Os arpejos produzem reminiscências. Quem é interiorano – sertanejo, caipira assumido ou sublimado pela migração – vai se encontrar aqui, ali, acolá nas 13 canções compostas e registradas em disco pelo maestro e violonista Jaime Alem.
Chama-se “Dez Cordas do Brasil” e carrega vários sotaques não só do interior paulista – o músico nasceu em Jacareí, de onde saiu aos 17 anos para se fixar no Rio de Janeiro –, mas também de outros cantos com erres acentuados ou atenuados. Um jeito todo próprio de se pronunciar Brasil.
Com exceção de “Ave Maria das Violas” (prelúdio com encaixe perfeito de “Ave Maria” cantada em latim”), as demais faixas são instrumentais curtas, entre dois e quatro minutos de duração. Os fraseados da viola caipira ganham suporte da viola de 12 cordas e violão de nylon.
O que se ouve é um show de virtuosismo em peças que vão do cateretê (na onomatopaica “Pracatugudum), samba caipira (na deliciosa “Na moda do maxixe), ciranda (“Ciranda pra ti”, na qual a manifestação de Parati, no estado do Rio de Janeiro, é referência na composição) ou mesmo cururu. Interiores, sertão, cruzamentos.
A memória afetiva de Jaime Alem prevaleceu na feitura de todas as canções, embora o seu interior paulista promova proximidades com Minas Gerais (seja em “Sonata agreste” ou mesmo em “Moenda”), nordeste (“4 Tempos”, um calango de Minas que vai se encontrar com o movimento Armorial de Pernambuco; ou “Moda de uma corda só”, captada dos violeiros nordestinos e cuja melodia é tocada apenas em uma corda). “Romance da Moura”, outro bom momento, é a fusão de pontuados brasileiros com possíveis sons orientais.
Interessante saber: as canções foram feitas no estúdio de gravação. “Fui sem nenhuma idéia na cabeça, e lá fiquei fechado por alguns dias. Gravei conforme ia compondo”, escreveu Jaime Alem no encarte do disco. Aliás, as 13 faixas contêm comentários pertinentes do maestro e violonista, que dedicou o disco a duas pessoas especiais.
Primeiramente Nair Cândia, esposa e companheira de música com a qual registrou três discos, o mais recente em 2001. Em 1997, produziu e arranjou o solo da cantora, “Canção de um outro dia”. A outra é Maria Bethânia, de quem é diretor musical há 25 anos e “promotora” de serestas ao som de sua viola no Rio e em Santo Amaro da Purificação, na Bahia. Ambas participaram do show de lançamento.
Gravado entre novembro e dezembro de 2008, “Dez cordas do Brasil” marca a estreia do selo Repique Brasil, do cantor, compositor e produtor Chico Adnet. Que assim escreveu: “Ser caipira é trazer no sangue as imagens de beira de rio, os sabores da roça, cheiro de lenha e capim. É ter vivido a vida saudável, cheia de infância e de histórias pra contar. Jaime Alem é um caipira do mundo”.
Um caipira, de fato. Que vasculhou a memória e de lá tirou tantas sensações e expressões (capiau, pau-d´água, bão, toucinho, som de rádio, rio, violeiros, chapéu aparando moedas) e as traduziu em som. “Dez cordas do Brasil” é uma festa sonora.
Jaime Alem, excelente violeiro e compositor, provê quem o ouve da sagrada sensação de ser ou sentir-se interiorano, sertanejo ou caipira mesmo. Tocante, maestro, tocante!!!
Clique e confira a entrevista em que Jaime Alem fala sobre a idealização de “Dez violas do Brasil”, trajetória artística e relação afetiva e musical com Maria Bethânia.
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** Algo a dizer sobre Jaime Alem?
** O Brasil é caipira ou sertanejo, de fato? Guimarães Rosa diz que “o sertão é dentro da gente”, concordam? Espaço Aberto
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