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Bacana ouvir a platéia fazendo coro em tantas canções! Eu me emocionei especialmente em duas: “Veja (Margarida)”, tão coberta de saudade de um tempo feliz, dedos no meu violão para tocar e cantar para a moça que amava a canção e eu a ambas (o desejo ainda estava à procura do onde); e “Bicho de sete cabeças I e II”, desabafo cortante, a triste constatação de entrega dos sentimentos a mãos erradas (“não tem coração que esqueça, cresça e desapareça”).

Outros tempos, novos tempos! Metáforas atravessadas em mim no show de Geraldo Azevedo, sábado (dia 29), no (praticamente lotado) Teatro Ouro Verde de Londrina. Quase duas horas diluídas em clássicos e obras recentes, na empatia estabelecida com o público que deu um show à parte.

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Além de cantar, aplaudir, manifestar-se espontaneamente (“você está em casa”), as pessoas deram um show a parte: levaram mais de meia tonelada de alimentos não perecíveis a ser enviada aos desabrigados de Santa Catarina.

Música de qualidade, sensibilidade a toda prova, solidariedade num só espaço. Bonito quando o Brasil acode a si mesmo; deveria ser sempre assim, independente de catástrofes. Louvável mesmo assim ver a manifestação – em meia a tantas – de ajuda aos nossos vizinhos. A arte do auxílio! Somos assim…

No palco, Geraldo Azevedo – vindo pelo projeto cultural ConstruSom, da construtora Vectra – foi dando seu recado com canções conhecidas e ainda por se ser melhores apreendidas. Outras ainda arquivadas num canto da afeição.

Entre “Dia branco” (com Renato Rocha), “Dona da minha cabeça” (com Fausto Nilo), Moça bonita (parceria com Capinam), “Caravana e “Talismã” (ambas com Alceu Valença), preciosidades melódicas e literárias como “Chorinho de criança” e” O que me faz cantar” (extraídas do mais recente disco, “O Brasil existe em mim”, 2007) e a bela “Inclinações musicais” (parceria com Renato Rocha, “Quem inventou o amor/ teve certamente inclinações musicais”).

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Falou e cantou suas águas. Mais precisamente as do São Francisco, rio tão levianamente mexido e remexido, que deu mote ao novo álbum a ser lançado no início do próximo ano. Participações importantes e distintas: de Maria Bethânia a Fernanda Takai, de Djavan a Ivete Sangalo, alguns. O repertório deverá abrigar “O ciúme” (Caetano Veloso).

O artista pernambucano enfatizou o descaso com os recursos hídricos do planeta. “Se houve uma terceira guerra será por causa da água”, disse. “Todos deveriam plantar flores e acender velas às margens dos rios, que é onde se busca a vida”, complementou.

Nem todos os recitais de voz e violão se garantem, é certo. Não foi o caso de Geraldo Azevedo, instrumentista admirável e apurado melodista. Mais de quatro décadas na estrada. No palco, não utilizou-se de personas ou artifícios; mostrou-se por inteiro. Há verdades no que emite.

A tradicional conversa com a platéia teve também momentos de descontração, quando mostrou, durante execução de uma música, os dedos a um produtor. O que ele pedia? Uma lixa para aparar a unha lascada. “Uma unha pra gente que toca é muito importante”, disse. Gargalhadas. “Eu não me lembro de ter vindo a Londrina”. Alguém da platéia diz que veio, sim. “Véio, me ajuda a lembrar então”, devolveu.

Geraldo deu seu bom recado musical. O público aplaudiu e muito. O público, aliás, merece palmas também. Pelo acolhimento ao artista e generosidade à população catarinense. Bravos!

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