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Sergio Moro

Sergio Moro

Reforma tributária

Mais impostos para o governo Lula?

O Senado aprovou no dia 8, em dois turnos, a PEC da reforma tributária. O projeto de lei agora volta à Câmara para a análise final. (Foto: Roque de Sá/Agência Senado)

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Votei com dor no coração contra a reforma tributária aprovada dias atrás no Congresso. É inquestionável a necessidade de reforma do sistema tributário brasileiro. O atual modelo é confuso, com uma multiplicidade de leis federais, estaduais e municipais que favorece privilégios especiais a certos contribuintes em detrimento de outros, gera sonegação fiscal e exige enormes custos operacionais para as empresas calcularem os impostos. Mas não é porque o atual modelo é ruim que qualquer reforma serve.

Desde que a PEC 45 chegou da Câmara, busquei aprimorar o texto com emendas e debates. Para mim e outros senadores, era essencial que o texto fixasse desde logo uma alíquota máxima para o IBS e o CBS, os tributos sobre consumo criados em substituição aos atuais, a fim de assegurar a promessa de que a reforma tributária não seria utilizada como forma de aumentar a carga tributária. Sugerimos que fosse fixada em 25%; assim, não oneraria em demasia a produção e comércio de bens e serviços no Brasil. Não fomos bem-sucedidos. A base do governo Lula rejeitou de modo intransigente a proposta. Assim, apesar de aprovada a reforma, não sabemos qual será a carga tributária que será imposta aos brasileiros; isso ficará para um momento no futuro, gerando insegurança e imprevisibilidade. Diante da recusa em aceitar o máximo de 25%, a suspeita é que, no mínimo, será superior, podendo chegar e ultrapassar 30%.

Não pude votar a favor de um texto que permite, apesar das negativas do governo, o aumento da carga tributária e que gera imprevisibilidade. Também não posso votar a favor de um texto que discrimina negativamente o Paraná

Na tramitação da reforma, também propus que as normas que possibilitarão aumento de IPTU, IPVA, imposto sobre heranças e contribuição para iluminação pública ficassem de fora do texto e fossem discutidas em outro momento. Se o propósito da reforma era discutir tributos sobre o consumo, por que aprovar medidas de incremento a tributos de outra natureza? Da mesma forma, a base do governo Lula rejeitou minha proposta e aprovou as medidas que favorecem o aumento desses outros tributos.

Como se tudo isso não bastasse, constatamos que a reforma consolidava o desequilíbrio federativo do atual sistema e ainda tratava de maneira injusta e desigual os estados segundo a sua região. A reforma aprovada levará a uma concentração de poder em Brasília em detrimento das autonomias dos estados e dos municípios. Ela ainda criou um fundo de desenvolvimento regional que poderá chegar ao valor anual de R$ 60 bilhões, custeado pela União e distribuído aos estados. A reforma não diz qual será a fonte dos recursos, gerando incertezas quanto a sua viabilidade. Pior: na distribuição dos recursos, o Paraná é tratado como um sub-estado, sendo um dos que menos receberão recursos. Alguma diferença é até compreensível dadas as desigualdades regionais, mas, pelos cálculos que fizemos, o Paraná receberá cerca de R$ 177 por habitante, enquanto há estados que receberão 10 ou 13 vezes mais que isso por habitante. A diferença não podia ser tão grande pois representa, na prática, a transferência de renda do contribuinte dos estados menos favorecidos para investimentos nos estados mais beneficiados.

O texto da reforma no Senado ainda inovou criando uma isenção fiscal de CBS por dez anos para empresas automotivas instaladas ou a serem instaladas no Nordeste. Nada contra o Nordeste, mas o benefício gera competição desleal com as indústrias de outras regiões, inclusive no Paraná. Se a reforma visava acabar com a guerra fiscal, ela começou mal. Temo que seja apenas um prenúncio do que veremos, com os lobbies regionais mudando apenas de destino, dos estados para Brasília.

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Outra medida da qual discordo foi a criação de uma nova contribuição para favorecer a produção de bens na Zona Franca de Manaus. O governo federal poderá cobrar uma contribuição, com alíquota indefinida, sobre produtos industriais fabricados fora da Zona Franca de Manaus a fim de manter a competitividade da produção em Manaus. Todo o país perderá em produtividade para favorecer a Zona Franca. Entendo que a Zona Franca até deve ter incentivos, mas não com medidas que oneram todo o restante da produção do país.

Enfim, apesar do desejo de reforma, não pude votar a favor de um texto que permite, apesar das negativas do governo, o aumento da carga tributária e que gera imprevisibilidade. Também não posso votar a favor de um texto que discrimina negativamente o Paraná. Tenho ainda dúvidas se a reforma de fato gerará a desejada simplificação. Veja que os cinco tributos sobre o consumo foram substituídos por quatro (IBS, CBS, imposto seletivo e Cide) e o sonho da alíquota uniforme foi substituído por uma série de regimes especiais e tratamentos diferenciados que tornarão tudo mais complexo.

Espero que possamos corrigir algumas dessas distorções na Câmara, para onde a reforma voltará, ou pelo menos antes que ela entre em vigor, já que também é longo o período de transição. Não é essa a reforma do sonho dos brasileiros.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

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