Da coluna Acordes Locais, que sai às quartas, no Caderno G do jornal Gazeta do Povo
A música popular brasileira andava meio carente de experimentos que a aproximasse da música clássica. E isso em um país que teve e tem Villa-Lobos, Rogério Duprat, Egberto Gismonti, Arrigo Barnabé, Chico Mello, para citar poucos.
Não é uma questão de ou eu quero tchá ou eu quero tchu. As duas, popular e erudita, devem conviver e se influenciar com experimentos, aproximações, teorias e práticas. Uma faz a outra crescer.
Eis que surge em Curitiba o projeto Vitral, da dupla Indioney Rodrigues e Ricardo Janotto, que se inspira em experimentações eruditas e as usa em um espetáculo que reúne também canções populares. Sambas, Raul Seixas e até o “Eu Quero Tchu, Eu Quero Tcha”, se encontram com Pierre Boulez, Karlheinz Stockhausen e Olivier Messiaen.
Rodrigues faz doutorado de música em Londres e tem como objeto de estudo o tempo dentro da música. Ele se interessa pela diferença possível dentro da repetição. É mais ligado à música erudita e à experimentação, embora já tenha trabalhado com e componha música popular. Ricardo Janotto já é mais ligado à música popular. Os dois são multi-instrumentistas e parceiros de longa data. Em 2002, lançaram o disco Barroca.
A ideia do espetáculo Vitral, segundo eles, surgiu com a forma circular do Teatro do Paiol. O show tem uma hora de duração, sem interrupção. A dupla reuniu perto de 200 samplers com fragmentos de canções, que vão também circulando pelo teatro, por um sistema de sete caixas e um subwoofer, estrategicamente localizados, em 38 canais simultâneos. Tudo forma um ambiente sonoro em cima do qual os músicos tocam outras canções, com muito espaço para improvisação.
Cada um toca de seis a sete instrumentos, alguns inusitados, como uma bicicleta que serve de percussão. Eles devem gravar um DVD do show, mas, pela própria estrutura, cada apresentação ao vivo é inimitável.
A dupla está em processo de ebulição criativa e já tem outros projetos engatilhados. Em outubro eles fazem o espetáculo 5, junto com um ator que, com sua intervenção cênica, também produz sons. Em novembro, vem o espetáculo 7, novamente com experimentação. E ainda sem data, vem o show Stargate, que além do som deve ter também painéis eletrônicos.
“Meu interesse é surpreender”, afirma Indioney Rodrigues. Para ele, é preferível ficar conhecido como alguém que busca sempre o experimental, e que não se repete, do que aprimorar uma ideia já apresentada, mesmo que seja uma boa ideia. “Me interessa a novidade, uma educação sonora, a ampliação do ouvir”, esclarece.
“Estamos num momento muito ‘mono’ da música global”, diz Janotto, explicando porque decidiram abusar dos sons e efeitos. “Está tudo muito certinho, nós oferecemos risco e desconforto”, completa Indioney.
Vitral chega assim, unindo o clássico e o popular com experimentação. São pequenas partes que formam um todo integrado, como num vitral sonoro.
Serviço – Vitral
Indioney Rodrigues e Ricardo Janotto. Teatro do Paiol (Pç. Guido Viaro, s/nº – Prado Velho). Dia 28, às 20 horas. Ingressos: R$ 40 e R$ 20 (meia-entrada).
Fórum de Música
Os músicos de Curitiba e do Paraná terão à sua disposição mais um fórum para discussão, organização e proposições de atuação profissional e política. No dia 27 de julho será lançado oficialmente o Musipar, também como um portal de discussão da música do estado. O lançamento será na Aldeia do Beto (antigo Beto Batata Original).
O Fórum nasce não sem certa polêmica, já que surgiu de uma dissidência de outros pré-existentes, o que mostra que os músicos não estão unidos. Será mais uma voz e, segundo os envolvidos, terá menos preocupação com a politicagem e se fixará mais nas questões práticas. Não trabalharão em oposição aos movimentos já existentes e sempre que a situação permitir somarão forças em benefício dos músicos locais.
Férias
Caros leitores, sei que vocês merecem férias. Por isso, esta coluna entra em recesso no mês de julho. Bom descanso.
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