Entrar naqueles navios não era para qualquer um. Desde 1415 os portugueses começaram suas aventuras pelo Oceano Atlântico, e uma coisa o povo português entendeu desde o começo: navegar o Atlântico não era para amadores. O motivo era muito simples: quando um navegador entrava naqueles navios, a chance de terminar no mar era muito grande.
Nos artigos anteriores vimos a evolução impressionante de Portugal em relação à arte de navegar os oceanos: os avanços científicos e navais dos “portugas” estavam muito à frente de seu tempo. Ninguém tinha a tecnologia que os portugueses tinham, e muito menos a experiência acumulada de décadas de sacrifícios. Sacrifício é uma palavra que representa bem a realidade daqueles navegadores que, na maior parte das vezes, eram voluntários nas navegações.
Mesmo com suas incríveis naus, o caminho marítimo depois do Cabo Bojador era um inferno. Vamos pegar como exemplo a "viagem das viagens" feita por ninguém mais ninguém menos que, o Gigante da Colina, Vasco da Gama... Desculpem pelo trocadilho; como vascaíno, não pude evitar. Mas então, sua esquadra tinha 4 navios e ele levou cerca de 90 dias só pra chegar até o Cabo da Boa Esperança. Antes de Vasco da Gama cruzar o Cabo e entrar para a história, ele quase virou história antes de virar história de verdade. Na volta do Mar, que era navegar a Oeste e depois voltar para a Leste, eles pegaram uma calmaria aterrorizante. Sim, nem tempestades terríveis aterrorizavam mais os navegadores do que uma mortífera calmaria.
Os mortos começavam a aparecer depois de algumas semanas. Eram jogados ao mar mesmo, depois de uma missa encomendando sua alma.
Lembremos que os navios portugueses eram unicamente propulsionados pelo vento. Acabou o vento, acabava a navegação; e, acabando a navegação, acaba a comida, a água, a saúde e a vida. Foram incríveis 30 dias à deriva em alto mar sem terra à vista: a comida já estava toda apodrecida, os biscoitos cheios de bicho, a água era limitada a cerca de 150 ml por dia, chegando ao ponto de ser misturada com vinagre para ter mais volume. Peixe se tornava a dieta principal neste momento. Obviamente, ele era cozinhado com água do mar. Agora, imagina a sede que dava depois de comer aquele peixe salgado cozido na água do mar? E para piorar, sem vitamina C, o escorbuto começa a flagelar os navegadores: dentes caiam, as gengivas inchavam, a pele rachava e ardia muito naquele sol causticante. À noite, os marinheiros dormiam ao relento, sobre o convés mesmo, em camas de palha ou oleados molhados. Os porões abaixo iam cheios de mercadoria de troca para o Samorim na Índia.
Os mortos começavam a aparecer depois de algumas semanas. Eram jogados ao mar mesmo, depois de uma missa encomendando sua alma. Mas o vento voltou a soprar novamente depois de um mês, e aqueles sofridos navegadores conseguiram juntar o resto das forças que já não tinham para completar sua viagem. E eles completaram e entraram para a história. O preço foi alto: dois terços dos navegadores na esquadra de Vasco morreram pelo caminho. Mas essa era a realidade na Era das Grande Navegações até Vasco. Depois dele, foram melhorando os navios, a arte de navegar, o estudo dos ventos e da melhor época para viajar, os instrumentos... E menos navegadores morriam.
Foi assim que esses navegadores corajosos descobriram o mundo: para o bem e para o mal. Então, da próxima vez que você olhar uma “caravela”, mesmo que seja no escudo de um time, tenha respeito, por favor.
Inteligência americana pode ter colaborado com governo brasileiro em casos de censura no Brasil
Lula encontra brecha na catástrofe gaúcha e mira nas eleições de 2026
Barroso adota “política do pensamento” e reclama de liberdade de expressão na internet
Paulo Pimenta: O Salvador Apolítico das Enchentes no RS