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Passadas as eleições e a Virada Cultural, nos aproximamos do fim do ano, hora de fazer balanços, colocar a vida e projetos em perspectiva e planejar o que faremos ou deixaremos de fazer no futuro. Por isso, começo a partir deste texto a refletir sobre a política pública de cultura. Claro que, por morar em Curitiba, a discussão ficará mais próxima da cidade, mas pode também abranger toda a ação estatal sobre a cultura.

O que é política pública cultural? Vamos ao básico do básico: um governo deve propiciar aos artistas a possibilidade de criar e de apresentar a sua arte; e ao povo, os governantes devem permitir e facilitar o acesso ao que os artistas criam. É uma simplificação, pois a prática é bem mais complicada.

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Verbas e menos verbas

A Fundação Cultural de Curitiba investe menos de R$ 2 milhões por ano em projetos culturais com orçamentos próprios (fora outros gastos com manutenção e pessoal que não estão incluídos aí). No mesmo período são destinados R$ 11 milhões para projetos culturais via Lei de Incentivo, recursos de impostos da iniciativa privada (ISS e IPTU) que a prefeitura destina a projetos aprovados pelas comissões de Mecenato e Fundo Municipal de Cultura. Ou seja, as leis de incentivo, que deveriam ser uma forma de apoio complementar à política cultural do município, passaram a ser o principal recurso da política cultural da cidade. Sem o dinheiro da Lei de Incentivo, o que aconteceria com a cultura de Curitiba?

Os números acima foram tirados de uma entrevista publicada aqui na Gazeta do Povo, na semana passada, com Rafael Perry, fundador da Infinitoo, empresa que cumpre o papel de mediadora entre autores dos projetos culturais e esportivos e empresas que podem patrociná-los. Aqui reproduzo um item da entrevista, que se refere justamente aos valores citados acima:

“Pergunta: O que as leis de incentivo representam hoje para quem planeja desenvolver esses projetos?

Rafael Perry: Alguns analistas chegam a afirmar que as leis de incentivo deixaram de ser instrumento da política cultural brasileira, para ser a própria política. Apenas para ilustrar a importância das leis de incentivo para o mercado cultural, a Fundação Cultural de Curitiba, nos últimos cinco anos, trabalhou com o orçamento de R$ 235 milhões, o que representa uma média de R$ 46 milhões por ano. Deste montante, 68% são utilizados pela FCC e os demais 32% são destinados ao Programa de Apoio e Incentivo à Cultura, nas modalidades Fundo Municipal da Cultura e Mecenato Municipal. Entretanto, a parte que cabe à Fundação é destinada basicamente para cobrir custos (41%) e pessoal (55%), restando apenas 4% para investimentos em programas culturais. Já os recursos destinados à cultura, via Lei de Incentivo à Cultura, atingem o montante de R$ 11 milhões.”

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Orçamento

Há anos a Cultura de Curitiba recebe uma porcentagem menor do que 1% do orçamento fixo do município, e ainda vinha em queda. Felizmente, os dois candidatos que foram ao segundo turno das eleições municipais prometeram o aumento para no mínimo 1%. A previsão do orçamento total da cidade para 2013 é de R$ 5,98 bilhões. Se o mínimo de 1% já valesse para o ano que vem, o que não é o caso porque o orçamento é feito na atual gestão, a Cultura receberia R$ 59,8 milhões, ou R$ 13,8 milhões a mais do que a média anual dos cinco anos passados. É pouco ainda, mas já é uma melhora.

Como disse, esse texto é apenas o início de um debate que farei por aqui e pela Coluna Acordes Locais, na Gazeta do Povo. Hoje toquei de leve apenas na questão de verbas e vemos que atualmente parece praticamente impossível promover a cultura sem as leis de incentivo. Deveria ser assim? Há (boas) alternativas?

Enviei a poucas pessoas algumas questões básicas sobre o tema. Recebi algumas respostas que publicarei na íntegra por aqui. Compartilho as questões para quem quiser refletir sobre elas. Espero que os artistas, produtores, gestores culturais e o povo em geral (incluindo os políticos) venham a opinar também para enriquecer a reflexão.

1 – Curitiba tem política cultural? Qual é? O que falta?

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2 – A Lei de Incentivo substituiu a política pública de cultura?

3 – A falta de dinheiro também suprime a criatividade (esta questão se refere mais à gestão da cultura do que ao fazer artístico)? Como superar?

4 – Qual é a ação mais urgente que se precisa fazer na Fundação Cultural de Curitiba?

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RESPOSTAS

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Os primeiros a responder foram os produtores Getúlio Guerra e Thiago Moreira.

Getúlio Guerra, produtor cultural, responsável pelo programa de rádio e Festival Pras Bandas, que se transformou em uma Ong.

Curitiba tem política cultural?

Que tem, tem. Soa populista, mas sempre sinto falta de abrangência social nessa tal política. No meu entender, a Cultura com C maiúsculo deveria fomentar de forma mais atuante, constante e vibrante, também nas áreas de risco. Curitiba tem mais de 100 favelas e sempre me pergunto: “que acesso esse povo tem?”

A Lei de Incentivo substituiu a política cultural de estado?

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Essa lei tá sendo questionada há anos, porque é desgastante depender da compreensão artística de ditos responsáveis por departamentos de marketing pra viabilizar verba e trabalhar. A linha de financiamento cultural deveria ser menos burocrática e mais volumosa. Uma vez o Carlos Careqa disse que o nosso PrasBandas, por exemplo, deveria ser oxigenado diretamente pela prefeitura.

Descentralizar pra deselitizar!

A falta de dinheiro também suprime a criatividade? Como superar?

Não se produz com comprometimento e constância sem dinheiro. A superação que há é muito mais para oxigenar a própria carreira de produtor do que a cena em si. Se formos pensar que ainda nem temos 1% do orçamento da Prefeitura para a Cultura, a criatividade sempre foi natural, previsível e independente.

Qual é a ação mais urgente que se precisa fazer na Fundação Cultural de Curitiba?

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Acho que a nova presidência deve chacoalhar esse equipamento, que teoricamente, gera arte pensante na cidade. O urgente é o mínimo: auditorias, verificação de possíveis abusos em contratos de prestações de serviços, um novo concurso público para novos funcionários – otimizando assim a equipe e dando mais vida aos espaços, que são nossos. E, claro, papo reto e constante com a classe e suas ramificações.

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Thiago Moreira

Curitiba tem política cultural? O que falta?

Ultimamente temos sido tratados como área periférica por parte de quem esta à frente da Prefeitura. Entra prefeito e sai prefeito e não se tem continuidade, foram muitas ações de gestão e não de estado. É preciso construir um plano municipal de cultura, pensando dez anos à frente, com objetivos e metas, assegurando que as ações sejam permanentes, para além disto, construir políticas que tenham interlocução com outras áreas, como a da Educação.

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A Lei de Incentivo substituiu a política cultural de estado?

A Lei é a única política de estado para com as culturas, criada no início dos anos 90, por Angelo Vanhoni, acredito que cumpriu papel essencial no incentivo com seus erros e acertos, mas é chegada a hora de sua revisão com amplo debate.

A falta de dinheiro também suprime a criatividade? Como superar?

Com a barriga vazia fica difícil pensar. Muitos artistas não estão conseguindo viver do seu trabalho em Curitiba, outros vão embora procurar em outro lugar uma forma de ganhar dinheiro com sua arte. As culturas representam cerca de 4% do PIB no Brasil, temos que estimular a economia criativa por aqui, não que a prefeitura tenha que pagar todas as contas, mas que ela propicie maneiras e incentivos para que os artistas caminhem com as próprias pernas.

Qual é a ação mais urgente que se precisa fazer na Fundação Cultural de Curitiba?

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A Fundação Cultural de Curitiba, em seus quase 40 anos, se tornou patrimônio da cidade, com grande bagagem histórica, mas não soube se adequar a um novo tempo nas Políticas Públicas de, para e com as Culturas. Temos que reestruturar sua forma de funcionamento, é preciso lidar para além da burocracia, dar um novo gás ao quadro técnico, fazer com que se sintam parte do processo e não que apenas cumpram tabela. Abertura de concurso público também se faz necessário, pois muitos se aposentaram e não foram substituídos.

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Quem quiser responder as perguntas pode enviar por e-mail aqui, ou pelos comentários aí de baixo.