– Eu morro e não vejo – ou ouço – tudo.
Motivo do desabafo do professor Afronsius. É que, num pequeno (mas honesto) restaurante, centro de Curitiba, depois de almoçar, ele se dirigiu ao caixa. Antes dele, um cidadão todo invocado. É que o estabelecimento anunciava uma promoção: sorvetes Melona.
– Melona? Alguma mistura de melancia com mamona?
Pacientemente (afinal, o freguês, por mais mala que seja, sempre tem razão), o proprietário explicou que se tratava de um produto coreano.
– Coreano? Da Coreia boa ou da outra?
– Coreia boa?
– É, a americana, a outra é do mal…
Mais pacientemente ainda, o comerciante tratou de explicar: importados desde 1996, os sorvetes chegaram agora a seis estados. Por conta da M-Cross, importadora e distribuidora de alimentos. Dos sorvetes coreanos, o que vem fazendo maior sucesso é o Melona. De sabores suaves e marcantes. Ah, sim, é da Coreia do Sul.
– Ainda bem. Da Coreia do Norte poderia vir sorvete contaminado por radiação nuclear. Você sabe como são os comunistas… Eu me lembro de um filme…
A “herança” do cinema
Xenofobia à parte, sobre a desconfiança do cidadão quanto aos coreanos do Norte, por conta de muitos e muitos filmes, Natureza Morta recorreu à Seção Achados&Perdidos, exclusiva do blog. Um texto do crítico José Geraldo Couto, Carta Capital de janeiro do ano passado, temos o outro lado da medalha da indústria cinematográfica e seus múltiplos interesses. Ao se referir a Henry Fonda (1905-1982), apontado como “Herói com caráter”, Geraldo Couto nos conta que, “ao longo de meio século e mais de cem filmes, o ator personificou nas telas os melhores valores da América: coragem, independência, apreço pela justiça”.
“Liberal-democrata, afastou-se de Hollywood no período da caça às bruxas, dedicando-se ao teatro em Nova Iorque. Seus dois filhos atores – Jane e Peter Fonda – herdaram sua postura crítica diante do sistema”.
De John Ford a Sergio Leone
Henry Fonda “protagonizou faroestes memoráveis de John Ford, Fritz Lang e Sergio Leone e viveu três vezes o papel de homem acusado falsamente de um crime: Vive-se Uma Só Vez (Fritz Lang), Deixai-nos Viver (John Brahm) e O Homem Errado (Alfred Hitchcock). Seu rosto sólido e decente é o retrato de uma América democrática que talvez só exista nas telas de cinema”.
– Mas tem gente que (ainda) teme e treme ao ouvir sobre o perigo vermelho e o perigo amarelo… – encerrou Natureza.
– E tem medo até de sorvete – arriscou Beronha, nosso anti-herói de plantão, querendo saber se existe o de sabor cerveja.
– Cereja?
– Não, em absoluto. Cerveja mesmo.
ENQUANTO ISSO…