Entre sábado e hoje tivemos três textos sobre ciência e religião na imprensa brasileira cuja leitura eu queria recomendar.
Um deles saiu na própria Gazeta do Povo. Nossa seção “Sínteses” de hoje tratou do Prêmio Nobel de Medicina e das pesquisas com células-tronco, e o oncologista Cícero Urban escreveu o artigo “A razão e a fé venceram”. Nessa época pós-eleitoral em que é moda enumerar “quem ganha” e “quem perde” com os resultados das urnas, uma coluna de “quem ganha” no caso do Nobel de Medicina fatalmente incluiria a Igreja Católica. Apesar de ela não ter absolutamente nada a ver com as pesquisas específicas de Gurdon e Yamanaka, mantém-se firme em sua oposição à pesquisa com embriões, e no apoio ao uso de outros tipos de células-tronco, e é isso que o artigo explica (em tempo: no outro artigo de hoje, Paulo Sérgio Coelho Filho também fala de dilemas bioéticos).
Em sua coluna na Folha de S.Paulo, Marcelo Gleiser vem tratando de temas de ciência e fé com uma frequência crescente. No domingo, “Copérnico traído” afirma que não era a Igreja Católica que o astrônomo polonês temia quando relutou para publicar sua obra sobre o movimento dos corpos celestes, em que propunha o heliocentrismo; o artigo conta a história do tal prefácio ao De Revolutionibus que tratava o sistema proposto no livro como mera hipótese matemática: Andreas Osiander, o autor do texto, era um luterano conservador, e Lutero em pessoa já tinha condenado as ideias de Copérnico. O artigo de Gleiser não tem nenhuma grande novidade; como ele mesmo diz, Johannes Kepler já tinha restabelecido a verdade dos fatos em 1609, pouco mais de 50 anos após a publicação do livro de Copérnico. Mas o artigo é interessante por ajudar a esclarecer, entre o grande público, como foi a participação da Igreja Católica na controvérsia sobre o heliocentrismo.
Aliás, isso me lembra que preciso dividir com vocês mais um infográfico da Fundação BioLogos. Sei que para fazer caber na largura do blog as letrinhas ficaram ainda menores, mas vocês podem ver a versão original aqui.
E, por fim, também na Folha, João Pereira Coutinho escreveu, na segunda-feira, “Santa Ciência”, sobre o caso dos sismólogos italianos condenados por causa do terremoto em L’Aquila. Parece-me que o caso em questão foi um pouco mais complexo que o descrito pelo colunista, mas o que eu destaco aqui é o trecho que remete ao terremoto de Lisboa, em que “cada um aproveitou a desgraça para cavalgar os seus próprios preconceitos ideológicos”, segundo o colunista luso. O homem ainda precisa de uma causa que explique tudo, diz Coutinho; em 1755 Deus começou a deixar de ser essa causa, e hoje, afirma, jogamos tudo nas costas do próprio homem e da ciência.
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