Para os meus escassos momentos de tempo livre aqui em São Paulo, trouxe The greatest prayer, novo lançamento do John Dominic Crossan. Ganhei o livro na conferência da RNA em Denver, e o autor participou de um café da manhã com os jornalistas. Tenho os dois pés atrás com o trabalho de Crossan, que basicamente parece pretender despir Jesus de qualquer traço de divindade, transformando-o num grande líder religioso e olhe lá. Mas resolvi ler o livro mesmo assim, e achei um trecho que vem muito a calhar com as discussões recentes sobre metáforas na Bíblia. Crossan faz uma pequena introdução sobre o significado da palavra “pai” no início do Pai Nosso (o tema do livro é essa oração) e afirma o seguinte:
Por um lado, o Iluminismo (que aliás é uma metáfora) europeu dos séculos 17 e 18 corretamente nos “iluminou” sobre a necessidade da observação e da experimentação nas ciências naturais e do valor da razão e do debate, comprovação e repetição na ciência e na tecnologia. Nesse processo, a influência opressiva do poder inquisitorial e a fria supervisão do controle eclesiástico foram removidas de esferas sobre as quais eles sabiam de menos e afirmavam demais. Essa foi uma conquista magnífica e deve ser sempre apreciada como tal.
Mas, por outro lado, o mesmo Iluminismo também nos “apagou” dramaticamente em relação a metáforas e símbolos, mitos e parábolas, especialmente na religião e na teologia. Nós damos como certo, por exemplo, que os antigos tomavam suas histórias religiosas literalmente, mas agora nós somos suficientemente sofisticados para reconhecer a ilusão em que estavam. Mas e se aqueles antigos pretendiam que suas histórias fossem metáforas e parábolas (e aceitavam esse fato), e nós é que estamos errados? E se aquelas mentes pré-Iluminismo fossem totalmente capazes de ouvir uma metáfora, captar imediatamente seu significado e seu correto conteúdo, sem jamais se preocupar com a questão: “é metafórico ou literal?”. Ou, melhor ainda, e se eles soubessem como considerar suas metáforas fundamentais de modo programático, funcional e sério, sem se perguntar sobre a distinção entre literal e metafórico?
Pois é: será que não passa de um grande preconceito imaginar que os antigos eram um bando de ignorantes que entendiam tudo de modo literal? Vão pensando aí…
O Tubo de Ensaio é um dos três finalistas do prêmio Top Blog 2010 na categoria “blogs profissionais/religião”, tanto pelo voto popular quanto pelo júri acadêmico. Nas duas disputas, também são finalistas o Ancoradouro, de Fortaleza, e o blog da Ana Néri (que conheci pessoalmente quando estive no programa do professor Felipe Aquino). Queria agradecer a todos que votaram no Tubo, aos que fizeram campanha para convencer outros a votar, e aos comentaristas que tornam o blog melhor com seus insights e sugestões. Os vencedores serão anunciados em 18 de dezembro.
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