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A iminente falência do teatro em Curitiba
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O ator, diretor e produtor de teatro Marino Jr. escreveu uma importante reflexão sobre a cena teatral atual de Curitiba com o mesmo título que aproveitei (roubei) para este post. O texto original foi publicado no blog do autor: colunalombarda.blogspot.com. Com autorização, reproduzo aqui com a intenção de espalhar a discussão e a reflexão sobre o teatro produzido na cidade.

Para jogar mais lenha na fogueira, lembro que 96 projetos de artes cênicas (91 não iniciantes e 5 iniciantes) foram aprovados pela Lei de Incentivo à Cultura de Curitiba. Como o prazo para concretização dos projetos é de dois anos, podemos contar que haverá praticamente uma estreia por semana nos próximos dois anos só com projetos da Lei.

Reprodução Blog Coluna Lombarda
Reprodução de imagem do Blog Coluna Lombarda, do ator, diretor e produtor Marino Jr.

A seguir, o texto de Marino Jr.:

Quando terminar o ano de 2011 e os teatros curitibanos, incluindo aqui os teatros públicos, fizerem seus balanços chegar-se-á a uma conclusão que deverá acender um grande sinal vermelho para o setor. Nunca houve tanta oferta e tão pouca demanda. Isso mostra um descontrole que vem afetando a presença do púbico nas produções locais. Se nada for feito para regular o frágil mercado de teatro em Curitiba será o colapso do setor. Vamos queimar café.

Espetáculos curitibanos que se mantinham quase que exclusivamente de bilheteria já não o fazem mais. Salas vazias, mudanças constantes na programação, tentativas de acerto e nada. Público que é bom passou a ser artigo de luxo em qualquer teatro local.

Muitas companhias no desespero de manter a casa cheia ou ver alguém na platéia apelam para sites de vendas coletivas puxando para baixo o valor médio praticado e habituando o público a pagar cada vez menos pelo valor de um ingresso. Além disso, este sistema é passível de investigação pelo Ministério Público, já que desrespeita e burla a legislação da meia-entrada, fazendo com que na prática todos paguem menos que a metade da meia-entrada. Compra coletiva não funciona em um mercado tão restrito e particular como o cultural. As conseqüências são visivelmente catastróficas.

Em outra ponta os espetáculos subvencionados através das Leis de Incentivo, federal ou municipal no caso de Curitiba, geralmente gozam de uma qualidade artística que independe de seu sucesso na bilheteria. Se a demanda por este tipo de produto abaixa o produtor em teoria vê-se na obrigação de abaixar o preço visando atrair mais público. O produto está pago. Não há motivo para cancelar uma apresentação. Se for o caso o mesmo pode até realizar apresentações de graça. Se pensarmos pelo lado do dinheiro público, seria um raciocínio justo. Sob a ótica do mercado este produtor está errado. Está criando um abismo na diferença de preço entre o mercado teatral local e aquele que “importamos” do Rio ou de São Paulo.

Pensemos o mercado teatral como uma praça de alimentação de um pequeno centro comercial de um bairro. Isso é o teatro de Curitiba em relação ao Brasil. Nesta praça o valor médio de uma refeição é R$ 15,00. O que acontece se um determinado comerciante entrar neste mercado e oferecer um produto melhor a um valor de R$ 10,00 gozando ainda de incentivos fiscais para sua produção? A resposta é clara: Quem vai pagar continuar pagando os R$ 15,00? A tendência econômica é o preço baixar.

Mas se neste cenário entra um novo “player”? Que também recebeu incentivos fiscais para sua produção e assim como o outro não tem custo operacional? Com medo de “jogar fora” sua produção, no caso fazer apresentações para ninguém ou até mesmo cancelar, resolver cobrar R$ 5,00? Ou mesmo doar toda a sua produção? Obviamente a praça de alimentação irá a falência.

O mercado teatral local é um mercado muito pequeno em razão da baixa demanda. Aumentar a oferta, vender a baixo preço ou mesmo doar ingressos cria prejuízos enormes à sustentabilidade do mercado. Além disso, nem sempre o preço é a variável decisiva que leva as pessoas ao teatro. Há que se haver estímulo, necessidade de se consumir cultura.

William J. Baumol and William G. Bowen já explicaram isso nos Estados Unidos nos anos 60 com “O dilema econômico, ou a teoria dos custos no setor das artes cênicas”. Esta teoria é o fundamento da economia da cultura que hoje faz parte da nova economia ou economia da criatividade. Conceito criado no Reino Unido dez anos atrás.

Em outras palavras o público está se habituando a pagar muito pouco pelo teatro que consome aqui. Se somarmos a isso o aumento na oferta de “produtos similares chineses”, como shows de stand-up feitos nos bares curitibanos, além da oferta de “importados de qualidade”, como os grandes espetáculos do Rio e São Paulo que se tornam verdadeiros objetos de desejo de um público emergente, fica claro que o mercado está se autodestruindo.

Para os próximos anos será pior. A produção de cultura em Curitiba receberá grandes incentivos através da nova Lei Estadual de Incentivo que tramita na assembléia. Sem dúvida nenhuma uma conquista definitiva, necessária e higiênica para todos os artistas do Paraná. Porém isso irá aumentar ainda mais a oferta para uma demanda cada vez mais reprimida.

Ou seja, teremos que queimar o café, como se fez no passado quando o mercado desta “commodity” entrou em colapso.

Por Marino Galvão Jr.
colunalombarda.blogspot.com

MARINO GALVÃO JR – Ator, diretor e produtor teatral. Mestrando em Gestão do espetáculo e da Indústria Cultural pela SDA BOCCONI – Milão Itália. Atualmente colabora na área de planejamento e marketing do Piccolo Teatro de Milão.

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