Como já deu para notar, Beronha é um reclamista militante. Daqueles que, se faz muito calor no verão, torce pela chegada do frio. No inverno, principalmente quando chove (coisa nunca rara em Curitiba), pede a rápida chegada do inverno.
A propósito da inconstância do clima na capital, Natureza Morta também reclama, mas com certa parcimônia nas críticas. Prefere a recorrer à blague. Tanto que, recentemente, quando a cidade enfrentou as quatro estações do ano num mesmo dia, comentou, sob o guarda-chuva:
– Só falta agora uma aurora boreal…
Na boca do micro-ondas
Voltando às reclamações do nosso anti-herói de plantão. Às vezes ele tem razão. Caso do fim de semana, quando resolveu ir ao mercadinho da Vila Piroquinha comprar um escondidinho de frango com purê de batata, aquele de caixinha de papelão que é só colocar no micro-ondas e aguardar 15 minutos.
Comeu tudo. E reclamou:
– Cadê o frango? Foi escondidinho tão bem que não encontrei o dito cujo…
Também às vezes, o solitário da Vila Piroquinha, do alto do Himalaia de sua paciência, trata de ajudar o amigo, com longas conversas. Nem sempre com o retorno esperado.
Da última vez, recorreu a Luís de Camões, contando os dramas e infortúnios do também já chamado Virgílio português, que, no entanto, não impediram que se tornasse o gênio que foi. Em determinado ponto contou que, em 1570, após 17 anos longe de Portugal, Camões, com 46 anos, retorna ao país. Pobre, combalido. Ocorre a derrota de D. Sebastião na África, vem a peste, a fome se alastra, e a pátria é “absorvida pela Espanha”.
Na pátria e com a pátria
Hospitalizado, Camões escreve a D. Francisco de Almeida, pouco antes de morrer:
– E assim acabarei a vida, e verão todos que fui tão affeiçoado à minha pátria, que não sómente me contentei de morrer nella, mas de morrer com ella.
Aí Natureza fechou “Os Lusíadas”, Editora Melhoramentos, 1956, e, segundo nosso anti-herói de plantão, pegou seu astrolábio e tomou o rumo dos aposentos.
Ao deixar a mansão da Vila Piroquinha, Beronha, retemperado para as agruras do dia, recordou a cena e ficou espantado consigo mesmo:
– Astrolábio? De onde foi que eu tirei tal palavra? Deve ser coisa do Camões…
ENQUANTO ISSO…