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Curitiba só para turista ver
| Foto:
Hedeson Alves / Gazeta do Povo
Há mais de três anos não acontece qualquer show na Pedreira, com exceção da representação da Paixão de Cristo

Sou vizinho da Pedreira Paulo Leminski e da Ópera do Arame. Nas últimas semanas tenho passado a pé pela frente dos dois monumentos e notado a movimentação de turistas por ali. Não é pouca. Há alguns dias, vi um ônibus despejar duas dezenas de turistas ávidos por informações de Curitiba. Decidi acompanhá-los e entendê-los melhor.

Eles ficaram maravilhados com o que viram. A Ópera de Arame é mesmo linda desde a entrada, a ponte vazada pela qual é possível ver as carpas coloridas e tartarugas nadando no lago abaixo., o teatro com sua arquitetura única, que chama a atenção, o café – e as máquinas fotográficas disparam em todas as direções.

A Pedreira, um caminhar leve e breve, como em um parque. Um casal, ele dentista e ela microempresária, de Pernambuco, parou como se estivesse em uma catedral natural.

– Imagine como é ver um show aqui – comentou ele, o olhar explorando todos os ângulos, abrindo os braços como se quisesse receber a energia do lugar e ao mesmo tempo abraçá-lo.

Fiquei olhando para ele enquanto na minha cabeça passava um flashback de grandes shows que já havia visto ali. Quase não percebi o sorriso do casal em minha direção como que a pedir a minha confirmação. Então revelei a minha condição de morador local e disse que shows ali eram realmente sensacionais. Eles perguntaram se não haveria nenhum show nos próximos dias já que estariam pela região e poderiam tentar ver. Expliquei que há mais de três anos não acontece qualquer show, com exceção da representação católica da Paixão de Cristo.

Confesso que encabulei por não fazê-los entender que foi uma decisão tomada pela Justiça, que queria preservar a tranquilidade dos vizinhos. Eles perguntavam se havia show toda semana, se não poderia haver uma limitação de horário – “é só mandar o show acabar antes de meia-noite”, diziam –, se não podia haver algum tipo de acordo …

E eu tentando justificar algo que, assim como eles, também não consigo entender. Difícil foi quando argumentaram que, pelo menos tem a Ópera de Arame, que é fechada e que ali sim deveria ter atividades culturais constantes. Como explicar que o local funciona praticamente só uma semana por ano, durante o Festival de Curitiba?

– Se não funciona, nem deveriam trazer turista aqui – disparou o homem. – Estão vendendo uma imagem da cidade que não existe – concluiu.

Enquanto eu dava um sorriso amarelo, me contaram que não perdem nenhum ano a Festa de São João de Caruaru. Que toda a cidade se mobiliza para as festas juninas. E que este ano até a comemoração de Corpus Christi na cidade foi antecipada para não cair junto com a festa, que emenda quase uma semana direto com shows e bailes. Que lá, as famílias de moradores abrem suas casas para os visitantes e divertem-se juntas, vivem o momento.

Eu ia argumentar que talvez seja porque lá é apenas uma vez por ano, mas o guia já chamava a todos de volta ao ônibus e eu aproveitei para me despedir.

Tem coisas em Curitiba que são mesmo só para turista ver.

O processo da Pedreira

Com isso na cabeça, fui tentar saber a quantas anda o processo da Pedreira. Há alguns dias, a justiça autorizou a contratação de perícia. Falei com a arquiteta e engenheira Vera Lúcia de Campos Correia Shebalj, perita do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia (Ibape). Ela me explicou que irá confirmar esta semana se já poderá começar os trabalhos.

O prazo, que deveria ser de 180 dias, ela promete encurtar para no máximo 30. “Pela importância do tema para a cidade queremos resolver logo e não apenas para dar mais um parecer, mas para definir de vez a situação, que seja conclusivo”, afirmou.

“A perícia é a mão técnica do juiz”, ela afirma e explica que o perito não tem compromisso com nenhum dos lados da questão, mas com a verdade, uma verdade técnica. Para ela, a acústica do local é resolvida pela própria natureza e não terá muito o que fazer. O maior questionamento deve ser quanto a fluidez e escoamento do público, que podem trazer maior transtorno à vizinhança. Além de responder aos questionamentos do processo, ela deve apontar alternativas viáveis para os problemas que a equipe perceber.

Depois, tudo volta à Justiça e sua lentidão imutável.

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