Tanto no prefácio quanto nos capítulos finais de O mundo assombrado pelos demônios, Carl Sagan relata uma série de memórias pessoais sobre como seus pais foram importantes para que o jovem Sagan seguisse a carreira científica, levando-o a museus e feiras, e incentivando a sua curiosidade. O autor lamenta profundamente que hoje não exista quase nenhum incentivo para que as crianças e jovens se interessem por ciência: a televisão aberta trata o assunto superficialmente, aqueles que demonstram algum gosto pelo assunto são logo rotulados de nerds e as escolas só fazem a coisa ser minimamente interessante na época das feiras de ciência. Eu me solidarizo com Sagan e acho ridículo que haja tão pouco estímulo para as crianças gostarem de ciência. Eu ainda não tenho filhos, mas quando tiver, ficaria orgulhoso se algum deles resolvesse ser cientista. Enquanto isso, brinco de dinossauros quando encontro meu sobrinho de 4 anos.
Por outro lado, vemos o ateísmo militante defendendo que os pais não tenham o direito de educar seus filhos na religião. Eles consideram isso praticamente um abuso (é a palavra usada por Dawkins em Deus, um delírio; Christopher Hitchens fala em mutilação da vida psicológica e física das crianças). Diante disso, fico pensando o que diriam esses autores e seus seguidores em relação à ideia de ensinar às crianças a compatibilidade entre ciência e fé. É justamente disso que trata um artigo escrito por Shelley Emling no Huffington Post, semana passada. Em Can a science-minded child be raised religious?, ela divide um pouco de sua angústia ao ver que, enquanto ela tem sucesso em mostrar essa compatibilidade aos adultos, seus dois filhos parecem não dar muita bola para a religião, embora adorem a ciência.
Ainda assim, Shelley mantém as esperanças, e eu acho que ela está no caminho certo: mostrar que ciência e religião respondem a tipos diferentes de perguntas, e que por isso não são excludentes. Mas não se pode forçar nada a entrar na cabeça de alguém. Os pais podem dar o melhor de si explicando, dando exemplo – vale para tudo: comportamento no trânsito, ética de trabalho, e também no caso da ciência e da fé. Mas, assim como o filho de um motorista exemplar pode virar um irresponsável ao volante, também pode acontecer, sim, que apesar do esforço dos pais em mostrar às crianças que ciência e fé não são excludentes, elas acabem se tornando fundamentalistas, de qualquer um dos lados (que rejeitam a religião em nome da ciência, ou que rejeitam a ciência em nome da religião). O que serve de consolo é que, na maioria dos casos, a fruta não cai longe da árvore.
E então, como educar as crianças para compreender e extrair o melhor tanto da religião quanto da ciência?
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Aproveito para lembrar que no dia 4 de fevereiro este blogueiro estará no programa Escola da Fé, da TV Canção Nova, falando sobre ciência e religião, cobertura da Igreja Católica na imprensa e outros assuntos. Ao vivo, às 20h30.
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