A Gazeta de hoje publicou, na página temática de Educação, reportagem da minha colega Anna Simas sobre o ensino da evolução e do criacionismo em escolas no Brasil. Achei que faltou conceituar um pouco melhor o criacionismo (que admite uma série de nuances) e mencionar que existe uma série de maneiras de conciliar a fé religiosa com a aceitação da evolução, mas o que eu queria comentar hoje é um fenômeno que, a julgar pelas professoras que a Anna entrevistou, parece estar se tornando generalizado: a ignorância de conceitos mínimos de lógica.
Vejamos o diz a professora Rita Dallago, da Tuiuti: “Em geral, os professores tendem a impor o que acreditam, mas o ideal seria deixar claro sempre que existem duas correntes e não uma única verdade. O aluno tem o direito de escolher em qual prefere crer.” Na mesma linha, a professora de Religião e História Célia Regina Guernieri diz que “hoje os estudantes são muito mais livres e críticos do que há 30 anos. Eles conseguem perceber que não há uma verdade absoluta.” (nos dois casos, o negrito é meu)
Suponho que as duas professoras estão fazendo esse tipo de afirmação num contexto de debate entre evolução e criacionismo, certo? Bom, então a lógica nos diz que é impossível que o universo tenha sido criado há 6 mil anos e também há 13 bilhões de anos. É impossível que as espécies tenham sido criadas por Deus do jeito como são hoje, e ao mesmo tempo tenham evoluído a partir de uma única forma de vida original. Enfim, várias afirmações criacionistas são totalmente incompatíveis com os pressupostos da teoria de Darwin.
O que mais me aflige (sinceramente) aqui é que estamos nem falando de opiniões, estamos tratando de fatos. As coisas só podem ter acontecido de um jeito: ou como os criacionistas dizem, ou como as ciências (Astronomia no caso da idade do universo, Biologia no caso do surgimento das espécies, e assim por diante) dizem, ou de algum outro jeito. Em resumo, existe, sim, uma verdade absoluta sobre como surgiram o universo, o planeta e as espécies. Sem medo de ser enquadrado na Lei de Godwin, proponho a seguinte situação: mesmo com todas as evidências que temos sobre o Holocausto, imaginemos um professor de História que dissesse a um jornalista que estivesse fazendo uma matéria sobre revisionismo: “o ideal seria deixar claro sempre que existem duas correntes e não uma única verdade. O aluno tem o direito de escolher em qual prefere crer”. Ridículo, não? Bom, no caso da discussão entre criacionismo e evolucionismo não é muito diferente.
Como é que nós chegamos a esse nível tão raso, em que fatos concretos são reduzidos à categoria de opiniões em que um diz x, outro diz y, e o aluno que se vire para saber o que realmente aconteceu, ou então o aluno que escolha de qual visão ele gosta mais independentemente do que realmente tenha acontecido? Será influência do politicamente correto, que deixou as pessoas incapazes de chegar diante de uma pessoa e dizer “você está errado” e demonstrar onde está o erro? Será preguiça intelectual, preguiça de pensar, de investigar, de descobrir? Será falta de Aristóteles?
Aliás, acho que os jornalistas também deveriam fazer esse tipo de reflexão. Especialmente ano passado, na campanha eleitoral, presenciei muitos casos em que dois (ou mais) candidatos diziam coisas opostas sobre fatos ou números, mas as reportagens se limitavam a informar que “Fulano disse isso, e Beltrano afirmou aquilo” mesmo em situações nas quais era absurdamente fácil verificar quem estava certo e quem estava mentindo. Isso empobrece demais o jornalismo, como essa atitude de professores que negam a existência de uma verdade objetiva empobrece o ensino.
PS: não ligo muito pra carnaval, mas soube que uma escola de samba do Rio desfilou com um enredo sobre Darwin. Vai ser feio se não levar um monte de nota 10 no quesito Evolução…
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