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Thiago Braga

Thiago Braga

Entender a história da guerra é entender a história dos homens. Uma nova coluna todo domingo.

Revolução Russa: revolução ou golpe?

(Foto: HULTON ARCHIVE/Getty Images)

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O fato é que golpe é uma palavra feia mesmo, pouca gente gosta. Representa uma tomada do poder de um Estado pela força. Revolução é uma palavra menos feia, para alguns até bonita, mesmo que a situação fique feia depois. Mas no caso da Rússia em outubro de 1917, não há dúvidas (ou não deveria haver) de que o que ocorreu foi um golpe, sim. Mas primeiro vamos relembrar aqui o que estava acontecendo na Rússia àquela época.

Quando os comunistas chegaram em Petrogrado, já pegaram o bonde andando. Já havia um governo duplo funcionando: que era o governo provisório democrático conservador, e os sovietes que representariam os interesses dos trabalhadores. E olha como o povo sempre busca moderação e equilíbrio e não golpes de Estado malucos como os comunistas querem: com esse novo governo, o povo russo tinha se entendido com a burguesia (que incluía os donos de fábricas e indústrias na própria capital) e os dois lados estavam de boa. O professor Robert Gellately (que citamos na abertura desta série na coluna anterior), em sua obra Lenin, Stalin e Hitler, diz que "com essa revolução a Rússia tinha finalmente dado o terceiro dos 5 passos descritos por Marx até o comunismo." Com essa revolução liberal democrática, nos moldes da revolução gloriosa na Inglaterra, a Rússia saía de uma monarquia absolutista e avançaria rumo ao desenvolvimento capitalista com um governo democrático parlamentar.

Mas Lenin estava com a “cara quente” com isso. Quem Marx pensava que era, para falar que os revolucionários tinham que dar um passo de cada vez? Do segundo passo, Lenin já queria pular para o quarto: do feudalismo para o socialismo. Para conseguir isso, ele teve uma ideia genial. Aproveitou-se da conquista do povo russo na revolução de fevereiro para conseguir a sua própria revolução. Ele até inventou um slogan (é típico de comunistas inventarem slogans que grudam nas mentes desavisadas); e o slogan de Lenin era: “Todo o poder para os sovietes”. Lenin sabia que nesse novo governo o povo era a organização conhecida como “sovietes”, e era dos sovietes e do povo que Lenin iria se aproveitar.

Quem Marx pensava que era, para falar que os revolucionários tinham que dar um passo de cada vez? Do segundo passo, Lenin já queria pular para o quarto: do feudalismo para o socialismo.

Mas a Primeira Guerra ainda estava rolando solta, os soldados continuavam morrendo. O povo estava cansado; a economia, quebrada; e aqui o professor Gellately diz que “os bolcheviques tentaram capitalizar com manifestações em Petrogrado com slogans como 'todo o poder aos sovietes' e 'abaixo o governo provisório.' " Lenin era tão elitista que sabia que, se deixasse nas mãos do povo, a revolução comunista nunca aconteceria. Talvez porque o povo não era idiota, então tinha que ter um idiota para se aproveitar de momentos de crise pra levar os outros às suas idiotices.

A Rússia estava voltando ao caos, do jeitinho que Lenin queria, porque desde o início ele torcia pra Rússia se dar mal na guerra. A Rússia se dando mal na guerra, o país viraria um caos; e no caos, tudo de ruim pode acontecer, principalmente uma revolução comunista. A história já provou que comunismo só surge do caos. Países desenvolvidos, com instituições democráticas liberais sadias, sempre passam longe do comunismo. Mas o professor Gellatelly conta que, no meio do caos, Kerensky tomou uma decisão que ia “ferrar” com os planos de Lenin, sem ninguém nem saber quem era Lenin direito. Kerensky convoca eleições antecipadas: o povo ia decidir os rumos da Rússia agora. O professor explica melhor pra gente isso aqui, ó: "Kerensky convocou novas eleições para uma assembleia constituinte, marcadas para 12 de novembro. Era a coisa democrática a ser feita. Lenin estava escondido na Finlândia, mas insistiu para que os bolcheviques rejeitassem tal abordagem." Ele sabia que o desempenho seria fraco em eleições livres porque os camponeses votariam no partido social revolucionário “deles”. E já tem uma coisa esquisita aqui; pensa comigo: se os camponeses eram mais de 90% da população pobre da Rússia, por que Lenin e os bolcheviques teriam medo de eleições democráticas, se eles eram os representantes e lutavam pelos trabalhadores da Rússia? Isso é assunto para nossa próxima coluna, aliás.

Mas o fato é que Lenin estava seguro do que tinha que fazer: golpe de estado. O professor Gellately diz na p. 52, citando o próprio Lenin: “A história não nos perdoará se não tomarmos o poder agora.” Ele insultou os camaradas favoráveis ao processo democrático como “traidores miseráveis” sofrendo de “ilusões constitucionais.”

Com as instituições em frangalhos, o exército disperso e o povo inerte, os Bolcheviques não tiveram qualquer dificuldade ou resistência para aplicar seu golpe: precisaram de apenas 5% dos trabalhadores e soldados de Petrogrado, cerca de 25 mil homens apenas. Em outubro de 1917 os comunistas tomam o palácio de inverno e Lenin tem finalmente um golpe de Estado para chamar de seu. E sabe o que o povo estava fazendo enquanto os bolcheviques faziam seu golpe de estado? O professor explica nas p. 56 e 57: “na manhã de 25 de outubro, o golpe estava terminado. Lenin soltou um comunicado à imprensa afirmando que o governo fora deposto. Conforme colocou de maneira bastante enganadora, 'a causa pela qual o povo lutou, esta causa está assegurada.' Não houve nenhuma tomada mítica do Palácio de inverno conforme a maneira vividamente retratada no filme Outubro de Sergei Eisenstein, cujas cenas foram repetidas em inúmeros documentários.”

E assim, nasceu a "Revolução" Russa: um golpe de Estado orquestrado por uma minoria elitista que se aproveitou das circunstâncias para tomar o poder. Mas não tema! Os bolcheviques continuariam do lado do povo e o povo continuaria do lado dos bolcheviques, certo?

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