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Fórum Paranaense de Música: carta sobre Curitiba e  a música
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Reproduzo aqui a carta aberta escrita pelo Fórum Paranaense de Música sobre as ações contra bares, restaurantes e espaços culturais que promovem a música local. A buRRocracia e a truculência desnecessárias fizeram a prefeitura de Curitiba e o governo do estado segurarem uma batata quente nas mãos:

Pedro Serapio/Gazeta do Povo
O restaurante Beto Batata, em Curitiba, foi autuado por não ter licenças que permitem música ao vivo

O Fórum Permanente de Música do Paraná vem por meio deste registrar a indignação dos seus integrantes ante as constantes ações impetradas contra a música em bares e locais públicos por instituições do Governo do Estado do Paraná e da Prefeitura Municipal de Curitiba. É inaceitável que ocorram ações policiais, ostensivas e com armamento, como a realizada no dia 14 de maio, no Beto Batata, fechado pelo “crime” de proporcionar aos seus clientes música ao vivo de qualidade. No momento do fechamento, cerca das 20,30 horas, havia um trio com a formação acústica de piano, oboé e contrabaixo e as pessoas que lá estavam comemoravam um aniversário. Mais que simples autuação, o que houve foi uma ação truculenta, que nos lembra momentos sombrios de ditaduras.

O ato de fechamento praticado dentro da Ação Integrada de Fiscalização Urbana e pela fiscalização de guardas municipais, agentes da Secretaria Antidrogas Municipal, do Conselho Tutelar, da Vigilância Sanitária, das secretarias municipais do Meio Ambiente e do Urbanismo, da Diretran, das Polícias Militar e Civil e dos Bombeiros foi praticado tendo por base denúncias de vizinhos, sem levar em consideração que o Beto Batata é espaço cultural importante e foi palco, inclusive, de eventos da Fundação Cultural de Curitiba e de reunião do Ministério da Cultura para discussão de Lei Rouanet. Este ano, ações similares foram realizadas contra outros bares da cidade, como o Ao Distinto Cavalheiro, que no carnaval foi fechado por ter música ao vivo. Houve ações policiais em bares como Wonka, On Lounge Café, John Bull, Zapata, entre outros. Cabe aqui lembrar que o principal local de grandes eventos do Estado, a Pedreira Paulo Leminski está fechada para música pela mesma razão: o direito do silêncio dos vizinhos; estranhamente, não está para eventos religiosos. Eventos musicais na Praça Espanha também foram proibidos e houve também proibição de aulas de música em uma escola particular de ensino fundamental.

A estas ações constantes cabem indagações. Que tipo de progresso nesta cidade queremos? E como o poder público pode trabalhar em prol do desenvolvimento cultural dos seus habitantes? Em seu documento “UNESCO e as cidades: uma parceria”, a entidade destaca que “sendo laboratórios vivos da cultura, as cidades são lugares únicos de manifestação da diversidade. Seja o foco de interesse o patrimônio herdado ou as atividades criativas, a cidade é onde a criatividade e as relações humanas se fundem. Para que esse fermento beneficie a sociedade e os indivíduos, as autoridades locais devem desempenhar o papel de coadjuvantes e facilitadores”. Não é o que temos visto em Curitiba, em relação à música apresentada ao vivo em bares e locais abertos.

Nesta cidade, infelizmente, acata-se preferencialmente um pensamento retrógrado, de gente que entende que cidade boa é cidade absolutamente silenciosa. Pessoas que não entendem que a cidade cresceu e precisa de espaços para a música e as artes. E que a existência destes locais contribuem para o lazer mental de todos, uma vida melhor, além de gerarem renda e trabalho a diversos profissionais.

Se a Prefeitura transforma ruas pacatas em vias rápidas, aumentando a poluição sonora, chega a impedir estacionamento nas vias sob a alegação de que não se pode impedir o progresso, por que não faz o mesmo com a música, não estabelece horários mais flexíveis para sua prática? Não se coloca como facilitador de um diálogo entre os que querem o fim da música e os que a defendem? Impedir a prática da música é impedir o progresso cultural de uma cidade. Prestes a sediarmos a Copa do Mundo, este ataque à música contribui para uma imagem negativa de Curitiba. Será que só hotéis estarão capacitados para atender a necessidade de lazer noturno dos turistas? Cidade sem espaços musicais é cidade sem lazer e qualidade de vida.

Ao Governo do Estado e à Prefeitura solicitamos que ações policiais como a realizada no último sábado e tendo por base a música não mais ocorram. Há outras formas de se fazer prevalecer a legislação. Solicitamos também à Assembléia Legislativa do Estado e à Câmara Municipal de Curitiba que realizem debate sobre o tema e estabeleçam uma legislação, no qual se consiga uma política razoável. Que a Prefeitura desburocratize o fornecimento de alvarás para bares que tem música ao vivo, norteados pelo princípio do limite de horário (22 horas) e decibéis. Que os alvarás sejam necessários somente para bares e instituições cujo som de seus eventos ultrapassem o limite, então exigindo o isolamentos acústico para o fornecimento do alvará.

Ao mesmo tempo salientamos que cabem aos habitantes da cidade adequarem-se às mudanças e, quando incomodados apesar dos cuidados dos bares e instituições, invistam no isolamento sonoro em suas residências, algo comum em hotéis da cidade. A música não deve ser interpretada como ruído e o problema não deve ser transferido apenas aos bares, aos músicos e aos clientes dos estabelecimentos. É como diz a UNESCO em seu documento sobre as cidades, “A complexidade do mundo urbano não pode ser plenamente compreendida, tampouco pode uma cidade ser gerida por um único indivíduo ou instituição. Seus habitantes têm de aprender a conviver”.

Curitiba, 20 de maior de 2011

André Alves
Coordenador

O Fórum das Entidades Culturais apóia as colocações do Fórum Permanente de Música do Paraná.
Oswaldo Euclydes Aranha
Coordenador Geral

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Este blog pode ser seguido no Twitter: @Sobretudo

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