Hoje os católicos comemoram a festa de santo Alberto Magno, doutor da Igreja e padroeiro dos cientistas. O Papa Bento XVI, em sua série de audiências dedicada às vidas dos santos, falou sobre Alberto Magno em março de 2010; depois de fazer um resumo da biografia do santo, elencou as principais lições que a vida e o trabalho de santo Alberto Magno propõem aos cristãos de hoje. Confiram a íntegra do texto (no site do Vaticano também há um vídeo), com destaques meus:
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Estimados irmãos e irmãs!
Um dos maiores mestres da teologia medieval é Santo Alberto Magno. O título de “grande” (magnus), com o qual ele passou para a história, indica a vastidão e a profundidade da sua doutrina, que ele associou à santidade da vida. Mas já os seus contemporâneos não hesitavam em atribuir-lhe títulos excelentes; um dos seus discípulos, Ulrico de Estrasburgo, definiu-o “enlevo e milagre da nossa época”.
Nasceu na Alemanha, no início do século XIII, e ainda muito jovem partiu para a Itália, Pádua, sede de uma das mais famosas universidades da Idade Média. Dedicou-se ao estudo das chamadas “artes liberais”: gramática, retórica, dialética, aritmética, geometria, astronomia e música, ou seja, da cultura geral, manifestando aquele interesse típico pelas ciências naturais, que depressa se teria tornado o campo predilecto da sua especialização. Durante a permanência em Pádua, frequentou a igreja dos Dominicanos, aos quais se uniu depois com a profissão dos votos religiosos. As fontes hagiográficas deixam compreender que Alberto amadureceu gradualmente esta decisão. A intensa relação com Deus, o exemplo de santidade dos Padres dominicanos, a escuta dos sermões do Beato Jordão da Saxônia, sucessor de São Domingos na chefia da Ordem dos Pregadores, foram os fatores decisivos que o ajudaram a superar todas as dúvidas, vencendo também resistências familiares. Com frequência, nos anos da juventude, Deus fala-nos e indica-nos o desígnio da nossa vida. Como para Alberto, também para todos nós a oração pessoal alimentada pela Palavra do Senhor, a frequência dos Sacramentos e a direção espiritual de homens iluminados são os meios para descobrir e seguir a voz de Deus. Recebeu o hábito religioso das mãos do Beato Jordão da Saxônia.
Depois da ordenação sacerdotal, os Superiores destinaram-no ao ensino em vários centros de estudos teológicos anexos aos conventos dos Padres Dominicanos. As brilhantes qualidades intelectuais permitiram-lhe aperfeiçoar o estudo da teologia na universidade mais célebre dessa época, a de Paris. A partir de então, Santo Alberto empreendeu aquela extraordinária atividade de escritor, que depois teria continuado durante toda a vida.
Foram-lhe confiadas tarefas prestigiosas. Em 1248, foi encarregado de abrir um estúdio teológico em Colônia, uma das capitais mais importantes da Alemanha, onde ele viveu durante vários períodos, e que se tornou a sua cidade de adoção. De Paris, levou consigo para Colônia um discípulo extraordinário, Tomás de Aquino. Só o mérito de ter sido mestre de S. Tomás seria suficiente para nutrir profunda admiração por Santo Alberto. Entre estes dois grandes teólogos instaurou-se um relacionamento de estima e amizade recíproca, atitudes humanas que contribuem muito para o desenvolvimento da ciência. Em 1254, Alberto foi eleito Provincial da “Provincia Teutoniae” – teutônica – dos Padres Dominicanos, que incluía comunidades difundidas num vasto território da Europa Central e do Norte. Ele distinguiu-se pelo zelo com que exerceu tal ministério, visitando as comunidades e exortando constantemente os irmãos de hábito à fidelidade, aos ensinamentos e aos exemplos de São Domingos.
Os seus dotes não passaram despercebidos ao Papa daquela época, Alexandre IV, que quis Alberto por um certo período ao seu lado em Anagni – aonde os Papas iam com frequência –, também em Roma e em Viterbo, para se valer da sua consulta teológica. O mesmo Sumo Pontífice nomeou-o Bispo de Regensburg, uma diocese grande e famosa, que contudo se encontrava num momento difícil. De 1260 a 1262, Alberto desempenhou este ministério com dedicação incansável, conseguindo levar paz e concórdia à cidade, reorganizar paróquias e conventos, e dar um novo impulso às atividades caritativas.
Nos anos de 1263-1264 Alberto pregava na Alemanha e na Boêmia, encarregado pelo Papa Urbano IV, para voltar depois para Colônia e retomar a sua missão de docente, estudioso e escritor. Dado que era um homem de oração, ciência e caridade, gozava de grande autoridade nas suas intervenções, em várias vicissitudes da Igreja e da sociedade do tempo: foi sobretudo homem de reconciliação e de paz em Colônia, onde o Arcebispo tinha entrado em dura oposição com as instituições municipais; prodigalizou-se durante a realização do II Concílio de Lyon, em 1274, convocado pelo Papa Gregório X para favorecer a união entre as Igrejas latina e grega, depois da separação do grande cisma do Oriente, de 1054; ele esclareceu o pensamento de Tomás de Aquino, que tinha sido alvo de objeções e até de condenações, totalmente injustificáveis.
Faleceu na cela do seu convento da Santa Cruz em Colônia, em 1280, e foi imediatamente venerado pelos seus irmãos de hábito. A Igreja propô-lo ao culto dos fiéis com a beatificação, em 1622, e com a canonização, em 1931, quando o Papa Pio XI o proclamou Doutor da Igreja. Tratava-se de um reconhecimento indubitavelmente apropriado a este grande homem de Deus e insigne estudioso, não apenas das verdades da fé, mas de muitíssimos outros sectores do saber; com efeito, observando os títulos das suas numerosíssimas obras, damo-nos conta de que a sua cultura possui algo de prodigioso, e que os seus interesses enciclopédicos o levaram a ocupar-se não só de filosofia e de teologia, como outros contemporâneos, mas também de todas as outras disciplinas então conhecidas, da física à química, da astronomia à mineralogia, da botânica à zoologia. Por este motivo, o Papa Pio XII nomeou-o padroeiro dos cultores das ciências naturais e é chamado também “Doctor universalis”, precisamente pela vastidão dos seus interesses e do seu saber.
Sem dúvida, os métodos científicos utilizados por Santo Alberto Magno não são aqueles que se teriam afirmado ao longo dos séculos seguintes. O seu método consistia simplesmente na observação, na descrição e na classificação dos fenômenos estudados, mas assim abriu a porta aos trabalhos futuros.
Ele ainda tem muito para nos ensinar. Sobretudo, Santo Alberto demonstra que entre fé e ciência não existe oposição, não obstante alguns episódios de incompreensão que se verificaram na história. Um homem de fé e de oração, como foi Santo Alberto Magno, pode cultivar tranquilamente o estudo das ciências naturais e progredir no conhecimento do microcosmos e do macrocosmos, descobrindo as leis próprias da matéria, porque tudo isto concorre para alimentar a sede e o amor de Deus. A Bíblia fala-nos da criação como da primeira linguagem através da qual Deus – que é suma inteligência, que é Logos – nos revela algo de si mesmo. O livro da Sabedoria, por exemplo, afirma que os fenômenos da natureza, dotados de grandeza e beleza, são como as obras de um artista, através das quais, por analogia, nós podemos conhecer o Autor da criação (cf. Sb 13, 5). Com uma similitude clássica na Idade Média e no Renascimento pode-se comparar o mundo natural com um livro escrito por Deus, que nós lemos com base nas diferentes abordagens das ciências (cf. Discurso aos participantes na Sessão Plenária da Pontifícia Academia das Ciências, 31 de Outubro de 2008). Com efeito, quantos cientistas, no sulco de Santo Alberto Magno, fizeram progredir as suas investigações inspirados pelo enlevo e pela gratidão diante do mundo que, aos seus olhos de estudiosos e de crentes, parecia e parece a obra boa de um Criador sábio e amoroso! O estudo científico transforma-se, então, num hino de louvor. Compreendeu-o bem um grande astrofísico dos nossos tempos, cuja causa de beatificação foi iniciada, Enrico Medi, que escreveu: “Oh, vós misteriosas galáxias… eu vejo-vos, calculo-vos, entendo-vos, estudo-vos e descubro-vos, penetro-vos e reúno-vos. De vós tomo a luz e dela faço ciência, tomo o movimento e faço dele sabedoria, tomo o brilho das cores e dele faço poesia; tomo-vos, a vós estrelas, nas minhas mãos e, tremendo na unidade do meu ser, elevo-vos acima de vós mesmas, e em oração apresento-vos ao Criador, que somente através de mim vós estrelas podeis adorar” (Le opere, Inno alla creazione).
Santo Alberto Magno recorda-nos que entre ciência e fé existe amizade, e que os homens de ciência podem percorrer, através da sua vocação para o estudo da natureza, um autêntico e fascinante percurso de santidade.
A sua extraordinária abertura de mente revela-se também uma realização cultural, que ele empreendeu com sucesso, ou seja, o acolhimento e a valorização do pensamento de Aristóteles. Com efeito, na época de Santo Alberto estava-se a difundir o conhecimento de numerosas obras deste grande filósofo grego, que viveu no século IV antes de Cristo, sobretudo no âmbito da ética e da metafísica. Elas demonstravam a força da razão, explicavam com lucidez e clareza o sentido e a estrutura da realidade, a sua inteligibilidade, o valor e a finalidade das obras humanas. Santo Alberto Magno abriu a porta para a recepção completa da filosofia de Aristóteles na filosofia e teologia medieval, uma recepção elaborada depois de modo definitivo por S. Tomás. Esta recepção de uma filosofia, digamos, pagã pré-cristã, foi uma autêntica revolução cultural para aquela época. E, no entanto, muitos pensadores cristãos temiam a filosofia de Aristóteles, a filosofia não cristã, sobretudo porque ela, apresentada pelos seus comentadores árabes, tinha sido interpretada de modo que parecia, pelo menos sob alguns pontos, totalmente irreconciliável com a fé cristã. Isto é, apresentava-se um dilema: fé e razão estão em contraste entre si, ou não?
Eis um dos grandes méritos de Santo Alberto: com rigor científico, ele estudou as obras de Aristóteles, convencido de que tudo aquilo que é realmente racional é compatível com a fé revelada nas Sagradas Escrituras. Em síntese, Santo Alberto Magno contribuiu assim para a formação de uma filosofia autônoma, distinta da teologia e a ela vinculada só pela unidade da verdade. Assim nasceu, no século XIII, uma clara distinção entre estes dois saberes, filosofia e teologia, que, em diálogo entre si, cooperam harmoniosamente para a descoberta da autêntica vocação do homem, sequioso de verdade e de bem-aventurança: e é sobretudo a teologia, definida por Santo Alberto “ciência afetiva”, aquela que indica ao homem a sua vocação à alegria eterna, um júbilo que brota da plena adesão à verdade.
Santo Alberto foi capaz de comunicar estes conceitos de modo simples e compreensível. Autêntico filho de São Domingos, pregava de bom grado ao povo de Deus, que permanecia conquistado pela sua palavra e pelo exemplo da sua vida.
Caros irmãos e irmãs, oremos ao Senhor a fim de que na Igreja nunca venham a faltar teólogos doutos, piedosos e sábios, como Santo Alberto Magno, e ajude cada um de nós a fazer nossa a “fórmula da santidade” que ele seguiu na sua vida: “Desejar tudo aquilo que eu quero para a glória de Deus, como Deus deseja para a sua glória tudo o que Ele quer”, ou seja, conformar-se sempre com a vontade de Deus para desejar e fazer tudo unicamente e sempre pela sua glória.
Prêmio Top Blog 2011
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