Milhões de imigrantes vieram à América com uma esperança de liberdade e prosperidade. Muitos fugiram de perseguições religiosas ou políticas, e de guerras no Velho Mundo.
Atualmente, uma sombra paira sobre a América Latina. Há três ditaduras no continente. Cuba é uma ditadura desde 1959, com censura, partido único e sem eleições livres. O país foi governado por décadas pelos irmãos Castro e prossegue sob o jugo do Partido Comunista, com Miguel Díaz-Canel como presidente. A Venezuela, desde a eleição de Hugo Chávez em 1999 e atualmente com Nicolás Maduro, assistiu à progressiva deterioração das instituições, com supressão das liberdades e destruição da economia. Na Nicarágua sandinista de Daniel Ortega, dissidentes políticos são perseguidos e até mesmo a liberdade religiosa foi suprimida. As três ditaduras mantêm conexões e relações próximas com a Rússia, governada pelo autocrata Vladimir Putin, responsável pela invasão e guerra na Ucrânia.
Infelizmente, vários países da América têm sido coniventes com tais regimes fechados. Bolívia, Argentina e Colômbia, por exemplo, com dirigentes atuais de esquerda, têm fechado os olhos para as violações às liberdades e direitos naqueles países. O Chile, apesar de dirigido por um presidente de esquerda, tem sido a elogiável exceção. Já países com dirigentes com perfil ideológico de direita, como Uruguai e Paraguai, têm mantido as críticas às violações de direitos nos referidos países.
E o Brasil? Bem, o Brasil, desde o retorno do governo do PT, retomou a política externa marcada pelo infantil antiamericanismo. Apesar da viagem de Lula aos Estados Unidos, as declarações e as posições que o governo federal tem adotado sinalizam perigoso afastamento do bloco das democracias ocidentais.
Lula, na viagem à China, fez declarações graves sobre uma falsa equivalência entre a Rússia e a Ucrânia, sem fazer a distinção de que esta última é alvo de uma invasão e que a sua população tem sido vítima de uma guerra movida por Vladimir Putin
É importante deixar claro: o Brasil não deve ser subserviente a nenhum outro país e precisa manter boas relações comerciais com todos os países, especialmente com os nossos grandes parceiros comerciais, China, Estados Unidos e União Europeia.
Entretanto, o que se tem visto, por motivos ideológicos e megalomania presidencial, é uma aproximação geopolítica do governo de Lula com a China e a Rússia, ilustrado pelo apoio à posição da Rússia na guerra com a Ucrânia. Lula, na viagem à China, fez declarações graves sobre uma falsa equivalência entre a Rússia e a Ucrânia, sem fazer a distinção de que esta última é alvo de uma invasão e que a sua população tem sido vítima de uma guerra movida por Vladimir Putin. Pior: chegou a responsabilizar os Estados Unidos pelo conflito e condenar o fornecimento de armas para a Ucrânia, o que comprometeria a defesa deste país contra o agressor. Destaco alguns trechos: “É preciso que os Estados Unidos parem de incentivar a guerra e comecem a falar em paz”; “É preciso que a União Europeia comece a falar em paz para a gente convencer o Putin e o Zelensky de que a paz interessa a todo mundo e a guerra só está interessando por enquanto os dois”; “é preciso convencer os países que estão fornecendo armas e incentivando a guerra a pararem”.
Ainda antes, Lula já havia feito uma declaração desastrosa, sugerindo que a Ucrânia deveria abdicar da Crimeia na negociação da paz com a Rússia (“Zelensky não pode ter tudo o que ele pensa que vai querer”, “talvez nem se discuta a Crimeia”). Essas declarações foram vergonhosas e não refletem a tradição brasileira de respeito à soberania de cada país e de repúdio a guerra.
Na América Latina, o governo de Lula reaproximou-se da Venezuela, de Cuba e de Ortega, todos sob a zona de influência política da Rússia e contrários aos Estados Unidos. O PT sempre apoiou essas ditaduras e tampouco Lula esconde a sua posição. Ficou famosa, aliás, entrevista por ele concedida à TV alemã, quando equiparou grosseiramente a longevidade da tirania de Ortega à longa duração do governo da primeira-ministra Angela Merkel, esquecendo-se de que o primeiro se mantém no poder pela força, enquanto a segunda se manteve em um ambiente de eleições livres e democráticas.
Na esteira da viagem desastrosa à China, o governo Lula receberá nesta semana o chanceler russo Sergei Lavrov, o que sinaliza novamente simpatia à posição da Rússia na invasão da Ucrânia. Significativamente, diz a imprensa que o chanceler, após deixar o Brasil, visitará Venezuela, Nicarágua e Cuba. Estaria o governo Lula a caminho da construção de uma relação especial com o governo Putin?
É preciso que o Brasil se posicione de forma clara no mundo e, em especial, que defenda a democracia na América. Não precisa, evidentemente, entrar em conflito com nenhum país, mas não pode adotar uma postura irresponsável e subserviente ao arbítrio, como faz em relação à invasão da Ucrânia e ao reaproximar-se de ditadores como Ortega, Maduro e Díaz-Canel.
Precisamos de lideranças comprometidas com os valores da liberdade, da democracia e do Estado de Direito. Chega de filhos de Putin no continente americano
É necessário dar início a um movimento em defesa da democracia na América Latina e contrário às ditaturas e ao populismo que contaminaram o continente. Um contraponto ao chamado Foro de São Paulo e ao Grupo de Puebla, berços ideológicos do populismo e autoritarismo de esquerda no continente.
Com esse objetivo, lideranças ibero-americanas reuniram-se, recentemente, em Buenos Aires, na ocasião do aniversário de 35 anos da Fundación Libertad. Estive presente no evento, com Maurício Macri, Sebastián Piñera, Felipe Calderón e Jorge Quiroga, ex-presidentes de Argentina, Chile, México e Bolívia respectivamente, além de Gerardo Bongiovanni, presidente da Fundación Libertad, e de outras autoridades, como a deputada espanhola Cayetana Álvarez de Toledo. A parlamentar ibérica fez, aliás, um belíssimo discurso na ocasião, com uma verdadeira mensagem de esperança contra o populismo autoritário, mas com a advertência de que a luta pela liberdade não se faz sem resistência. A Fundación Libertad está vinculada à Fundación Internacional para la Libertad (FIL) presidida por Mário Vargas Llosa, um ícone para a literatura e para a direita democrática no continente latino-americano.
A luta pela liberdade e democracia na América Latina deve ser feita dentro de cada um dos países da região e as lideranças precisam se apoiar mutuamente. A luta pela liberdade e democracia na Venezuela, Cuba e Nicarágua representa, de certa forma, a luta por esses mesmos objetivos no Brasil, para que possamos evitar o mesmo caminho do populismo autoritário. No presente ano, as eleições na Argentina e na própria Venezuela são fundamentais. Com o respeito à soberania e autonomia de cada país, é relevante pôr um freio no avanço do populismo autoritário em toda a região. Precisamos de lideranças comprometidas com os valores da liberdade, da democracia e do Estado de Direito. Chega de filhos de Putin no continente americano.
Inteligência americana pode ter colaborado com governo brasileiro em casos de censura no Brasil
Lula encontra brecha na catástrofe gaúcha e mira nas eleições de 2026
Barroso adota “política do pensamento” e reclama de liberdade de expressão na internet
Paulo Pimenta: O Salvador Apolítico das Enchentes no RS