Ontem os cristãos comemoraram a Páscoa, a ressurreição de Cristo. É a principal festa cristã, mais importante que o Natal, pois o centro da fé cristã, como afirma São Paulo numa de suas cartas, é a ressurreição. E, obviamente, é o evento que atrai mais ceticismo por parte daqueles que não acreditam. A hipótese de se descobrir o corpo de Jesus já foi explorada pela ficção (existe um filme com o Antonio Banderas no papel de um padre jesuíta que vai a Israel investigar uma ossada que tem todas as características relacionadas a Jesus), por “documentários” como O túmulo esquecido de Jesus, de Simcha Jacobovici e James Cameron (que o arqueólogo Jonathan Reed chamou de “archeoporn”) e por historiadores como Thomas de Wesselow, autor de O Sinal, um livro que, curiosamente, defende a autenticidade do Sudário de Turim negando a historicidade da ressurreição.
Como a ressurreição é vista como um evento que desafia a racionalidade, muitos se perguntam como é que um cientista pode acreditar nesse tipo de coisa. Por isso, achei interessante ler no Christian Post um relato de uma mesa-redonda (eu não chamaria de “debate”, por não haver exatamente duas posições antagônicas) dentro de um evento realizado pela Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS, na sigla em inglês), que tem um departamento exclusivo dedicado ao “diálogo sobre ciência, ética e religião”.
O tema da ressurreição foi trazido por um rabino presente na audiência, que ainda citou uma ocasião em que ouviu um presbiteriano dizer que entendia a ressurreição de Cristo de forma metafórica, no que foi confirmado pelo pastor (de fato, há teólogos protestantes que vêm negando a ressurreição física de Jesus; o principal deles, que eu me lembre, é o luterano alemão Rudolf Bultmann). “A ressurreição é um evento anticientífico em que as leis da natureza são suspensas. Então, não deveria surpreender que historicamente haja tensão entre ciência e religião na comunidade cristã”, disse o rabino.
Os integrantes da mesa saíram-se bem na resposta. Walter Kim, de Boston, lembrou que a ressurreição não nega as leis da natureza; pelo contrário, ela as pressupõe, pois só se pode crer que elas possam ser suspensas em algum momento se antes há a convicção de que a natureza possui leis. “A constatação de um milagre depende de uma visão de mundo que pressupõe a regularidade e a exatidão científicas”, afirmou Kim. Para ele, a pergunta central que a ressurreição lança não é se um cientista pode crer nesse tipo de evento, mas se o mundo natural, e o seu conhecimento proporcionado pela ciência, são as únicas realidades existentes. “A resposta cristã é ‘não’. A ressurreição de Cristo indica que, embora a regularidade do universo seja algo para se estudar, não é a única coisa a se estudar”, completou Kim.
Um outro conferencista recomendou a leitura de uma palestra de Tom Wright, ex-bispo anglicano de Durham. Em 2007, ele foi a Cambridge e falou exatamente sobre a possibilidade de um cientista crer na ressurreição de Cristo. Também recomendo a leitura. Wright explora o que significa “crer”, pergunta se um cientista deve ter uma abordagem “científica” para tudo na vida e explora os questionamentos relativos a uma ressurreição material, física de Cristo. Wright examina a crença na ressurreição entre os judeus e a compara com a fé cristã, mostrando as mutações que levaram de uma a outra, e no fim dá sua opinião sobre como o historiador e o cientista podem se posicionar a respeito disso.
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