Hilary Marlow no curso Faraday-Kuyper, em São Paulo. (Foto: Gustavo Assi)| Foto:

Dezembro é época de retrospectivas e, enquanto todo mundo vai lembrar da reeleição da Dilma e dos 7 a 1 para a Alemanha, temos coisas melhores para recordar por aqui. Uma delas foi a inédita realização de um Curso Faraday no Brasil. São Paulo recebeu o evento (e, se não houve curso em Curitiba, pelo menos tivemos a Hilary Marlow dando palestra na PUCPR). Rogério Fernandes da Silva, que é professor na rede estadual de ensino do Rio de Janeiro e mestrando em Ciências da Religião na PUC-SP, esteve lá e escreveu um artigo para o Tubo contando um pouco das suas percepções sobre o evento.

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Percepções do Curso Faraday-Kuyper

Rogério Fernandes da Silva

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Entre 9 e 12 de outubro, participei do curso promovido pelo Faraday Institute for Science and Religion e pela Associação Kuyper de Estudos Transdisciplinares, na cidade de são Paulo. Minha ida ao curso Faraday-Kupper foi uma jornada, ainda mais porque tive de fazer uma apresentação na Universidade Federal de Juiz de Fora na mesma semana. Entretanto, ao chegar a São Paulo as coisas se acomodaram. O curso, que teve o tema “ciência, tecnologia e religião”, havia passado por percalços motivados pela incompreensão da academia brasileira: originalmente previsto para ocorrer na USP, teve de ser transferido para a Universidade Presbiteriana Mackenzie de São Paulo em cima da hora. Essa incompreensão foi motivada pelo preconceito laicista de alguns, para quem qualquer menção ao religioso na universidade seria um ataque ao Estado laico. Contudo, a transferência de local não afetou a qualidade do curso.

O curso foi administrado por Gustavo de Assi e Guilherme de Carvalho, contando com uma equipe de voluntários e professores brasileiros e do Faraday. Foram quatro dias de intensa formação e interação com participantes. Nomes de peso do estavam presentes, como Denis Alexander, diretor emérito do Faraday Institute. No primeiro dia foram entregues a programação e um caderno universitário para notas; nele constavam artigos que davam subsídios para o estudo sobre as relações entre ciência e religião. Não é possível detalhar todos os debates e palestras aqui, mas foram todas de alto nível para uma plateia eclética, visto que nem todos eram do meio universitário. Mesmo sendo um evento promovido por uma entidade inglesa, com perfil ecumênico, chamou-me a atenção o fato de que aparentemente eu era o único católico no grupo dos que assistiam.

Destaco a palestra de Hilary Marlow, que, ao pesquisar sobre darwinismo no Brasil no fim do século 19 e início do século 20, não descobriu fontes sobre o conflito entre religião e ciência nessa época (Ver, entretanto: DOMINGUES, Heloisa Maria Bertol (org.). A recepção do darwinismo no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2003). Isso pode ser explicado devido à preocupação dos cientistas brasileiros que, na época, estava mais ligada a questões raciais do que religiosas, motivada pela concepção da construção da nação brasileira via critérios raciais. Os cientistas acreditavam que o país seria inviável no longo prazo devido à forte presença africana na sociedade. Contudo, não é que o conflito estivesse ausente naquela época, visto que o positivismo, ferrenho opositor da religião, era muito presente nas nossas elites políticas e intelectuais e gerava um tipo de embate que se fazia na forma de laicismo. Vale ressaltar que a laicidade brasileira nasceu sob um banho de sangue dos mais miseráveis da população brasileira, vide o Contestado e a revolta de Canudos.

Enfim, que o curso do Faraday possa avançar ainda mais dentro das mentalidades acadêmicas brasileiras; apesar de não acreditar que a tese de conflito seja a predominante na universidade, a indiferença parece ser a tônica predominante em nossas terras. Também parece que o laicismo, e não a laicidade, seja o pensamento majoritário. Esse laicismo e essa indiferença não ajudam em nada, e permitem que a tese de conflito seja vitoriosa no senso comum.

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(Aviso: o Instituto Faraday, citado neste post, deu ao blogueiro uma bolsa para participar de um curso na Universidade de Cambridge, em 2011)

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