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Sergio Moro

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Censura

O Brasil na companhia de regimes “desagradáveis”

Usuário do X nos Estados Unidos, onde a rede não está censurada. (Foto: EFE/Cristobal Herrera-Ulashkevich)

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Na última semana, recebi uma mensagem por WhatsApp de um amigo latino-americano que estava em viagem à China. Disse-me ele que estava em Pequim e que estava utilizando VPN para acessar o Gmail, o WhatsApp e a rede social X. Agregou que, apesar disso, ninguém o estava fiscalizando ou multando por isso.

O contraste com o Brasil é surpreendente. Estamos piores que a China. Não só o X foi banido por decisão judicial, mas também foi imposta uma multa de R$ 50 mil a aqueles que a acessarem utilizando “subterfúgios tecnológicos”. Sem ser partes no processo, 215 milhões de brasileiros foram submetidos a uma multa judicial destituída de qualquer previsão legal ou proporcionalidade.

Quando o X foi ameaçado de suspensão, fiz uma postagem na rede afirmando que se estava indo longe demais, mas que esperava que o bom senso prevalecesse. Não prevaleceu, infelizmente.

A reputação internacional do Brasil como democracia liberal foi prejudicada pela censura imposta ao X pelo STF

Os defensores da suspensão do X comemoram, com ufanismo, que a soberania brasileira deve prevalecer frente ao bilionário Elon Musk. Talvez tivessem razão se o único prejudicado fosse o dono da rede e não os mais de 22 milhões de usuários brasileiros que a utilizam como meio de comunicação de massa, envolvendo publicidade, mensagens políticas, científicas, sociais e a produção de conteúdo audiovisual e de informações. São eles os principais atingidos pelo banimento do X e pela imposição da multa ilegal.

Além disso, o X é a rede social com melhor inserção internacional. Os líderes dos países democráticos o utilizam como forma preferencial de comunicação imediata. Até o papa Francisco utiliza-o para fazer postagens à comunidade de fiéis católicos. Notícias do mundo inteiro são postadas no X de uma maneira rápida, sendo a rede utilizada também pela imprensa brasileira. Ainda que todos os brasileiros migrem para outras redes sociais, a comunidade internacional continuará no X. A suspensão da rede social significa um isolamento do Brasil na comunidade internacional de informação.

A reputação internacional do Brasil como democracia liberal foi prejudicada pelo episódio. Jornais e revistas como o Washington Post e a Economist publicaram editoriais severos contra a suspensão do X no Brasil. O fato de estarmos agora em companhia de China, Coreia do Norte, Irã, Turcomenistão, Paquistão, Venezuela, Mianmar e Rússia, países que também baniram o X, também não faz bem para a imagem internacional do Brasil. Parafraseando os eufemismos de Lula com a Venezuela, todos eles são regimes “desagradáveis” no que se refere às liberdades fundamentais, embora nem todos no mesmo nível de degradação de nosso vizinho ao norte.

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Ao lado disso, as contas bancárias da Starlink foram bloqueadas no Brasil para pressionar o X e garantir o pagamento de multas. As duas empresas têm personalidades jurídicas distintas, com acionistas diversos. O fato de o poder de controle pertencer a Musk não autoriza confundir as duas empresas. A ilegalidade da decisão jurídica é mais um fator a corroer a segurança jurídica do país.

Em decorrência dos impactos econômicos da decisão, faremos, no próximo dia 10 de setembro, audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal, a partir de requerimento que apresentei, também subscrito pelas senadoras Tereza Cristina e Damares Alves. A audiência é uma forma de iluminar os danos causados a todos os brasileiros, já que há aqueles que focam, como cortina de fumaça, apenas nas consequências para Musk.

Sou a favor do império da lei e do respeito às decisões judiciais, mas medidas radicais não se tornam jurídicas ainda que provenientes do tribunal supremo. O direito não está à disposição do STF. O descumprimento pelo X das ordens judiciais deveria ter dado causa a outras medidas que não a punição desproporcional dos mais de 22 milhões de usuários brasileiros do X, com danos à imagem internacional do Brasil. O STF, que se posicionava anteriormente contra a censura, parece abandonar, em uma conflagração com conotação política, a prudência, a legalidade e a sua responsabilidade como garantidor da liberdade de expressão. Triste e censurado país.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

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