O autor da oitava resposta à Big Question da Fundação John Templeton é o segundo membro do clero a responder, seguindo o cardeal Christoph Schönborn. Mas, desta vez, trata-se de um pastor da Igreja Anglicana.
Keith Ward: não
Uma das primeiras coisas que chama a atenção na resposta de Ward é que, embora nenhum currículo dele que eu tenha visto mencione formação na área de Física, ele parece entender bastante do assunto. E começa dizendo “Longe de tornar a crença em Deus obsoleta, algumas interpretações da ciência moderna reforçam esta crença”.
Mas primeiro será preciso definir Deus. Ward vai pelo mínimo, digamos, “aceitável”: um ser não-físico, dotado de consciência, inteligência e sabedoria, criador do universo. A mera existência de um ser assim nega todas as ideologias materialistas, e mais: “alguns fatos sobre o universo (no mínimo o fato de ele existir como é hoje) devem ser tais que não possam ser explicados apenas pelas leis causais da Física”. O lance é saber se a realidade é mesmo dessa forma.
Para Comte e os positivistas, explica Ward, a ciência tornaria a crença em Deus obsoleta pois ela eliminaria qualquer possibilidade de seres ou causas espirituais. Mas a mecânica quântica, afirma o filósofo, derrubaria Comte, validando a afirmação de Kant, para quem nossos sentidos só revelam a realidade do modo como ela se mostra a nós. “A realidade em si é bem diferente, acessível apenas por meio de descrições matemáticas que são gradativamente removidas da observação ou da imaginação pictórica”, diz Ward. A era em que tudo estava confinado em um espaço-tempo parece ter ficado para trás, continua.
Uma sutileza interessante que Ward traz é a seguinte: se Deus é um ser não-físico que atua no universo de maneiras não-físicas, a ciência não conseguirá “detectar Deus” porque seu modo de atuação não é exatamente sujeito a leis (embora Ele seja considerado o autor das leis físicas e químicas), mensurável, previsível ou observável.
E o filósofo acrescenta que muitos que se opõem à idéia de uma criação inteligente (Ward ressalta que isso é diferente de “design inteligente”) admite que as leis, circunstâncias e variáveis que levaram ao desenvolvimento do universo e, em especial, do nosso planeta são tão reguladas que parecem ter sido feitas justamente para favorecer o surgimento de vida inteligente. “A hipótese de criação inteligente é boa porque faz a existência de vida inteligente muito mais provável do que se essa vida fosse produto de um processo cego que poderia muito bem ter ocorrido de outra forma”, diz, acrescentando logo após que isso é mais filosofia do que ciência propriamente dita – o que, penso eu, não invalida de jeito nenhum o raciocínio.
Ward conclui que não é a ciência que torna a crença em Deus obsoleta, e sim uma interpretação materialista do mundo. A constatação científica moderna de que há uma “beleza matemática” na natureza, diz, sugere uma “inteligência cósmica”. E, assim, na verdade a ciência tornaria certo tipo de crença em Deus mais plausível, e não obsoleta.
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Mais sobre Keith Ward
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Perfil no Gresham College
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