Com uma fala de Winston Churchill na ponta da língua, o professor Afronsius abriu o dedo de prosa com Natureza Morta, vizinho de cerca (viva).
– Ninguém pretende que a democracia seja perfeita ou sem defeito. Tem-se dito que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos.
Rumo ao voto
O solitário da Vila Piroquinha concordou e se declarou já preparado para a temporada de disparates e baboseiras que vem por aí, a caminho das eleições.
– Apesar da miopia política e da malandragem de muitos candidatos, não abro mão do meu voto.
E contou ter lido um livro que faz questão de recomendar: “Políticas Educacionais – conceitos e debates”, Editora Appris, 2011. Nele, Marcos Alexandre Ferraz assina o interessantíssimo capítulo “Estado, política e sociabilidade”.
– Quem? Quis saber Beronha.
Do alto do Himalaia de sua paciência, revelou para o nosso anti-herói de plantão que se trata de um professor adjunto da Universidade Federal da Grande Dourados. Doutor em sociologia pela Universidade de São Paulo, também é pesquisador nas áreas de sociologia do trabalho e sindicalismo. E autor do livro “Disritmia: sindicalismo e economia solidária no interior da CUT” e organizador dos livros “Trabalho e Sindicalismo: tempos de incerteza” e “Sindicalismo Equilibrista: entre o continuísmo e as novas práticas”.
– Só os títulos já dizem muita coisa – arrematou.
Lições de quem sabe
Diante do interesse do professor Afronsius, que pretende adquirir um exemplar, Natureza apontou algumas lições do livro de Ferraz, devidamente sublinhadas a lápis: “Ao Parlamento cabe o papel de constituir maiorias, consensos, opiniões. Ainda que se votem os projetos que o Executivo deseja, somente se vota após a construção de uma maioria política parlamentar em relação à proposta do Executivo”.
O Parlamento “não transmite simplesmente impulsos políticos originados alhures; produz impulsos políticos na medida em que processa as orientações do eleitorado que representa”.
– Ou seja, é uma espécie de espelho. O eleitor está nele – aproveitou o professor Afronsius.
Sobre a brava e indormida
Natureza leu outro trecho sobre o Parlamento, em que é citada, de passagem, a briosa, brava e indormida imprensa: “Os resultados desta ação não são simples negociatas ou conchavos, como adora (sic) salientar o jornalismo político brasileiro. Ao contrário, esta ação projeta consensos que transbordam do Parlamento para bases sociais organizadas ao redor dos parlamentares, diminuindo a violência dos conflitos sociais e dando estabilidade para uma sociabilidade ampla, assim como para as atividades propriamente de governo, alojadas no Executivo”.
Compadrio e corrupção
Diante do apelo do professor Afronsius, Natureza continuou lendo e aprendendo com Marcos Alexandre Ferraz: “Não se trata de separar o Estado, como polo de todos os nossos vícios (o patrimonialismo, o compadrio e a corrupção) e o mercado como o centro das virtudes (a modernidade, a meritocracia, a concorrência)”.
E ensina o professor, ao citar Rancière: “Os direitos sociais são a linguagem para a produção do dissenso, instaurando a política. (…) É por isso que Lefort diferencia uma sociedade democrática e o totalitarismo, justamente pela presença do espaço público atravessado pela consciência do direito a ter direitos. Não é por estar inscrito na Lei que um direito se efetiva. Mas por estar na Lei, um direito abre o universo da reivindicação política”.
“É sob este prisma, de uma cultura do direito a ter direitos, que se faz necessário inquirir a realidade brasileira. Sociedade complexa e polissêmica, em que a negação do dissenso parece ser a regra, em planos tão diferentes”.
Para o autor do livro, os anos 1970 e 1980 “deixaram, ao menos, duas contribuições como seu legado para a democracia do Brasil do século XXI: a independência de atores sociais novos (…) e um quadro institucional mais permeável ao reconhecimento e tratamento destas demandas, conferindo estabilidade ao conflito democrático de representação de interesses”.
Ponto final
Encerrando, o professor Afronsius recorreu ao dito popular: “Para quem não sabe para onde vai, qualquer caminho serve”.
– E só peixe morto segue a correnteza – emendou Natureza, lançando o olhar número 13 para Beronha.
ENQUANTO ISSO…
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