Com as exceções de praxe, o underdog Flávio Stege Júnior entre elas, quem acompanha (de longe) o beisebol americano estranhou os jogos da quarta-feira: todos os times usavam camisa com o mesmo número, 42. Todos, sem distinção.
É que, “aposentado” em 1997, o número só passou a ser utilizado no Dia Jackie Robinson, que foi mais do que um jogador, como se verá.
Na Revista de História da Biblioteca Nacional, edição de janeiro 2014, sob o título História de uma lenda, texto assinado por Bruno Garcia conta que foi no dia 15 de abril de 1997, numa partida entre Dodgers e Mets, que o então presidente Bill Clinton e Bud Selig (comissário, ou chefão da Liga) “declararam que o número 42 seria aposentado de toda a Liga”. A partir de então, “o dia 15 de abril era declarado feriado nacional, e o 42 significaria mais que um simples número na cultura estadunidense”.
Muito antes da luta pelos direitos civis
Ainda da RHBN:
– Em 1947, quase vinte anos antes do grande movimento pelos direitos civis, Robinson foi contratado pelo Brooklyn Dodgers, provocando um imenso alvoroço nos Estados Unidos. Conhecido pelo temperamento difícil, ele precisou de muito sangue frio no seu primeiro ano na Liga. Onde quer que fosse, uma multidão o seguia. Além dos negros, que o julgavam um herói, também apareciam os inconformados racistas. Torcedores que xingavam, cuspiam e gritavam, rivais que se recusavam a jogar com um negro e mesmo companheiros de time que se diziam ofendidos pela presença de Robinson.
– Tudo isso é narrado, inclusive, no filme 42 – A história de uma lenda, de Brian Helgeland, de forma simples e direta. Destaque para o confronto com o Philadelphia Phillies e seu treinador, Ben Chapman que insultava Robinson todas as vezes que entrava em campo. Mais tarde, a agressividade do treinador rival seria vista como momento chave para união dos Dodgers, já que mesmo aqueles que ainda tinham alguma resistência a Robinson passaram a partilhar um pouco do preconceito que ele sofria.
A outra guerra, dentro de casa
– Sua entrada em cena teve o apoio de Branch Rickey, gerente do clube. Como o filme esclarece aos poucos, Rickey tinha suas razões para quebrar o resistente tabu de negros no esporte. Os Estados Unidos do pós-guerra não escondiam o conservadorismo de um patriotismo triunfante, preparando-se para enfrentar o que ficaria conhecido como Guerra Fria. Soldados negros que lutaram contra o racismo nazista voltavam para seu país e eram intimados a assumir seu lugar dentro de uma sociedade extremamente hierarquizada.
De medalhista de prata a faxineiro
– Robinson testemunhara na própria família a dificuldade de ser um atleta negro. Seu irmão, Mack Robinson não conseguiu nada além de um emprego como faxineiro depois de conquistar uma medalha de prata nas Olimpíadas de 1936 (em Berlim).
– Depois de uma bem sucedida carreira como atleta universitário, Robinson foi convidado a participar dos treinos do Montreal Royals na Flórida. Como não podia ficar no mesmo hotel dos seus companheiros, foi hospedado na casa de um político negro. O ótimo desempenho no treino valeu um contrato com o Dodgers, de Rickey. A partir daí, o que se vê é o desafio de um atleta fenomenal e um homem de raro caráter contra um país que naturalizava o racismo.
Ao longo de toda temporada, Robinson conquista o apoio do time, dos seus torcedores, confronta e convence jornalistas e se destaca de tal forma que ganha o prêmio de Novato do Ano. Ao longo de sua vitoriosa carreira, foi eleito o melhor jogador da temporada de 1949 e campeão da Liga em 1955.
– Em reconhecimento a sua carreira e contribuição não apenas ao esporte, em 1997, mais de vinte anos depois da sua morte (1972), seu número 42 foi aposentado de todos os times da Liga.
Em 200 foi criado o Dia Jackie Robinson, no qual todos os jogadores de todos os times vestem o número 42. Nada mais justo.
Afinal, todos nós, de uma forma ou de outra, nascemos ou somos 42. Ou qualquer número que seja.
ENQUANTO ISSO…