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Estava devendo um relato de como foi o VI Congresso Latino-Americano de Ciência e Religião, do qual participei semana passada na Cidade do México. Organizado pela Universidade de Oxford, com apoio da Fundação John Templeton, e realizado na Universidad Panamericana, esse foi o primeiro de três eventos que fazem parte do projeto Ciência e Religião na América Latina, promovido pela instituição britânica (os outros dois congressos serão no Brasil, ano que vem; e em Oxford, em 2013).

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Foi uma oportunidade extraordinária para conhecer o que vem sendo feito nesse campo em todo o continente, e especialmente no Brasil, de onde vieram mais ou menos 20 dos cerca de 120 delegados. Soube, por exemplo, que a Universidade Federal de Juiz de Fora tem um Núcleo de Pesquisa em Espiritualidade e Saúde, e que outras universidades latino-americanas já têm seus centros de ciência e religião, como o Centro de Estudios en Ciencia y Religión (Cecir), da Universidad Popular Autónoma del Estado de Puebla, no México, e a Fundación Dialogo entre Ciencia y Religión (Decyr), na Argentina. Os diretores das duas entidades, respectivamente Eugenio Urrutia e o padre Lucio Florio, anunciaram durante o congresso que deve ser lançada nos próximos meses a revista eletrônica Quaerentibus, que publicará artigos sobre ciência e religião em português, espanhol, francês e italiano.

O congresso teve uma mistura de sessões plenárias, palestras simultâneas com convidados (nunca mais que duas ao mesmo tempo) e as apresentações curtas, das quais a organização do evento recebeu 170 resumos e precisou escolher 75; nesses casos, havia cinco salas funcionando ao mesmo tempo, o que nos obrigou a ter de fazer escolhas às vezes difíceis, com temas igualmente interessantes sendo apresentados no mesmo horário.

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A primeira das sessões plenárias teve a participação da britânica Fern Elsdon-Baker, do British Council, que nos apresentou o projeto Darwin Now (aliás, confiram aqui um texto interessantíssimo publicado por ela no Guardian a respeito da relação entre ciência e fé), mas eu destacaria principalmente a apresentação de William Carroll, de Oxford; com o tema “Cosmologia e Criação; quando um começo não é o começo”, ele explicou, a partir da Filosofia, por que as afirmações de Stephen Hawking sobre o universo ter surgido “do nada” têm pouco fundamento, estabelecendo uma distinção entre “criação” e “início” e mostrando que não se pode confundir o “nada” com a ausência de matéria. Outra palestra muito interessante foi a de Antonio Lazcano, da Universidade Nacional Autônoma do México, que fez um apanhado da relação entre a hierarquia católica e a teoria da evolução. Ele teve acesso aos arquivos secretos do Vaticano (que “não são nem arquivos, e nem secretos”, brincou) e encontrou homenagens de Pio IX a um crítico de Darwin, mas lembrou que o Papa jamais usou o peso do cargo para condenar a teoria; mostrou o que sucessivos papas disseram ou escreveram sobre o assunto; e concluiu cobrando da Igreja Católica uma rapidez maior diante de novidades científicas.

As sessões “compartilhadas” também reservaram momentos muito interessantes: fã de tirinhas, Peter Hess falou sobre o que significa (e o que não significa) ser feito “à imagem e semelhança de Deus”, um tema que volta e meia aparece nos debates sobre a evolução; Daniel von Wachter, da Academia Internacional de Filosofia, apresentou um modelo segundo o qual intervenções divinas não seriam uma violação das leis naturais (mas não sei se a argumentação dele me convenceu 100%); Andrew Pinsent, de Oxford, usou um conceito da Psicologia, o da “atenção compartilhada”, e o aplicou à doutrina sobre as virtudes de santo Tomás de Aquino. As apresentações curtas, de 20 minutos, tiveram temas variadíssimos, cobrindo história da relação entre ciência e fé, temas de bioética, Biologia, Psicologia, Física, e até uma análise da cobertura jornalística do tema. Como era de se esperar, o catolicismo teve uma presença bem maior no conjunto das palestras em relação ao que se vê no mundo anglo-saxão (por exemplo, no curso que fiz em Cambridge); mas a controvérsia criação-evolução, que não parece ser o principal ponto de discussão por aqui, me pareceu mais representada que os temas de bioética.

Eu também fiz uma apresentação de 20 minutos: no caso, mostrei alguns resultados de uma sondagem com seminaristas católicos de dez estados e do Distrito Federal; como os números completos vão ficar para um artigo, que provavelmente será publicado na Quaerentibus, o que posso antecipar é que há sinais contraditórios: por um lado, os seminaristas não veem contradição entre ciência e fé, acham importante conhecer o assunto, e não desconfiam da ciência (no sentido de que ela faria as pessoas perderem a fé); no entanto, ainda há uma prevalência do “Deus das lacunas” entre os seminaristas, que também não estão convencidos da compatibilidade entre a doutrina católica e a evolução (alguns grupos não veem compatibilidade nem entre o catolicismo e o Big Bang, o que é ainda pior, na minha opinião).

Durante o evento fiz algumas entrevistas, que serão publicadas aos poucos aqui no blog.

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