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No dia 27 de março último, um aluno de 13 anos da Escola Estadual Thomazia Montoro, em São Paulo, matou a facadas uma professora de 71 anos e também feriu um aluno e outras três professoras com o mesmo objeto cortante. Diante desses fatos, o adolescente foi detido e encaminhado à Fundação Casa. De acordo com o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA – Lei 8.069/90), as crianças e adolescentes não cometem “crime”, mas sim um “ato infracional”, embora, na prática, as infrações sejam as mesmas. Além disso, o legislador entendeu que os menores de 18 anos não são “presos”, mas sim “detidos”. Contudo, na realidade fática, a prisão ou a detenção equivalem ao afastamento de um indivíduo do convívio social por determinado tempo diante da prática de um ato ilícito.
O ECA trás uma série de direitos e deveres do Estado, da família e da sociedade para com as crianças e adolescentes, e também dispõe sobre medidas punitivas aos menores de 18 anos que cometem os denominados “atos infracionais”. Além disso, o referido Estatuto prevê que os menores não podem receber uma “pena”, mas, sim, uma “medida sócio educativa”. Com abuso de eufemismos, o Estatuto da Criança e do Adolescente utiliza uma linguagem paliativa e leve para se referir ao seguinte ponto: a criminalidade praticada por menores de 18 anos. Em relação ao caso em análise, se o aluno tivesse a idade de 18 anos, ele responderia por um crime de homicídio triplamente qualificado e, a princípio, por três tentativas de homicídio qualificado, podendo receber uma pena mínima de aproximadamente 28 anos de reclusão.
Penso que crimes graves devem ser severamente punidos, no intuito de a devida punição contribuir para que crimes futuros deixem de ser cometidos.
Sendo o crime de homicídio qualificado considerado um crime hediondo – pois está inserido na Lei 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos) – o indivíduo que o pratica terá uma série de restrições legais, pois, de acordo com essa lei, os crimes hediondos são inafiançáveis (o agente não pode pagar uma fiança para conseguir sua liberdade); não podem ser objeto de anistia, graça e indulto; o início do cumprimento da pena deve ocorrer em regime fechado; e o livramento condicional ao criminoso somente poderá ser concedido após o cumprimento de 2/3 de sua pena.
Por outro lado, como o autor desses ilícitos tão graves tem apenas 13 anos, e não 18, ele permanecerá “internado” (privado de sua liberdade) pelo prazo máximo de três anos. Na minha análise, essa consequência de apenas três anos de afastamento do convívio social seria muito branda, tendo em vista a gravidade dos ilícitos cometidos.
Por conta deste e de outros argumentos há uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) no Congresso Nacional com intuito de alterar a idade da maioridade penal de 18 para 16 anos, e referida proposta tramita no CN desde 1993. Alguns dos argumentos contrários a essa redução são os seguintes: 1) um possível ferimento a uma cláusula pétrea da Constituição Federal, pois seu artigo 228 diz que são penalmente inimputáveis os menores de 18 anos; 2) diante das precárias condições penitenciárias, dificilmente haveria condições para reinserção do jovem na sociedade; 3) seria mais interessante que o governo investisse em educação e em políticas públicas para proteção dos jovens do que em reduzir a maioridade penal; 4) seriam mais afetados os jovens negros e pobres do Brasil, pois este seria o perfil de boa parte da população carcerária.
Em contraposição, alguns dos argumentos a favor da medida seriam os seguintes: 1) não haveria violação a qualquer cláusula pétrea, uma vez que essas dizem respeito aos direitos e garantias individuais, e a redução da maioridade não acaba com direitos, mas apenas impõe novas regras; 2) as brandas punições do ECA geram grande impunidade, a qual, por sua vez, resulta em mais violência; 3) necessidade de equiparar a legislação brasileira a de países desenvolvidos, onde, em vários deles, adolescentes são punidos criminalmente quando possuem mais de 12 anos de idade; 4) a maioria da população brasileira é favorável à redução da maioridade penal para 16 anos, segundo pesquisas realizadas.
Esse atentado gravíssimo a professoras e alunos ocorrido no mês de março de 2023 não é o primeiro ocorrido no Brasil, pois, infelizmente, outros massacres e atentados em escolas tiveram palco em nosso país. Em março de 2019 ocorreu um massacre em uma escola estadual de Suzano (SP), onde dois ex-alunos mataram 8 alunos e feriram mais 11, e, ao final, um dos atiradores matou seu comparsa e depois se suicidou. Em maio de 2021, em Saudades, município de Santa Catarina, um jovem de 18 anos invadiu uma escola primária e matou com golpes de facão 3 crianças e 2 professoras.
Já na cidade de Barreiras (BA), em setembro de 2022, um estudante atirou contra dois alunos em uma escola municipal, tendo falecido uma aluna cadeirante com 20 anos de idade. Em outubro de 2022, em Sobral (CE), um aluno de 15 anos atirou em 3 estudantes em uma escola pública, tendo um deles morrido. Já em novembro do mesmo ano, duas escolas da cidades de Aracruz (ES) sofreram ataques de atiradores, onde quatro pessoas morreram e 10 foram feridas. No mês seguinte, em dezembro de 2022, um jovem de 22 anos esfaqueou duas pessoas em uma escola no interior de Ipaussu (SP).
Desta forma, penso que crimes graves devem ser severamente punidos, no intuito de a devida punição contribuir para que crimes futuros deixem de ser cometidos.