O astrônomo Salman Hameed comenta, no Religion Dispatches, que algumas autoridades islâmicas aproveitaram a inauguração de um enorme relógio (o maior do mundo) em Meca para lançar uma ideia: transformar a cidade sagrada muçulmana na referência mundial de horário. Ele explica que há dois argumentos para isso. Um deles é ideológico: o uso do observatório de Greenwhich para estabelecer os meridianos seria uma herança do passado colonial e da supremacia britânica.
Mas o que realmente incomoda Hameed é o segundo tipo de argumento, que tenta usar conceitos científicos para legitimar a reivindicação: a alegação de que Meca seria o “verdadeiro centro do mundo” estaria baseada em um suposto alinhamento da cidade com o Polo Norte magnético, o que, como demonstra Hameed, é no mínimo impreciso (e, no máximo, completamente errado), já que o Polo Norte magnético muda de lugar constantemente. O problema, aponta, é que mesmo cientistas entraram na campanha.
O astrônomo acredita que esse tipo de iniciativa faz parte de um movimento maior dentro do Islã, segundo o qual o Corão antecipa vários conceitos da ciência moderna. Há um desejo, diz o astrofísico, de tentar usar uma ciência (ruim, acrescenta) para legitimar as alegações religiosas. Eu acrescento que isso não me parece ser exclusividade do Islamismo; basta ver como criacionistas de Terra jovem ignoram completamente tudo o que a Astronomia e a Geologia nos ensinam sobre o universo e a Terra para fazer da Bíblia o manual de ciências definitivo.
Hameed diz que esse tipo de iniciativa presta um enorme desserviço tanto à ciência quanto à religião (inclusive dando munição a quem gosta de mostrar o Islamismo como uma religião adversária da ciência), mas aponta uma dificuldade de combater essa mentalidade que tem tanto apelo entre os muçulmanos: qualquer contestação deverá vir de dentro do mundo islâmico. Caso venha de fora, será rechaçada com a justificativa de que se trata de “preconceito anti-islâmico”; sim, é um ad hominem, mas falácias andam na moda.
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