, Nicolás Guillén, Mario Vargas Llosa, Gabriel García Márquez, Giuseppe Ungaretti, Jean-Paul Sartre. Os portos dessa navegação são numerosos: Paris, Roma, Nova Iorque, Lisboa, Moscou, Praga, Pequim, Havana, Casablanca, Dakar, Rio de Janeiro, São Paulo e, claro, Salvador.

– Apesar de sua amizade com personalidades de destaque e do amplo reconhecimento de sua obra, Jorge Amado recusa pompa ou grandeza à sua trajetória de vida: “Não quero erguer um monumento nem posar para a História cavalgando a glória”. Em vez disso, o autor chama a atenção para a dimensão modesta de sua existência: menino grapiúna, cidadão da pobre Bahia, trovador popular, diz ter registrado neste livro apenas certas lembranças divertidas, outras melancólicas, numa “liquidação a preço reduzido do saldo de miudezas de uma vida bem vivida”.

Simplesmente genial, não?

ENQUANTO ISSO…

 

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