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Semanas atrás, dei uma palestra sobre ciência e fé para o grupo de jovens da paróquia que frequento. Havia pedido que eles me enviassem perguntas, assim eu podia preparar algo que fosse do interesse deles; uma das questões mais interessantes foi “é contra nossa fé acreditar em vida fora da Terra?” Felizmente, eu havia acabado de ler Vida inteligente no universo? A fé católica e a busca por vida extraterrestre inteligente, do irmão jesuíta Guy Consolmagno, diretor do Observatório Vaticano. É um livretinho publicado pela Catholic Truth Society britânica – quem quer que tenha ido a alguma igreja católica na Inglaterra deve ter visto esses livretinhos, sobre vários temas, para você levar e deixar o dinheiro –, que o Instituto Ciência e Fé da PUCPR traduziu e publicou, deixando disponível para download gratuito em várias plataformas.
Consolmagno acredita que, “mais cedo ou mais tarde, a raça humana descobrirá que existem outras criaturas inteligentes no universo”, e dá algumas razões para isso. Uma é probabilística: há tantos bilhões e bilhões de planetas por aí que “em algum lugar, deve haver outros seres civilizados e racionais”; outra é chamada por ele de “estética”: “a criatividade fecunda de Deus não poderia simplesmente se limitar a nós”. Mas, de qualquer maneira, ele ressalta: isso não passa de palpite, “especulação e adivinhação”, “não é ciência, ainda não. Talvez nunca seja”. A frase que Consolmagno mais repete no livro é “não sabemos”; uma demonstração de honestidade intelectual e de uma correta compreensão das nossas atuais limitações científicas. Só o que sabemos até agora, diz ele, é que somos a única espécie inteligente que conhecemos; sabemos pelo que devemos procurar quando se trata da busca por condições que fariam um planeta ser receptível à vida; e sabemos que ainda não achamos vida nenhuma fora daqui – nem microscópica, quanto mais inteligente. O jesuíta não menciona explicitamente o chamado “paradoxo de Fermi”, que se pode resumir na pergunta “se a chance de haver outras civilizações fora da Terra é tão grande, por que não temos sinais delas?”, mas parece pender para uma das possíveis respostas quando diz que nossa tecnologia atual ainda é precária e que há chances de “que tal vida esteja fisicamente tão distante de nós que nunca saberemos sobre ela, muito menos seremos capazes de nos comunicar com ela”.
Mas isso não nos impede de especular – e nem a Igreja nos impede de imaginar o “como seria se...” A Bíblia não diz absolutamente nada sobre alienígenas, nem que existem, nem que não existem. O certo é que os humanos não são as únicas criaturas inteligentes na Escritura; afinal, temos no mínimo os anjos, fora alguns seres misteriosos mencionados no início do Gênesis, que não se sabe ao certo o que são. Mas, se um dia descobríssemos outras civilizações inteligentes, imaginem o tipo de perguntas que teríamos de fazer: elas receberam a revelação divina? Precisariam ser evangelizadas por nós? Elas teriam caído e precisariam de redenção? Se sim, a redenção de Cristo em nosso planeta tem alcance universal, ou haveria “histórias paralelas” de salvação nesses planetas? Poderíamos batizar ou até ordenar extraterrestres?
Consolmagno acredita que deve haver vida inteligente fora da Terra, mas acrescenta que isso não passa de palpite, “especulação e adivinhação”
Hoje, nada disso é propriamente teologia, pelo simples fato de não haver nenhuma evidência de vida inteligente alienígena. É trabalho para a ficção científica, e eu lamento muito que Consolmagno não tenha citado aqueles que, para mim, são trabalhos primorosos de “especulação teológica” a respeito de civilizações extraterrestres que tiveram contato com o divino: os dois primeiros volumes da Trilogia Cósmica de C.S. Lewis. Além do planeta silencioso se passa em Marte, com civilizações mais antigas que a humana; e Perelandra é ambientado em Vênus, com uma espécie inteligente bem mais nova que a nossa.
Agora, independentemente de todas as perguntas que possamos fazer sobre vida alienígena inteligente e sobre os desdobramentos que isso teria para a teologia, outra coisa é certa, diz Consolmagno: pensar nisso nos força a olhar também para nós mesmos, para o que nós somos, para o que Deus fez e continua a fazer por nós aqui, neste pálido ponto azul. Se há outras civilizações como a nossa, maravilhemo-nos com o poder criativo de Deus – e não nos esqueçamos de que aqui o Verbo se fez carne e se entregou para nossa salvação. Se somos os únicos em todo o universo, que tenhamos noção do tanto que isso significa. Já citei aqui uma sequência longa e famosa de A Árvore da Vida, de Terrence Malick: logo depois que a personagem de Jessica Chastain reza com as palavras do Salmo 8, perguntando “o que somos nós para Ti?”, o enredo do filme é subitamente paralisado e dá lugar a 20 minutos que vão do Big Bang aos dinossauros. O niilista verá na sequência um atestado da insignificância do homem; nós vemos ali a resposta divina: “fiz tudo isso para você”.
Aliás, o mesmo Salmo 8 nos diz que “os céus proclamam a grandeza de Deus”, como lembra Consolmagno. Poesia pura ou uma insinuação de que há mais alguém lá fora glorificando o Criador? A resposta depende do quanto de Fox Mulder cada um tem dentro de si.
(O título significa “aos povos de outros planetas”; é uma brincadeira com o decreto Ad Gentes, do Concílio Vaticano II, sobre a atividade missionária da Igreja. Dizem que se você precisa explicar uma piada/trocadilho/charge etc. é porque não foi boa, mas paciência...)
Mais Consolmagno e ICFé
Esta edição brasileira do livro de Consolmagno tem prefácio do Nobel de Física John Mather, que o ICFé da PUCPR recebe para um evento on-line e gratuito no dia 14 de setembro, com inscrições ainda abertas. A PUCPR, aliás, receberá, de 17 a 20 de outubro, o congresso da Sociedade Brasileira de Cientistas Católicos. O prazo para envio de trabalhos ainda está aberto e termina em 27 de agosto.
O diretor do Observatório Vaticano é um dos entrevistados de meu livro A razão diante do enigma da existência, ao lado de quase 30 teólogos, filósofos e cientistas. Entre outros assuntos, falamos também da possibilidade de existir vida extraterrestre. Perguntei a Consolmagno por que isso fascina tanto as pessoas, e essa foi a resposta dele:
“Parte disso, acho, está na esperança de que os ETs vão nos oferecer todas as respostas. Mas claro que isso é uma bobagem, em diversos sentidos. Ter tecnologia mais avançada não quer dizer que a ética deles seja melhor. E nós já temos um Salvador, que muita gente, aliás, se esquece de ouvir.”
Como o Sudário de Turim desmontou o ceticismo de um fotógrafo
O site Creative Minority Report divulgou, dias atrás, um vídeo em que o jornalista Glenn Beck entrevista Barrie Schwortz, o fotógrafo oficial do Shroud of Turin Research Project (Sturp), a força-tarefa de cientistas que examinou de perto o Sudário de Turim no fim dos anos 70. O vídeo é curto, tem pouco mais de 10 minutos, e nele Beck e Schwortz conversam sobre as conclusões do Sturp e todos os problemas do teste de carbono-14 realizado anos depois.
Ao contrário do título do vídeo, que fala em “new evidence”, não temos ali nenhuma novidade bombástica, ao menos não para quem acompanha as notícias e estudos sobre o Sudário. E eu certamente não compartilho da hipótese de Schwortz sobre os motivos para o carbono-14 ter dado os resultados que deu. Mesmo assim, vale a pena acompanhar a conversa e ver como a experiência mudou radicalmente a opinião de Schwortz sobre a relíquia mais estudada da história da cristandade.