Lá no começo da minha adolescência, quando ficava trancado 20 horas por dia num quarto frio e de paredes boloradas, desenhando o mesmo personagem e sonhando em me tornar cartunista, eu pensava em criar um estilo de quadrinhos de humor que falasse sobre dramas existenciais, afetivos, inseguranças, fobias, neuroses, paranóias, medos, infelicidade, vazio, solidão, depressão e todas essas coisas que nos tornam pessoas interessantes. Não sabia, mas já existia algo assim: Life in Hell.
O autor? Matt Groening, o mesmo cara da genial série Os Simpsons, que passava aos domingos antes do almoço, lá no começo da minha adolescência. Era o tempo dos videocassetes e eu gravei uma porção de episódios daquela que era a terceira temporada. Os VHS existem até hoje e estão guardados a sete chaves com meu irmão mais novo, o Hugo. Relíquias sentimentais. Ainda quando assistimos juntos esses episódios, damos gargalhadas, impressionante.
A última tira de Life in Hell
Mas eu estava falando de Life in Hell e não Simpsons. Life in Hell passou a ser publicada na Folha de S. Paulo e eu lia e recortava todas as tiras obsessivamente. Mas não durou muito e o jornal cancelou a série. Naqueles tempos pré-internet, não havia meios de um garoto pé-rapado do interior ter acesso aos fabulosos livros lançados nos EUA: The Huge Book of Hell, Binky’s Guide to Love, etc. De qualquer modo, já era tarde demais: eu estava fissurado na tira.
Ainda hoje considero Life in Hell uma das minhas principais – ou talvez a principal- influencia. Gosto do desenho tosco do Matt Groening, dos personagens emocionalmente instáveis e, principalmente, da ironia certeira de suas observações.
Pois bem. No dia 15 de junho Matt Groening anunciou que deixaria de desenhar a série criada há 32 anos. Segundo o texto de Marcio Aquiles, na Folha de S. Paulo deste domingo (01/07/2012) o motivo era porque Groening “estava perdendo dinheiro”. Como se ele precisasse… Enfim, que ano ruim para o humor esse 2012.
Life in Hell é um tipo de humor que não tenho mais visto muito por aí. É um tipo de humor que certamente moldou as minhas tiras e ajudou a formar meu modo de ver o mundo. E penso que o fim de Life in Hell não significa que a vida deixou de ser um inferno, muito pelo contrário. Life in Hell ajudava a deixar meu inferno pessoal um pouco menos quente. Era meu refresco predileto para encarar as agruras da vida adolescente.
Algumas tiras que tenho em meus arquivos no computador
01
02
03
04
05
Para mim o fim de Life in Hell tem o mesmo impacto do fim de Peanuts, Mafalda e Calvin e Haroldo…